SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Preso nesta terça-feira (12) durante a operação Ícaro, que apura um esquema de corrupção envolvendo empresas e a Sefaz-SP (Secretaria da Fazenda e Planejamento de São Paulo), Sidney Oliveira está à frente de uma empresa que nunca chegou a incomodar as líderes do varejo farmacêutico.
Criada em 2000, a Ultrafarma conta com apenas sete lojas na zona sul da capital paulista. Sua venda está concentrada no canal online, especialmente em medicamentos genéricos e similares, além de vitaminas com a marca Sidney Oliveira.
Os genéricos não são um segmento fundamental para as grandes redes de farmácia: representam entre 20% e 23% da venda de medicamentos, enquanto os remédios de referência concentram 70% do total. Similares respondem por uma fatia entre 7% e 10%.
O faturamento do grupo Ultrafarma não é um dado público, o que impede uma comparação objetiva com as grande redes, mas fontes do setor avaliam que esteja em torno de R$ 3 bilhões. O valor é, por exemplo, menos da metade do faturamento da quarta maior rede do país, a Farmácias São João, com atuação restrita à região Sul, mais 1.200 lojas e vendas que superaram R$ 8 bilhões em 2024. A quinta colocada, a gaúcha Panvel, fatura R$ 5,3 bilhões e soma mais de 630 lojas.
Em relação à líder do setor, RD Saúde, a distância é muito maior: o grupo que reúne as bandeiras Drogasil e Droga Raia somou vendas de R$ 41,8 bilhões em 2024, com 3.230 lojas em todo o território nacional. Só no canal online, o faturamento da RD Saúde atingiu R$ 7,1 bilhões no ano passado, o que também desbanca o argumento da Ultrafarma, que se apresenta como líder do varejo farmacêutico online no país.
Procurada, a Ultrafarma não atendeu a reportagem até o fechamento deste texto. Além das sete lojas próprias e da venda digital, o grupo opera um sistema de licenciamento de lojas com a bandeira Ultrafarma Popular (nas cores preta e amarela). Neste formato, criado em 2020, o grupo oferece a sua marca a farmácias já estabelecidas, que compram os suplementos que levam a assinatura do fundador.
Tem ainda a Óticas Ultrafarma, franquia lançada em 2018, com lojas no estado de São Paulo, e um ecommerce de produtos para o mercado pet, o Ultrafarma Pet.
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AS MAIORES REDES DE FARMÁCIAS DO PAÍS
Segundo ranking da Abrafarma, em vendas em 2024
1 – RD Saúde – Raia e Drogasil
Faturamento: R$ 41,8 bilhões
2 – DPSP – Drogarias São Paulo e Pacheco
Faturamento: R$ 16 bilhões
3 – Pague Menos
Faturamento: R$ 13,6 bilhões
4 – Drogarias São João
Faturamento: R$ 8 bilhões
5 – Panvel
Faturamento: R$ 5,3 bilhões
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O grupo de Sidney Oliveira, porém, desbanca todas as redes varejistas nacionais quando o assunto é investimento publicitário: só em 2024, foram aplicados R$ 827,2 milhões em anúncios, de acordo com o ranking elaborado pelo Kantar Ibope Media, publicado pelo Meio & Mensagem.
Com o montante, 11% superior ao de 2023, a Ultrafarma subiu da 10ª para a 8ª posição entre os maiores anunciantes do país. Ficou à frente de grandes redes varejistas como Magazine Luiza (R$ 621,5 milhões), 17ª colocada no ranking de anunciantes. No setor de varejo, só ficou atrás de Amazon (4ª colocada no ranking, com investimento de R$ 999 milhões em mídia) e Mercado Livre (5º lugar, com R$ 947 milhões).
Uma campanha que usa um avatar de Oliveira estreou mês passado na TV aberta e em mídia digitais. Foi a primeira vez que uma campanha da rede não usou o próprio empresário como garoto-propaganda.
Fontes ouvidas pela reportagem disseram que esse foi o jeito encontrado por Oliveira de se destacar em um mercado de grandes competidores com fôlego nacional. A imagem do empresário, hoje com 71 anos, teria a intenção de transmitir confiança ao consumidor, em um setor em que os grandes competidores colecionam décadas de experiência ou até mais de um século. No seu site, a Ultrafarma exibe selos de empresa campeã em satisfação do consumidor, como Reclame Aqui e NPS Awards.
Mas é uma estratégia que se mostraria suicida para os negócios, se fossem considerados os números “reais” do varejo farmacêutico, que trabalha com uma margem de lucro bruto de 28% e margem de lucro líquido em torno de 3% das vendas totais.
Considerando o faturamento da Ultrafarma em R$ 3 bilhões, a margem de lucro bruto da companhia seria de R$ 840 milhões, valor destinado a pagar as despesas da empresa (salários, aluguéis, marketing etc.), incompatível para um investimento declarado de R$ 827 milhões em mídia.
A política de altos descontos, que chegariam a 80%, também é impraticável. Qualquer desconto sobre o preço de medicamentos só é possível após negociação com a indústria, por isso não existem grandes variações de preços entre uma rede e outra, dizem fontes. A diferenciação que tem pautado o varejo farmacêutico nos últimos anos tem sido a oferta de serviços, como exames, testes e vacinação.
O setor tem se tornando mais concentrado nas mãos das grandes redes de presença nacional, mais ainda continua um negócio muito pulverizado em número de lojas.
De acordo com a Abrafarma (Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias), que reúne as 29 maiores redes nacionais, o setor faturou R$ 103,1 bilhões em 2024, o equivalente a 47% do varejo farmacêutico. Em 2023, a fatia era de 45%. Em número de lojas, porém, a grandes somam 12% do setor, com 11,2 mil pontos.
A Ultrafarma nunca foi associada à Abrafarma. Sergio Mena Barreto, presidente da entidade, afirmou que o fato de a operação Ícaro, deflagrada pelo Ministério Público de São Paulo, ocorrer agora, às vésperas da entrada em vigor da reforma tributária, é algo “emblemático”. “Com o novo regime, haverá a extinção da substituição tributária [onde eram realizadas as fraudes nas operações]. Nós valorizamos a transparência nas atividades das associadas.”