SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O investimento da holding do BTG e do Fundo Perfin na Cosan é visto pelos executivos da empresa e por analistas como uma maneira de equacionar as dívidas do conglomerado. Mas o preço das ações e a diluição dos papéis acabam por tirar a relevância dos acionistas minoritários.
As ações serão oferecidas aos novos investidores pelo preço de R$ 5 cada, valor considerado abaixo de mercado. Segundo o site Investing, a média do papel da Cosan, nos últimos 12 meses, foi de R$ 6,75.
As ações da empresa caíram R18,13% nesta segunda feira (22) e fecharam cotadas a R$ 6,14, em parte por causa da forte diluição para acionistas após o acordo.
“O custo de dívida da Cosan mói qualquer tipo de retorno que a empresa possa ter. O preço é absurdamente baixo. Veio muito fora. A mensagem que fica é do cara ferrado do lado de cá, devendo a deus e o mundo sem conseguir pagar. Chegam os banqueiros do lado de lá dizendo ‘te ajudo, mas vou tomar tua alma aqui dentro'”, avalia Victor Borges, especialista em investimentos da Manchester.
Pelo acordo, a Cosan vai receber até R$ 10 bilhões de investimentos, sendo R$ 7,5 bilhões de BTG, Perfin e Aguassanta (da família Ometto), em duas ofertas acionárias que devem diluir a participação dos minoritários.
A expectativa do grupo, segundo o CEO Marcelo Martins, é que a dívida total caia de R$ 21,5 bilhões para R$ 7,5 bilhões. A meta é, nos próximos anos, reduzir o nível de alavancagem da empresa a zero.
“Este é um caso clássico de reestruturação que fortalece o controlador e o minoritário se enfraquece. Quando você compara a história das cotações, o papel da companhia, não havia esse desconto dado para conversão da dívida. Quem vai comprar essas ações mais baratas será o grupo que está colocando dinheiro agora na companhia”, afirma Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec-RJ.
“Na prática, os minoritários estão perdendo poder. Equacionaram a questão da dívida, se fortalecem e se tornam mais poderosos no aspecto financeiro. É uma troca patrimonial vantajosa.”
A economista e investidora Louise Barsi considerou, em sua conta no Instagram, “uma das coisas mais vergonhosas contra acionistas minoritários que já presenciei.”
De acordo com analistas do Citi, o aumento de capital por meio de duas ofertas públicas primárias de ações implica uma diluição de 40% a 50% para os atuais acionistas. Em outras palavras, investidores que não comprarem mais ações terão sua participação no quadro acionário diminuída até pela metade -100 ações terão o peso de apenas 50, por exemplo.
Mas os analistas do banco ponderaram que o negócio será positivo para a Cosan. Entre as razões para tal visão está que a companhia poderá seguir uma trajetória saudável de geração de caixa.
Em relatório a clientes nesta segunda-feira, eles também citaram que os novos parceiros devem contribuir nas discussões sobre alocação de capital e gestão da Cosan, que poderá reduzir endividamento sem comprometer a qualidade do seu portfólio.
Pelo acordo, Rubens Ometto, por meio da Aguassanta, terá 50,01% e continuará com o controle da Cosan. Ele terá dois mandatos à frente do conselho de administração, o que lhe garante o comando por mais seis anos.
BTG e Perfin se tornaram acionistas de um conglomerado que tem usinas de etanol, postos de combustíveis, ferrovias e plantas de gás natural. O faturamento total está em torno de R$ 45 bilhões. Dos R$ 7,5 bilhões aportados, R$ 4,5 bilhões serão do BTG, R$ 2 bilhões do Perfin e R$ 750 milhões do Aguassanta.
Ao final do processo, o BTG será o maior acionista individual da Cosan, com 23,3%. O Aguassanta terá 21,3% e a Perfin ficará com 10,4%.
Ometto terá o controle por meio da Aguassanta e de outras holdings ligadas à sua família. Ele tem acordo de acionistas com poder de voto que lhe garantem o controle da Cosan.
De acordo com o CEO Marcelo Martins, o aumento de capital foi a melhor alternativa, já que a venda de ativos estava abaixo do valor que consideravam de mercado.
“A dívida da Cosan é ineficiente, o endividamento é muito alto e isso exigia uma medida muito urgente. As condições de mercado para venda de ativos são muito ruins. Buscamos alternativas por meio de investidores privados abrindo espaço para a gente, com calma, fazer gestão do portfólio”, disse ele.
O consenso é que a dívida da empresa, somada às taxas de juros praticadas no país, que a faziam gastar cerca de R$ 1,5 bilhão para rolar seu débito todo ano, tornaram necessária a necessidade de buscar dinheiro novo no mercado.
Analistas do UBS BB também consideraram a diluição “forte”, mas afirmaram que a operação é um passo positivo no esforço da Cosan para desalavancar e tem potencial para gerar valor no longo prazo.
“Muito mais do que a contribuição financeira, essa operação traz dois importantes novos acionistas com expertise nos setores para o grupo controlador: a holding do BTG (não o banco) e a Perfin”, ressaltaram Matheus Enfeldt e equipe em relatório enviado a clientes.
Eles também citaram que, embora o desconto em relação ao fechamento de sexta-feira seja grande, de 33,3%, ele é apenas 4,2% abaixo das mínimas de R$ 5,22 da Cosan.
“Eu não acho que seja uma recompensa [para os novos investidores]. É uma questão de mercado. É uma negociação, os que estão ali fora querem pagar um pouco menos, quem está dentro quer um pouco mais para não ser diluído em um custo tão baixo e aí chega uma negociação, chega em um preço que é bom para todo mundo. Então, acho que não é uma questão de recompensa, e sim uma questão de negociação”, diz João Daronco, analista da Suno Research.
Mas ele também considera que o preço de R$ 5 por ação é baixo e provoca uma diluição grande. “Isso vai fazer com que grande parte desses novos investidores entrem com um preço bem abaixo e isso preocupa outros investidores.”
Será convocada, segundo a Cosan, assembleia geral para aprovar o aumento de capital e dispensar BTG e Perfin da chamada “poison pill”.
O expediente serve para evitar que uma empresa sofra aquisição hostil. Neste caso, o acionista que atinge uma determinada porcentagem de participação é obrigado a fazer uma OPA (oferta pública de aquisição) para ter 100% das ações da companhia.
Consultado, o BTG não comentou.
A CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que regula o mercado acionário, disse, em nota, não comentar casos específicos mas que “acompanha e analisa informações e movimentações no âmbito do mercado de valores mobiliários brasileiros, tomando as medidas cabíveis sempre que necessário.”