SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, afirmou neste domingo (12), véspera da esperada libertação de reféns mantidos na Faixa de Gaza, que a campanha militar não acabou, apesar do acordo firmado com o Hamas na última quarta-feira (8).
“Ainda temos grandes desafios de segurança pela frente. Alguns dos nossos inimigos estão tentando se recuperar para nos atacar novamente”, disse Netanyahu em vídeo. “Estamos no controle.”
O premiê definiu a devolução dos reféns como “um evento histórico, que alguns não acreditavam” que aconteceria. “Uma noite de lágrimas; uma noite de felicidade”, afirmou. “É o início de uma nova jornada. […] Uma jornada de construção, uma jornada de cura e, espero, uma jornada de união.”
Ele disse ainda estar ciente dos “muitos debates” que acontecem em Israel agora. “Mas neste dia, e espero que também no período que está quase chegando, temos todos os motivos para deixá-los de lado, porque, com a força conjunta, alcançamos vitórias espetaculares, vitórias que surpreenderam o mundo inteiro.”
O premiê provavelmente se refere à mudança no equilíbrio de forças no Oriente Médio após ofensivas de Israel. Nos últimos dois anos, a força militar do Hamas foi praticamente aniquilada em Gaza, alguns dos principais líderes do Hezbollah, no Líbano, foram mortos, os rebeldes houthis, no Iêmen, sofreram pesadas perdas e Bashar al-Assad não é mais o ditador da Síria.
Já o chamado à união parece ser uma resposta à oposição que o premiê enfrenta internamente. Antes da guerra, Netanyahu e sua coalizão, a mais à direita da história de Israel, eram alvos de protestos massivos contra uma reforma judicial, que rapidamente se transformaram em manifestações por um acordo que pudesse libertar os reféns o que só ocorreu dois anos após o início conflito, quando dezenas de sequestrados nos ataques terroristas de 7 de outubro de 2023 já haviam morrido.
O chamado para uma luta parece ser endossado pelo extremista Itamar Ben Gvir, ministro da Segurança Nacional de Netanyahu que nos últimos dias ameaçou derrubar o premiê se o Hamas não fosse desmantelado. Neste domingo, ele compartilhou a mensagem de um grupo que representa uma pequena porcentagem dos familiares de reféns exigindo a tomada da Faixa de Gaza.
O ministro ainda pressiona o governo por uma mudança na libertação de prisioneiros palestinos o acordo de paz, com base em um plano de 20 pontos proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, prevê a libertação de 48 reféns restantes, vivos e mortos, em troca de 250 presos por Israel e 1.700 moradores de Gaza detidos desde o início da guerra. Entre os 48 há quatro cidadãos estrangeiros: dois tailandeses, um nepalês e um tanzaniano.
Ben Gvir pede que os prisioneiros sejam deportados, em vez de retornarem à Cisjordânia ocupada, onde ele mora, algo que o Ministério Público disse estar avaliando, segundo a imprensa local.
O Hamas, por sua vez, também tenta mudar o acordo de última hora em uma nova rodada de negociações que ocorre neste domingo. A lista inicial de prisioneiros palestinos não incluía nenhuma figura emblemática da luta armada palestina. Agora, porém, uma pessoa próxima das negociações disse à rede BBC que o grupo terrorista quer libertar sete prisioneiros considerados do alto escalão, incluindo Marwan Barghouti e Ahmad Saadat.
O primeiro foi condenado a prisão perpétua após planejar ataques que mataram quatro israelenses e um grego; o segundo cumpre uma pena de 30 anos de prisão por envolvimento em atentados, incluindo o que matou um ministro de Israel em 2001.
A libertação deles seria estratégica segundo pesquisas de opinião, Barghouti é um dos líderes mais populares entre os palestinos e poderia derrotar Mahmoud Abbas, atual líder da Autoridade Palestina, em uma eleição. O grupo, que governa a Cisjordânia, é um adversário histórico do Hamas.
Desde o início das negociações, no entanto, Israel se nega a libertar essas figuras, e ainda não se sabe o que poderia acontecer caso a facção não seja atendida.
Apesar disso, a declaração de Netanyahu demonstra que a libertação de reféns e prisioneiros a partir da manhã desta segunda está praticamente certa. A ideia era que os reféns chegassem à base militar de Re’im, onde seus familiares os aguardariam, antes das 9h20 locais (3h20 em Brasília), horário em que Trump deveria chegar ao país.
A questão da governança da Faixa de Gaza no pós-guerra também parece estar pacificada. A facção já havia concordado com a criação de um órgão tecnocrático para gerir o território, e, neste domingo, um membro do Hamas afirmou à AFP que o grupo não participará da transição.
Já a segunda fase do plano de paz, que inclui o desarmamento do grupo, envolve negociações “mais complexas e difíceis”, segundo afirmou à agência de notícias Hosam Badran, membro de alto escalão do Hamas. Outro integrante do grupo terrorista afirmou que a proposta de desarmamento da facção está fora de questão e não é negociável.
Enquanto isso, dezenas de caminhões de ajuda entraram em Gaza no terceiro dia de cessar-fogo. A chegada dos suprimentos ao território, que passa por uma grave crise humanitária devido ao bloqueio de Tel Aviv, faz parte do que foi acordado entre os negociadores em Sharm el-Sheikh, no Egito, ao longo dos últimos dias.
O fluxo, no entanto, ainda não é suficiente para atender a demanda do território devastado por dois anos de bombardeio, segundo o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância).
“O que Israel precisa fazer é muito simples”, afirmou à BBC News James Elder, porta-voz do órgão. “Abrir várias passagens, não apenas uma.” “Há cinco ou seis que Israel poderia abrir, e isso significa que esses caminhões, esses mil caminhões, não seguirão uma única rota. Eles terão múltiplos pontos de entrada.”
COMO SERÁ A TROCA
Fase 1: Troca e transferência inicial
A Cruz Vermelha Internacional coordenará o resgate dos reféns em local previamente acordado com o Hamas. O comboio seguirá então para encontrar o Exército de Israel, que assumirá a custódia dos sobreviventes e os transportarão para a base militar de Re’im, onde aguardam as famílias.
Fase 2: Triagem médica e reunião familiar
Na base de Re’im, cada refém será acolhido para avaliação inicial. Após exame preliminar de saúde, verificando a necessidade de intervenções imediatas, os sobreviventes encontrarão com seus familiares. Em seguida, serão transferidos por helicóptero da Força Aérea para três hospitais: Sheba em Tel HaShomer (10 pacientes), Ichilov em Tel Aviv (5) e Beilinson em Petah Tikva (5). Cada refém receberá área exclusiva para atendimento médico especializado, reabilitação e convivência familiar.
Fase 3: Recebimento dos mortos
Simultaneamente, a Cruz Vermelha vai preparar veículos adaptados para o transporte dos corpos dos 28 sequestrados mortos, mas apenas metade deverá ser devolvida na primeira etapa. Os caixões serão recebidos com cerimônia militar antes de serem encaminhados ao Instituto de Medicina Legal de Abu Kabir para identificação. Após confirmação das identidades, a Administração de Reféns e Desaparecidos notificará as famílias.