SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Perdi mais de R$ 101 mil com o COE XP Braskem 2033 RF Pre, “apliquei R$ 180 mil e recebi de volta R$ 12 mil”, “meu prejuízo foi de R$ 267 mil”. Nos últimos dias, investidores têm relatado perdas substanciais com COEs (Certificado de Operações Estruturadas) de Ambipar e de Braskem, em suas redes sociais.
COEs são como caixinhas montadas por bancos, que podem combinar diversos ativos de renda fixa e renda variável, sob qualquer proporção. Porém, diferente de fundos, a política de investimentos não é necessariamente clara ao investidor final.
Os COEs de Ambipar e Braskem que acarretaram perdas de mais de R$ 200 mil são certificados de crédito privado, lastreados em bonds (títulos de dívida dessas empresas emitidos no exterior, semelhantes a debêntures).
As reclamações vêm após o vencimento antecipado desses produtos por parte de seus estruturadores, XP e BTG, depois da forte desvalorização dos títulos de dívidas dessas empresas emitidos no exterior, afetados por notícias negativas sobre a saúde financeira das empresas.
Com as empresas envoltas em disputas judiciais e ações na mínima histórica, o preço desses títulos de dívida sofreu uma forte desvalorização -alguns de quase 90%-, acionando cláusulas de proteção aos investidores. Elas determinam que se o papel recuar mais de 50%, o estruturador se desfaz da posição e encerra o COE antes do prazo de vencimento inicial.
A cláusula foi acionada na última semana de setembro, quando a Ambipar obteve medida cautelar que impede a cobrança de vencimentos antecipados e a Braskem contratou assessorias financeira e jurídica para reestruturar dívida.
O mercado leu essas notícias como sinais de possíveis recuperações judiciais, e todos os ativos das companhias sofreram forte queda.
Porém, a ativação deste gatilho não leva à venda imediata dos bonds, que foram liquidados de 20 a 30 dias depois do acionamento da cláusula, elevando as perdas dos COEs.
“Diversos investidores já queriam sair até antes, mas não tinha liquidez. O deságio foi muito grande, no caso da Ambipar foi devolvido para os investidores apenas 6,88% do valor aplicado e, no caso da Braskem, ficou entre 26,6% e 37%”, diz Maria Luisa Paolantoni, analista da Nord Investimentos.
Ela conta que muitos investidores pessoas físicas compraram esses ativos pela expectativa de ganhos expressivos, sem se darem conta dos riscos envolvidos. O COE da XP Braskem 2033 oferecia uma rentabilidade de IPCA + 10% ao ano. O COE da Ambipar era vendido a IPCA + 9,75% ao ano.
Segundo Arthur Longo Ferreira, sócio do Henneberg Ferreira Linard Advogados, os estruturadores e distribuidores do COE devem assegurar que o comprador entenda o produto.
“A análise do ativo subjacente, seja ele um bond corporativo ou qualquer outro instrumento de referência, faz parte do dever fiduciário de suitability (dever de verificação de perfil e adequação do produto ao investidor) e de governança. Não se trata apenas de cumprir formalidades regulatórias, mas de assegurar que o produto seja consistente com o perfil e o interesse econômico do investidor”, diz o advogado.
Em seu site, a XP diz que os COEs são destinados “a clientes com perfil de investimento moderado (valor nominal protegido) e agressivo (valor nominal em risco)”.
“A XP Investimentos não se responsabiliza por decisões de investimentos que venham a ser tomadas com base nas informações aqui divulgadas. A XP Investimentos se exime de qualquer responsabilidade por quaisquer prejuízos, diretos ou indiretos, que venham a decorrer da utilização deste relatório ou seu conteúdo”, diz a corretora.
COEs ganharam visibilidade nos últimos anos em meio a onda de investidores que acionaram a Justiça contra suas corretoras após saírem no prejuízo. A aplicação é considerada complexa, com travas que impedem a retirada do dinheiro até a data de vencimento.
Como a Folha mostrou, investidores relatam perdas milionárias nos processos judiciais, acusando seus assessores de falhas de orientação e omissão na hora de fechar o negócio.
Ex-funcionários de corretoras disseram que sofriam pressão e ameaças para bater metas de venda de COE. Segundo eles, o produto rende uma das comissões mais vantajosas -tanto para o assessor quanto para o escritório- e a orientação era “empurrar” a aplicação para os clientes, independentemente do perfil de risco e dos objetivos patrimoniais de cada um.
Um usuário no X (ex-Twitter) disse que sua assessora de investimentos da XP lhe ofereceu o COE da Ambipar, dizendo ser um ativo com taxa prefixada e capital protegido. Os bonds, porém, não contém garantias especiais, como o FGC (Fundo Garantidor de Crédito) e entrariam na lista de credores em caso de recuperação judicial.
Procurados, BTG e XP não comentaram.