"Eu não teria feito nada diferente", diz ex-presidente Campos Neto sobre atual direção do Banco Central

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Galípolo (esq.), hoje no comando do BC, e o antecessor Campos Neto: desafios à política monetária
(Gabriela Biló/Folhapress)
  • Sem ganhos de produtividade o Brasil não sairá do cenário de dívida e juros altos, diz o ex-presidente do BC
  • Segundo ele, polarização e "erosão" das instituições fizeram a política "avançar" sobre a economia
Por Vitor Nuzzi

[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
O ex-presidente do Banco Central Roberto Campos Neto, que encerrou seu mandato em dezembro do ano passado, após seis anos, disse que a atual direção do BC “tem feito um trabalho muito bom”. Mas também é “vítima” do mesmo problema que sua gestão enfrentou: “Como fazer uma política monetária de longa duração onde há uma percepção de que o fiscal está desancorado”. Em relação à política monetária, endossou as decisões da equipe comandada por Gabriel Galípolo. “Eu não teria feito nada diferente”, afirmou, durante seminário promovido pelo Conselho Superior de Direito da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), em parceria com a Academia Internacional de Direito e Economia (Aide).

Para ele, o tema mais importante neste momento, em relação à economia, é o da produtividade. É preciso “diminuir os gastos do governo e estimular o setor privado a tomar mais risco”. Medidas de estímulo “pelo lado da oferta, não da demanda”, acrescentou o atual vice-presidente do Conselho de Administração do Nubank e diretor global de políticas públicas. Recursos voltados à produção. “Se a gente não tiver mais produtividade, não tem como sair dessa equação [dívida + juros].”

No início da apresentação, Campos Neto fez referência ao período da pandemia – quando, segundo ele, aconteceu “o maior esforço fiscal conjunto da história do planeta”. E com o que chamou de “sincronização” entre as políticas fiscal e monetária. Mais gastos e juros menores – no Brasil, em 2020, a Selic caiu para 2% ao ano (hoje, está em 15%). O resultado foi positivo, acrescenta o ex-presidente do BC. “Teve gente que achava que íamos entrar em depressão. Transformamos a depressão em uma recessão pequena.” Nesse processo de recuperação em “V”, como definiu, os países emergentes gastaram em média 10% do PIB e os desenvolvidos, 20%. Mas o movimento de saída da crise deflagrada pela pandemia foi “totalmente desigual”, e a inflação voltou.

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“O Brasil foi o primeiro a subir juros”, disse Campos Neto, citando ainda o volume crescente de programas de transferência de renda. Mas sem os devidos parâmetros: sob medida, direcionados e temporários. “Nenhum deles foi bem.” Na sequência, a polarização, somada ao que ele chamou de “erosão das instituições”, fez com que a política “avançasse um pouco mais na economia”. A opção preponderante foi no sentido de aumentar a tributação sobre o capital. “A gente sai da pandemia com polarização e populismo.” E o país, segundo ele, carrega desafios como envelhecimento da população, baixa produtividade, sobrecarga tributária e dificuldades na transição energética.

Fecomercio
Gesner Oliveira: produtividade, infraestrutura e instabilidade política são empecilhos
(Edilson Dias/FecomercioSP)

A “fragilidade fiscal” e a baixa produtividade são alguns dos principais desafios brasileiros, segundo o economista Gesner Oliveira, sócio executivo da GO Associados. Além da infraestrutura deficiente e da instabilidade política. “Se a gente mantiver o nível atual de endividamento, precisaríamos de superávit primário acima de 4% do PIB”, afirmou, também na primeira parte do evento organizado pela FecomercioSP. O “nível atual” se situa em 79% (relação dívida/PIB), acima da média dos países emergentes (74%) e mais ainda da recomendação do Fundo Monetário Internacional (60%). “Apesar de indicadores razoáveis, a gente está numa situação extremamente problemática”, disse o ex-presidente da Sabesp e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), e ex-secretário-adjunto de Política Econômica. Um dos aspectos positivos seria o crescente “apetite” por parcerias público-privadas.

Ainda do lado positivo, acrescentou, há um “boom” de investimento privado no país. “Algo que a Faria Lima não se deu conta”, afirmou. São R$ 280 bilhões em valores correntes neste ano, R$ 234,9 bilhões de investimentos privados e R$ 45,1 bilhões de públicos. Para ele, o país precisa de reformas Administrativa e Previdenciária para ontem. No caso do salário mínimo, a correção integral pela inflação poderia ser mantida, mas com regra básica alinhada a ganhos de produtividade. Ele também defendeu reforma do Poder Judiciário, que chamou de “o mais caro do mundo”, com custo equivalente a 1,5% do PIB. Apenas a “convergência” aos emergentes (0,5% do PIB), sustentou, já traria efeitos positivos à economia.

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