BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro Luiz Fux pediu à presidência do STF (Supremo Tribunal Federal) para ser transferido da Primeira Turma da corte, que julga a trama golpista, para a Segunda.
O magistrado foi o único a votar contra a condenação de Jair Bolsonaro (PL) e outros integrantes do chamado núcleo crucial do caso, em julgamento no qual travou embates com colegas. Nesta terça (21), ele também pediu a absolvição dos acusados de integrar o grupo que disseminava desinformação. Todos os réus, inclusive o ex-presidente, ainda podem apresentar recursos à Primeira Turma.
Quatro integrantes do Supremo confirmaram à Folha que a solicitação foi formalizada no tribunal.
A movimentação pode alterar a relação de forças no STF. Se autorizada pela presidência, Fux seguirá para um colegiado que tem hoje os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, ambos indicados por Bolsonaro. Um trio eventualmente formado por eles pode derrotar em julgamentos Gilmar Mendes e Dias Toffoli, os dois remanescentes da Turma.
No documento em que faz o pedido de transferência a Edson Fachin, Fux cita que uma vaga na Segunda Turma se abriu com a aposentadoria do ministro Luís Roberto Barroso, que deixou a corte no sábado (18).
A transferência dos ministros entre as turmas está prevista no artigo 19 do regimento interno do Supremo. Fux, um dos mais antigos na Primeira, tem preferência no pedido.
Ele indicou a colegas no Supremo que gostaria de manter sua participação nos julgamentos da trama golpista. A Primeira Turma ainda vai analisar a denúncia contra outros núcleos da tentativa de golpe de Estado, e as defesas devem apresentar recursos contra as condenações.
Há uma interpretação de integrantes do Supremo de que, mesmo fora da Primeira Turma, Fux teria o direito de finalizar os julgamentos dos processos penais nos quais já votou pelo recebimento da denúncia.
Em tese, essa interpretação do regimento permitiria sua continuidade nos julgamentos da trama golpista. O ministro ficaria dividido entre suas atribuições na Segunda Turma e a análise dos processos pendente na Primeira Turma. Uma decisão sobre o tema caberá ao presidente do Supremo, Edson Fachin.
Fux comunicou os colegas da Primeira Turma sobre seu pedido de mudança no fim do julgamento desta terça-feira (21). Ele disse que a troca do colegiado era um acordo feito com o ministro Luís Roberto Barroso. “É bastante usual [a mudança]. Eu sempre perdi na antiguidade. Como Barroso se aposentou, tive de fazer esse movimento imediatamente”, disse.
Fux ainda afirmou que está “à disposição para participar de todos os julgamentos [da trama golpista], se for do agrado dos senhores”. O presidente da Primeira Turma, Flávio Dino, disse que vai submeter o caso ao presidente do Supremo, Edson Fachin. “Da minha parte, obviamente há integral simpatia”, disse.
Atualmente, a Primeira Turma tem, além de Fux, os ministros Flávio Dino (presidente), Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin.
Já a Segunda Turma conhecida como mais garantista, ou seja, por dar maior peso aos argumentos das defesas, é composta por André Mendonça e Nunes Marques, indicados por Bolsonaro; por Dias Toffoli e pelo decano da turma, ministro Gilmar Mendes, com quem Fux recentemente travou um duro diálogo.
Como revelou a coluna da jornalista Mônica Bergamo, na última quarta (15), o decano criticou o voto do colega no julgamento contra Bolsonaro na trama golpista e o chamou de “figura lamentável”. Fux, por sua vez, reclamou que vem sendo alvo de comentários depreciativos.
A vaga na Segunda Turma seria ocupada pelo indicado do presidente Lula (PT) para a vaga de Barroso. O ministro-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União), Jorge Messias, é o mais cotado. O petista decidiu confirmar o nome para o Supremo em sua volta da Ásia, na próxima semana.
Nesta terça, Fux usou o início de seu voto para defender sua mudança de posição nos julgamentos sobre a trama golpista e o 8 de Janeiro.
“Por vezes, em momento de comoção nacional, as lentes da Justiça se embaçam pelo peso simbólico dos acontecimentos e pela urgência em oferecer uma resposta rápida que contenha instabilidade político e social. Nessas horas, a precipitação se traveste de prudência e o rigor se confunde com firmeza”, disse.
Fux disse que foi convencido de sua mudança após julgar diversas denúncias amparado pelo sentido de urgência. “A humildade judicial é uma virtude que, mesmo quando tardia, salva o direito da petrificação e impede que a justiça se torne cúmplice da injustiça”, completou.
Para viabilizar sua saída da turma, o ministro informou aos colegas que deve liberar ainda nesta terça-feira seu voto do julgamento sobre Bolsonaro para compilação da Secretaria Judiciária do Supremo.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, ele pediu na semana passada a devolução do voto para uma revisão gramatical. O documento possui 429 páginas.
O movimento é importante porque somente após a entrega de todos os votos a Secretaria Judiciária pode preparar o acórdão documento que formaliza o resultado do julgamento.
É a partir dessa etapa que se abre o prazo das defesas para apresentarem recursos contra a decisão. Eventual demora pode postergar o início do cumprimento das prisões de Bolsonaro e seus aliados.