BNDES passa a financiar pesquisa para plantio comercial de árvores nativas

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Dentro da proposta de incentivar plantio de florestas e bioeconomia, o BNDES decidiu financiar a pesquisa para plantio e desenvolvimento daquelas árvores nobres da Mata Atlântica e da floresta amazônica, como pau-brasil, jatobá, mogno, jequitibá-rosa.

A meta do projeto é não apenas reunir conhecimento para a reconstituição de mata degradada, já que algumas dessas espécia estão até ameaçadas de extinção e precisam ser reinseridas, mas principalmente —e aí vem o caráter inovador da proposta— investir no estudo e organização de técnicas para também viabilizar o uso comercial dessas espécies.

O nome técnico disso é silvicultura, ciência que estuda o manejo de árvores para atender mercados, nesse caso, das chamadas árvores tropicais. A nova iniciativa foi batizada de BNDES Floresta Inovação, e será oficialmente lançada nesta sexta-feira (10) dentro de um combo de investimentos e anúncios em paralelo a um seminário dedicado a discutir o potencial das florestas brasileiras.

Existem diferentes iniciativas privadas e públicas de silvicultura com árvores nativas, mas nada com a escala e a diversidade propostas pelo banco público. Ao todo serão estudadas 30 espécies. A diretora socioambiental do BNDES, Tereza Campello, diz que o ponto mais importante da iniciativa é fomentar um ambiente para que especialistas consolidem conhecimento.

“O Brasil desenvolveu e acumulou, de forma fantástica, conhecimento científico aplicado à produção de eucalipto e pinus, de culturas como soja e cana-de-açúcar. A proposta é fazer o mesmo com árvores tropicais”, explica.

“Hoje, se quiserem plantar uma árvore dessas, seja para reconstituir floresta, seja para fazer um cabo de panela, até há conhecimento, mas não está sistematizado e disponível a todos.”

Os recursos para o investimento, não reembolsável, são provenientes do BNDES Funtec (fundo tecnológico do banco) e somam R$ 24,9 milhões por cinco anos. Como o BNDES responde por 80,8% dos desembolsos, as contrapartidas obrigatórias vão elevar os investimentos a R$ 30,8 milhões.

Instituições de ensino e pesquisa vão atuar como executores dos projetos, mas está prevista a possibilidade de acordos com empresas privadas, que poderão contribuir com recursos, pesquisas e também com a visão de mercado.

Já está definido que a Embrapa assumirá os estudos na área da Amazônia. A UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), no interior de São Paulo, vai coordenar o projeto na região de Mata Atlântica. Uma parte da pesquisa vai se debruçar sobre o perfil de árvores que já atingiram a maturidade em áreas de pesquisa, batizadas de polos de referência. Outra vertente vai fazer o plantio de mudas e acompanhar o crescimento.

O projeto já conta com 20 áreas de universidades e centros de pesquisa. Seis são polos de referência com árvores plantadas entre 15 e 45 anos de idade, e outros 14 já oferecem cerca de 160 hectares para o plantio.

“Os polos de referências são áreas plantadas com espécies nativas. São laboratórios vivos que vão gerar informações sobre o desempenho das espécies selecionadas”, explica um dos coordenadores do projeto na Amazônia, o pesquisador da Embrapa Florestas Silvio Brienza Junior.

A proposta é destrinchar as possibilidades de aproveitamento da árvores ao longo do ciclo de vida, o que inclui medir o potencial das sementes e folhas, por exemplo, para atender a produção de cosméticos, medicamentos ou diferentes tipos de utensílios.

A semente do cumaru, por exemplo, por causa do cheiro adocicado, ganhou o apelido de baunilha brasileira e é procurada para culinária e pela indústria de cosméticos (leia abaixo características já conhecidas de algumas espécies que serão estudadas).

“Com esse projeto, vamos romper paradigmas na área florestal, porque poderemos avançar no desenvolvimento da tecnologia para fazer o cultivo sustentável de espécies nativas para além das reservas, recuperando áreas degradadas e implantando as bases de uma nova economia”, diz Fatima Conceição Marquez Piña-Rodrigues, professora e pesquisadora do Departamento de Ciências Ambientais da UFSCar Campus Sorocaba e integrando do grupo de coordenadores do projeto para a Mata Atlântica.

Segundo Piña-Rodrigues, pode-se dizer que o BNDES Floresta Inovação veio para atender uma antiga demanda. O projeto foi apresentado pela FAI (Fundação de Apoio Institucional ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico), ligada à UFSCar, mas a proposta inicial partiu da Coalizão Brasil Clima Florestas Agricultura.

Esse movimento, que reúne mais de 400 entidades e empresas e mantém professores e pesquisadores, está engajado em ampliar o cultivo de florestas como parte da bioeconomia. Ainda em 2021, lançou um programa de pesquisa e desenvolvimento especificamente para a silvicultura de espécies nativas.

“Estudos comprovam que há floresta preservada onde há gente defendendo a preservação. Indígenas, ribeirinhos, quilombolas, comunidades extrativistas tradicionais fazem isso espontaneamente, e a gente precisa aliar ciência e negócios para quebrar a ideia da floresta isolada”, A diretora de Soluções Baseadas na Natureza da Vale, Patricia Daros.

