SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A província de Sweida, localizada no sul da Síria e assolada por violência desde o fim da semana passada, continuou sendo palco de combates entre minorias étnicas nesta sexta-feira (18), um dia após o governo retirar as tropas da região devido a bombardeios de Israel.
Segundo o OSDH (Observatório Sírio para os Direitos Humanos, ONG sediada no Reino Unido que conta com uma vasta rede de informantes), confrontos foram registrados a oeste e nas proximidades de Sweida entre “combatentes beduínos apoiados pelas autoridades, de um lado, e combatentes drusos, do outro”.
De acordo com três correspondentes da agência de notícias AFP, combatentes sunitas que vieram de várias regiões da Síria para apoiar os beduínos estavam se concentrando ao redor de Sweida. Um deles, Anas Al Enad, disse que havia vindo da cidade de Hama, na região oeste do país, “para atender aos pedidos de ajuda dos beduínos”.
Jornalistas da AFP relataram ter ouvido tiros e explosões, e vários combatentes drusos disseram à agência que estavam revidando tiros a oeste da cidade. Um correspondente viu casas, lojas e carros queimados em Walgha, vila drusa de Sweida, agora sob controle de forças beduínas.
Ainda segundo a agência, cerca de 200 combatentes de tribos beduínas foram vistos trocando tiros e disparando projéteis contra grupos drusos posicionados nos arredores de Sweida.
A crise começou no último domingo (13), quando o sequestro de um comerciante druso por combatentes beduínos desencadeou uma onda de violência na região. Um dia depois, o governo sírio enviou forças militares para conter o conflito, o que agravou a situação.
Profundamente desconfiados das autoridades, que desde a queda do ditador Bashar al-Assad, em dezembro, são lideradas por um ex-membro de um grupo ligado ao Estado Islâmico e à Al Qaeda, os líderes das milícias drusas pensaram que as tropas iriam atacá-los e se mobilizaram, de acordo com relatos. Outras testemunhas dizem que as forças do governo se aliaram aos beduínos.
O número de mortos é incerto. Segundo o OSDH, quase 600 pessoas foram mortas nos confrontos desde domingo. Já a Rede Síria para os Direitos Humanos, outro grupo de monitoramento, afirmou ter documentado 321 mortos em cinco dias de combates, entre eles profissionais de saúde, mulheres e crianças. Um ministro sírio, por sua vez, afirmou que o governo recuperou 87 corpos.
O chefe de direitos humanos da ONU, Volker Türk, pediu nesta sexta uma investigação rápida sobre os confrontos. “O derramamento de sangue e violência devem cessar, e a proteção de todas as pessoas deve ser a prioridade absoluta. Investigações independentes, rápidas e transparentes devem ser feitas sobre todas as violações, e os culpados devem ser responsabilizados”, escreveu em comunicado.
Na quinta-feira (17), ao anunciar a retirada das tropas da região para evitar “uma nova guerra de grande alcance” com Israel, o presidente da Síria, Ahmed al-Sharaa, afirmou que as facções locais e os xeques drusos assumiriam a responsabilidade pela segurança em Sweida.
Na véspera, Tel Aviv havia bombardeado o Ministério da Defesa sírio e os arredores do palácio presidencial, em Damasco, sob a justificativa de que era necessário proteger essa pequena e influente minoria do Oriente Médio. Espalhados por Líbano, Síria, Jordânia, Israel e Colinas de Golã, território sírio ocupado por Israel, os drusos seguem uma religião derivada do islamismo xiita e costumam ter relevância na politica dos países onde estão, incluindo o Estado judeu.
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Nesta sexta, Israel, cujas autoridades haviam chamado os novos governantes da Síria de “jihadistas mal disfarçados”, também recuou. Um funcionário que não quis ser identificado afirmou a jornalistas que, devido à instabilidade contínua na região, Tel Aviv havia permitido a entrada limitada de forças de segurança sírias na província de Sweida pelas próximas 48 horas.
Em nota, a Presidência síria disse que as autoridades enviarão à região de Sweida uma força com o objetivo de acabar com os confrontos e resolver o conflito. As tropas, segundo o governo, foram orientadas a agir “em coordenação com medidas políticas e de segurança destinadas a restaurar a estabilidade”.
De acordo com Rayan Maaruf, editor-chefe do site de notícias Suwayda 24, falta água e eletricidade na região. “A situação é catastrófica, não há nem leite em pó para bebês”, disse ele à AFP. O Ministério das Relações Exteriores de Israel anunciou o envio de ajuda humanitária aos drusos na Síria.
A desconfiança de Israel em relação à nova liderança islâmica da Síria parece estar em desacordo com seu principal aliado, os Estados Unidos, que afirmaram não apoiar os recentes ataques israelenses ao território sírio. Washington interveio para ajudar a garantir a trégua, e Sharaa deu crédito à mediação árabe, turca e americana por, segundo ele, salvar a região “de um destino incerto”.