BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes determinou nesta segunda-feira (4) a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro (PL), presidente do Brasil entre 2019 e 2022 e réu no processo sobre tentativa de golpe de Estado no final de seu governo.
No domingo (3), durante atos por anistia a réus da trama golpista, Bolsonaro esteve presente por meio de vídeos exibidos por apoiadores ou por ligações em vídeo. O ex-presidente estava proibido de usar redes sociais, mesmo que intermédio de outras pessoas.
Moraes também proibiu visitas, a não ser de advogados e pessoas autorizadas nos autos, e de usar celulares, diretamente ou por meio de outras pessoas. Moraes diz, ainda, que o descumprimento da domiciliar resultará na decretação da prisão preventiva do ex-presidente.
A ordem de prisão foi dada após Bolsonaro descumprir, no entendimento de Moraes, medidas cautelares impostas após a operação de 18 de julho, quando o ex-presidente foi obrigado a colocar tornozeleira eletrônica e proibido de usar redes sociais.
“A Justiça não permitirá que um réu a faça de tola, achando que ficará impune por ter poder político e econômico. A Justiça é igual para todos. O réu que descumpre deliberadamente as medidas cautelares pela segunda vez deve sofrer as consequências legais”, disse Moraes.
Procurada, a defesa do ex-presidente ainda não retornou os contatos da reportagem.
Por meio de nota, a Polícia Federal informou ter cumprido, no fim desta tarde, o mandado de prisão domiciliar e de busca e apreensão de aparelhos celulares, em cumprimento à decisão de Moraes.
Apenas um aparelho foi apreendido com Bolsonaro, de acordo com informações colhidas pela reportagem. Só houve operação na casa do ex-presidente, em Brasília.
A decisão que impôs tornozeleira, restrição de horários e acesso a redes sociais, além de contato com embaixadas foi tomada na esteira da investigação que também atinge a atuação do deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos EUA, em meio ao tarifaço imposto ao Brasil por Donald Trump.
“Ocorre que, mesmo tendo sido advertido […] o réu Jair Messias Bolsonaro reiterou as condutas ilícitas e acintosas e, em flagrante desrespeito às medidas cautelares impostas por esta Suprema Corte, preparou ‘material pré-fabricado’ para posterior postagens em redes sociais de seus filhos e apoiadores políticos, mantendo as mensagens ilícitas pelas quais as medidas cautelares haviam sido impostas”, afirmou Moraes.
Moraes cita, na decisão, uma ligação feita pelo deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) a Bolsonaro por chamada de vídeo no domingo (3), durante manifestações que pediram anistia ao ex-presidente.
A decisão foi recheada de publicações da imprensa sobre os atos e de redes sociais.
“Agindo ilicitamente, o réu Jair Messias Bolsonaro se dirigiu aos manifestantes reunidos em Copacabana, no Rio de Janeiro, produzindo dolosa e conscientemente material pré fabricado para seus
partidários continuarem a tentar a tentar coagir o Supremo Tribunal Federal e obstruir a Justiça, tanto que, o telefonema com o seu filho, Flávio Nantes Bolsonaro, foi publicado na plataforma Instagram”, disse, acrescentando link e print da publicação.
Segundo Moraes, o desrespeito ao determinado por ele se mostrou óbvio inclusive pelo fato de o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) ter excluído uma das publicações.
“O flagrante desrespeito às medidas cautelares foi tão óbvio que, repita-se, o próprio filho do réu, o Senador Flávio Nantes Bolsonaro, decidiu remover a postagem realizada em seu perfil, na rede social Instagram, com a finalidade de omitir a transgressão legal.”
A divulgação de imagens ou áudios tem, de acordo com Moraes, o propósito de atrapalhar o andamento do processo contra Bolsonaro no STF.
“Não há dúvida de que houve o descumprimento da medida cautelar imposta a Jair Messias Bolsonaro, pois o réu produziu material para publicação nas redes sociais de seus três filhos e de todos os seus seguidores e apoiadores políticos, com claro conteúdo de incentivo e instigação a ataques ao Supremo Tribunal Federal e apoio, ostensivo, à intervenção estrangeria no Poder Judiciário Brasileiro”
Na primeira avaliação de Moraes, em 24 de julho, Bolsonaro desobedeceu a proibição à divulgação mesmo que por outras pessoas de entrevistas em redes sociais. A defesa do ex-presidente disse ao STF naquele momento que jamais cogitou que ele estivesse proibido de conceder entrevistas e que ele não poderia ser punido por atos de terceiros.
O ex-presidente falou com jornalistas na tarde de 21 de julho na Câmara dos Deputados ao sair de reunião com parlamentares de oposição ao governo Lula (PT).
“Covardia o que estão fazendo com ex-presidente da República. Vamos enfrentar a tudo e a todos. O que vale para mim é a lei de Deus”, declarou. “Isso aqui é um símbolo da máxima humilhação”, afirmou, apontando para a tornozeleira.
A declaração de Bolsonaro foi gravada em áudio e vídeo e compartilhada por perfis de apoiadores e opositores do ex-presidente nas redes sociais.
Bolsonaro falou à imprensa menos de três horas depois de Moraes divulgar um despacho informando que as medidas cautelares impostas no dia 18 também proibiam o ex-presidente de dar declarações que fossem divulgadas nas redes.
“A medida cautelar de proibição de utilização de redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros, imposta a Jair Messias Bolsonaro inclui, obviamente, as transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas de redes sociais de terceiros”, escreveu Moraes.
Segundo o ministro, o uso de entrevistas para a divulgação de suas declarações nas redes sociais seria um meio de burlar a decisão judicial. Moraes já havia dito, então, que se a regra fosse desrespeitada, haveria “imediata revogação e decretação da prisão”.
O ex-presidente estava proibido de acessar redes sociais e de falar com Eduardo Bolsonaro, que está nos Estados Unidos e cuja atuação para o governo Trump levantar sanções contra o Brasil é investigada pela Polícia Federal.
O ex-presidente também era obrigado a usar tornozeleira eletrônica e não podia sair de casa à noite e nos fins de semana. Não podia manter contato com outros investigados ou com representantes de embaixadas estrangeiras.
As medidas foram impostas por Moraes após a PGR (Procuradoria-Geral da República) argumentar que elas seriam urgentes para evitar uma eventual tentativa de fuga de Bolsonaro. O ex-presidente nega a intenção de deixar o país.
Ainda no dia 21, a Primeira Turma da corte confirmou a decisão da corte, por maioria de votos. Apenas o ministro Luiz Fux votou contra o uso de tornozeleira eletrônica e a aplicação das outras medidas cautelares. Além de Moraes, votaram a favor das medidas os ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
Na operação de busca e apreensão de 18 de julho, a Polícia Federal encontrou US$ 14 mil na casa do ex-presidente. O inquérito no qual Moraes determinou as medidas é o que investiga a conduta nos EUA de Eduardo.
O principal processo contra Bolsonaro, porém, é um que já está na reta final. O político é acusado de liderar uma trama golpista que culminou nos ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro de 2023. Ele e vários de seus aliados podem ser condenados à prisão.