Macron cede, e governo francês suspende reforma da Previdência até eleição de 2027, diz premiê

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PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) – Reconduzido na semana passada ao cargo de primeiro-ministro da França, depois de ter renunciado com apenas um mês no cargo, Sébastien Lecornu propôs nesta terça (14) uma suspensão da reforma das aposentadorias até a próxima eleição presidencial, prevista para 2027, em seu primeiro discurso diante da Assembleia Nacional. O anúncio é uma forma de garantir que seu governo não será vítima de uma moção de censura da oposição.

“Eis incontestavelmente uma ruptura”, discursou aos deputados.

Para demonstrar sua disposição ao diálogo com os deputados, o premiê prometeu não recorrer a um controverso dispositivo que lhe permitiria aprovar o orçamento de 2026 sem votação parlamentar, o artigo 49, alínea 3 da Constituição.

Ele também se comprometeu a propor a criação de uma “contribuição excepcional” sobre grandes fortunas —outra forma de contentar a oposição de esquerda.

Lecornu se recusa, porém, a adotar a “taxa Zucman”, um imposto de 2% sobre os patrimônios acima de € 100 milhões (cerca de R$ 640 milhões). O economista que propôs a taxa, Gabriel Zucman, acusou o premiê de poupar os bilionários em seu plano.

O primeiro-ministro também propôs que até o final do ano seja incluído na Constituição francesa o novo estatuto da Nova Caledônia, arquipélago do oceano Pacífico que pertence à França. Conforme acordo assinado em julho para pôr fim à disputa com os separatistas, será criado um “Estado da Nova Caledônia”, que pode ser reconhecido por outros países, mas continua a fazer parte da França.

“Não vamos censurar o governo a princípio e não faremos parte dos que derrubam primeiros-ministros. A França precisa de um mínimo de estabilidade, de governo, de orçamento”, disse Laurient Wauquiez, dos Republicanos, de direita.

Já a ultraesquerda, representada principalmente por Jean-Luc Mélenchon, criticou a suspensão da reforma como apenas uma postergação da medida. “E agora todos vão fingir que não ouviram que a suspensão da reforma tem uma data limite, e então volta a vigorar. Além disso, quem for eleito em 2027 pode compensar o atraso ou propor uma reforma pior”, disse.

A ultradireita aproveitou para criticar Macron. “Na Assembleia Nacional, dos Republicanos [direita] ao Partido Socialista (centro-esquerda), é o ciclo amigável dos salvadores de Emmanuel Macron que se sucedem falando no púlpito. O único denominador comum dessa maioria sem sentido, pronto para qualquer tipo de barganha, é o medo das urnas e o medo do povo”, afirmou Jordan Bardella, líder da Reunião Nacional (RN).

Lecornu é o quarto primeiro-ministro em um ano, sintoma da instabilidade da política francesa desde as eleições legislativas de 2024, que produziu um Parlamento dividido em três grandes grupos, nenhum deles com uma maioria clara no Legislativo e disposto a fazer concessões.

Caso o gabinete de Lecornu, caia, Macron sofrerá uma pressão ainda maior para dissolver a Assembleia e convocar novas eleições legislativas, em que a ultradireita seria favorita, ou renunciar ao cargo.

A questão central para a sobrevivência do segundo gabinete montado por Lecornu é o número de votos necessário para derrubá-lo. Para aprovar uma moção de censura, são necessários 288 dos 575 deputados com mandato em vigor.

Já anunciaram que vão votar contra Lecornu a ala mais à esquerda do parlamento (“insubmissos”, comunistas, ecologistas) e a ala mais à direita (a Reunião Nacional de Marine Le Pen). Isso representa cerca de 210 deputados.

O fiel da balança, portanto, são a esquerda moderada (o Partido Socialista) e o que resta da direita gaullista tradicional (Republicanos), cada vez mais próxima da ultradireita.

O gabinete tem seis ministros dos Republicanos. Por isso, o partido ainda hesita em censurar Lecornu. Os socialistas, por sua vez, mesmo sem participação no governo, afirmam aguardar o anúncio das primeiras medidas antes de tomar uma decisão. Reivindicam, sobretudo, a suspensão da reforma das aposentadorias promulgada em 2023.

Essa reforma prevê o aumento progressivo da idade mínima para se aposentar, de 62 para 64 anos. Parte da oposição de esquerda, e até economistas como Philippe Aghion, agraciado na segunda-feira com o Prêmio Nobel, propunham que a reforma seja “congelada” no patamar atual —62 anos e 9 meses —até a eleição presidencial de abril de 2027.

Esse debate evidencia o que realmente está por trás do cálculo de todos os políticos —a corrida para suceder Emmanuel Macron. O atual presidente não pode concorrer, por já estar no segundo quinquênio.

A impopularidade de Macron —uma pesquisa recente lhe atribuiu apenas 19% de opiniões favoráveis— faz dele um péssimo cabo eleitoral, o que o fez ser abandonado até por antigos aliados fiéis, como o ex-primeiro-ministro Édouard Philippe.

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