SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O cacique Roberto Anacé, com o apoio de cinco entidades da sociedade civil, pede que o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual do Ceará investiguem irregularidades na construção de um Data Center da fornecedora de energia renovável Casa dos Ventos em Caucaia, na região metropolitana de Fortaleza. A unidade, que obteve permissão do município cearense, deve receber máquinas do TikTok.
A representação, protocolada nesta terça-feira (26), reivindica a suspensão imediata do processo de licenciamento ambiental do complexo de processamento de dados, por causa da falta de um estudo de impacto ambiental e de um relatório de impacto ambiental, uma vez que a obra foi classificada pelas autoridades locais como de baixo impacto.
As entidades destacam o consumo de eletricidade do data center, que é projetado para ter capacidade instalada de 210 MW desde a sua primeira fase, o que o tornaria o maior complexo de processamento de dados do país.
O documento ainda questiona as estimativas de gasto de água disponíveis em relatório ambiental simplificado preenchido pela Casa dos Ventos, divulgadas pelo site The Intercept Brasil. “O projeto declara consumo de apenas 30 mil litros por dia, número incompatível com referências internacionais entre 11 milhões e 19 milhões de litros por dia para data centers de porte médio.”
A Casa dos Ventos afirma que sua unidade trabalhará com um sistema fechado de refrigeração líquida, que minora os gastos de água por não ter fase de evaporação, como ocorre, por exemplo, em grandes data centers americanos. “Hoje, o projeto na primeira fase está dimensionado para um consumo de menos de 30 metros cúbicos por dia, que é equivalente a 70 residências”, disse João Caldas, diretor de novas tecnologias da empresa.
“Hoje os data centers, até muitos dos que operam no Brasil, tem um sistema convencional onde você tem a evaporação da água como troca de calor, em que há menos consumo de energia, mas gasta mais água”, diz Caldas. “Se o projeto fosse assim, na primeira fase estaríamos falando de um empreendimento que consumisse água equivalente a mais de 40 mil residências.”
O Idec (Instituto de Defesa de Consumidores) que assessora o povo indígena Anacé com mais quatro associações, argumenta que obras que utilizam recursos ambientais “dependem de licenciamento ambiental rigoroso”. “A adoção de relatório ambiental simplificado para um empreendimento desse porte configura supressão do controle estatal, violando os princípios da prevenção e da precaução.”
De acordo com a entidade, a obra ainda está próxima do aquífero Dunas, classificado como altamente vulnerável e já pressionado por indústrias pesadas do Complexo do Pecém.
Em 4 de agosto, o povo indígena Anacé ocupou a sede da Semace em Caucaia para se mobilizar contra a construção do data center da Casa dos Ventos, da qual o grupo originário não foi avisado. O problema, segundo o cacique Roberto Anacé, é que as obras estão bem próximas ao aquífero Dunas, considerado sagrado pela comunidade.
“A gente tem um protocolo de consulta sobre obras nas nossas terras, que não é respeitado por nenhuma esfera do governo”, disse Roberto.
Entre os Anacé e a Semace, há uma disputa de entendimento. Para a superintendência, as obras estão a mais de 20 quilômetros do território indígena. Roberto, por outro lado, diz que essa distância é de três quilômetros, embora a fatia do território Anacé que ele reclama ainda não esteja homologada.
“É terra indígena de acordo com o artigo 231 da Constituição se está homologada ou não, é só uma questão de formalidade”, diz o líder comunitário.
Outro ponto de questionamento da sociedade civil é o licenciamento ambiental dos data centers, que, em Caucaia, por exemplo, precisam atender aos mesmos critérios do que um shopping center.
O professor de engenharia de telecomunicações da UFC Alberto Sampaio Lima diz que é competência dos municípios e que o estado está atento a essa discussão, embora não haja uma lei estadual.