BRASÍLIA, DF, E WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – O Itamaraty convocou o chefe da embaixada dos Estados Unidos, Gabriel Escobar, para dar explicações sobre novas ameaças de punição a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), no âmbito de uma ofensiva do governo Donald Trump em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Em publicação nas redes sociais na quinta-feira (7), a embaixada afirmou que o ministro Alexandre de Moraes é “o principal arquiteto da censura e perseguição contra Bolsonaro” e sinalizou que os “aliados de Moraes no Judiciário e em outras esferas” também podem ser punidos.
Escobar foi recebido no Ministério das Relações Exteriores na manhã desta sexta-feira (8) pelo embaixador Flavio Goldman, que ocupa interinamente a secretaria de Europa e América do Norte do Itamaraty.
Segundo relatos de integrantes do Itamaraty, o diplomata brasileiro manifestou indignação com o tom e o conteúdo das publicações dos americanos. Goldman teria reforçado a visão de que Trump atua com ingerência em assuntos internos, faz ameaças inaceitáveis e ataca a soberania brasileira em vez de negociar tarifas.
O brasileiro também expressou, de acordo com diplomatas, a expectativa de que a embaixada americana informasse à Casa Branca de maneira mais precisa sobre o processo no qual Bolsonaro é réu, conduzido em conformidade com a lei brasileira e o devido processo legal.
Goldman teria afirmado ainda que o Brasil está comprometido com a via das negociações para discutir com os EUA questões econômicas e comerciais, apontando serem inegociáveis a soberania nacional e a independência do Poder Judiciário.
Na diplomacia, a convocação do embaixador ao Ministério de Relações Exteriores é uma forma de demonstrar descontentamento com temas da relação bilateral.
Escobar é encarregado de negócios e responde interinamente pela missão diplomática dos EUA. O país está sem embaixador em Brasília desde janeiro de 2025, quando Elizabeth Bagley deixou o posto, com o fim do governo de Joe Biden. O governo Donald Trump ainda não indicou um novo representante.
O diplomata americano já havia sido convocado outras vezes ao Itamaraty para dar explicações sobre decisões e manifestações do governo americano em relação ao governo brasileiro e ao STF.
Nessas reuniões, o encarregado de negócios da embaixada dos EUA foi recebido pela secretária de Europa e América do Norte do Itamaraty, a embaixadora Maria Luiza Escorel. Ele não teve encontros com o chanceler Mauro Vieira.
Uma das primeiras convocações desse tipo ocorreu dias depois que Trump começou a direcionar seus ataques ao Brasil. Na ocasião, a embaixada americana reproduziu afirmações de que Bolsonaro e sua família eram parceiros dos Estados Unidos, falando em perseguição política contra ele.
Desta vez, a nova publicação da embaixada com ameaças ocorreu no mesmo dia em que Escobar se reuniu com o vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços) para discutir as tarifas impostas pelo governo de Donald Trump ao país.
Na quinta-feira, Alckmin disse ter apresentado ao diplomata argumentos de que a tarifa efetiva aplicada pelo Brasil a produtos americanos é de 2,7% e que, dos dez produtos que os EUA mais vendem ao Brasil, oito possuem tarifa zerada.
“Ele é o representante dos Estados Unidos no Brasil. […] E ele veio conversar, nós dissemos claramente os nossos argumentos”, afirmou Alckmin, defendendo o diálogo nas negociações com os americanos.
Nesta sexta-feira (8), o ministro Flávio Dino, do STF, criticou a publicação da embaixada dos Estados Unidos com as ameaças aos integrantes do Supremo.
“Lembro que, à luz do direito internacional, não se inclui nas atribuições da embaixada de nenhum país estrangeiro ‘avisar’ ou ‘monitorar’ o que um magistrado do Supremo Tribunal Federal, ou de qualquer outro Tribunal brasileiro, deve fazer”, disse Dino nas redes sociais.
O ministro completou afirmando que respeito à soberania e moderação são “requisitos fundamentais na diplomacia”.