“Inúmeras empresas privadas, como a Vale estão atuando nessa pesquisa, mas, por maiores que sejam, ainda são insuficientes. Precisamos de muito mais iniciativas, e a presença de um BNDES pode dar a escala necessária.”

A Vale estabeleceu para si mesma a meta voluntária de proteger e recuperar 500 mil hectares de florestas, além das fronteiras de suas áreas de atuação, até 2030 —e a silvicultura faz parte da estratégia para chegar lá.

De um lado, a empresa investe forte em pesquisa. Foram mais de R$ 600 milhões nos últimos 15 anos. O ITV (Instituto Tecnológico Vale) e o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), por exemplo, formaram o consórcio GBB (Genômica da Biodiversidade Brasileira), que trabalha para sequenciar o genoma da fauna e da flora brasileira, incluindo florestas. A Vale tem mais de 60 pesquisadores no projeto, com a missão de criar um dos maiores bancos de dados de DNA de espécies tropicais.

Em outra vertente, apoia o empreendedorismo da natureza. Por meio do Fundo Vale, um fundo de fomento a negócios de impacto ambiental criado há 15 anos, já aportou R$ 430 milhões, em 146 projetos para manter a floresta de pé, atingindo 60 mil produtores rurais e extrativistas e suas famílias. .

Daros lembra que os primeiros 6.000 hectares da meta foram entregues, entre 2020 e 2021, por Belterre, que recupera áreas degradadas por meio de sistemas agroflorestais, e Caaporã, que trabalha com o sistema agrossilvopastoril.

A Belterra nasceu como uma startup, com o projeto da Fazenda São Francisco, em Canaã dos Carajás, no Pará, com apoio do Fundo Vale. Instalada numa região assolada pelo desmatamento e tomada por fazendas de gado, possui 56 hectares, 46 dedicados à produção agroflorestal. Até hoje, é considerada uma espécie de laboratório a céu aberto.

O cacau é a cultura central. O viveiro com diferentes tipos está sendo organizado para ser um dos maiores do Brasil. A fruta que vira chocolate é cercada por múltiplas culturas. Vão se intercalando milho, melancia, banana, açaí e as árvores tropicais, que lentamente vão levando a floresta para dentro da agricultura.

O mogno foi plantado há seis anos e já tem uma boa altura. Há pequenos jatobás. Sumaúmas menores. Agora, os funcionários mostram com orgulho aos visitantes, prontas para serem plantadas, mudas de angelim-vermelho, espécie cada vez mais rara, que conseguiram a partir de uma doação de sementes. Ao atingir a maturidade, o angelim-vermelho pode passar de 88 metros de altura, o que faz dela não apenas a maior árvore da amazônia, mas também a maior da América do Sul e uma das maiores do mundo.

Hoje a Belterra é uma empresa madura em seu segmento de negócio, na implantação de sistemas agroflorestais para recuperar áreas degradadas. Atua em quatros e será destaque no evento do BNDES.

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LISTA DAS 30 ESPÉCIES

Foram destacadas em negrito as cinco espécies presentes em ambos os biomas

AMAZÔNIA

1 – Andiroba – Carapa guianensis

2 – Angelim-vermelho – Dinizia excelsa

3 – Aroeira-do-sertão – Myracrodruon urundeuva

4 – Castanha-da-Amazônia – Bertholletia excelsa

5 – Copaíba – Copaifera multijuga

6 – Cumarú – Dipteryx odorata

7 – Freijó-cinza – Cordia goeldiana

8 – Guanandi – Calophyllum brasiliensis

9 – Ipê-amarelo – Handroanthus serratifolius

10 – Ipê-roxo – Handroanthus impetiginosus

11 – Jatobá – Hymenaea courbaril

12 – Louro-pardo – Cordia trichotoma

13 – Marupá – Simarouba amara

14 – Mogno – Swietenia macrophylla

15 – Morototó – Schefflera morototoni

16 – Parapará – Jacaranda copaia

17 – Paricá – Schizolobium parahyba

18 – Quaruba-verdadeira – Vochysia maxima

19 – Tatajuba – Bagassa guianensis

20 – Ucuúba – Virola surinamensis

MATA ATLÂNTICA

1 – Araucária – Araucaria angustifolia

2 – Aroeira-do-sertão – Myracrodruon urundeuva

3 – Canafístula – Peltophorum dubium

4 – Guanandi – Calophyllum brasiliensis

5 – Guaritá – Astronium graveolens

6 – Ipê-felpudo – Zeyheria tuberculosa

7 – Ipê-roxo – Handroanthus impetiginosus

8 – Jacarandá-da-bahia – Dalbergia nigra

9 – Jatobá – Hymenaea courbaril

10 – Jenipapo – Genipa americana

11 – Jequitibá-rosa – Cariniana legalis

12 – Louro-pardo – Cordia trichotoma

13 – Pau-brasil – Paubrasilia echinata

14 – Pau-marfim – Balfourodendron riedelianum

15 – Vinhático – Plathymenia reticulata

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