Marçal ativa símbolos bolsonaristas e provoca reações do ex-presidente

Uma image de notas de 20 reais
Do total de candidaturas registradas nas capitais, apenas 40 serão lideradas por mulheres, o que equivale a 20,8% dos candidatos às prefeituras
Crédito: Alejandro Zambrana/Secom/TSE

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um candidato que defende a família, ora a Deus e diz que o Brasil está em primeiro lugar. Que condena o comunismo e a ditadura venezuelana. Que é contra as drogas e a prostituição. Um homem que diz estar combatendo o sistema, que fala o que pensa e que não tem medo do confronto. Que não tem tempo de televisão, mas que tem ampla presença digital.

Com essa imagem Jair Bolsonaro (PL) pavimentou seu caminho à Presidência em 2018. Em 2024, Pablo Marçal (PRTB) tenta reeditar esse roteiro para chegar à Prefeitura de São Paulo.

Ao longo dos últimos meses, o influenciador tem ativado símbolos que são caros para o eleitor do ex-presidente, aproveitando-se do baixo entusiasmo de apoiadores de Bolsonaro com a candidatura do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Oficialmente candidato do ex-presidente, que indicou para a vice o ex-Rota Ricardo Mello Araújo (PL), Nunes não empolga os aliados de Bolsonaro por ser visto como alguém que evita o confronto e que não é verdadeiramente alinhado às pautas do grupo.

Na última semana a relação piorou. Bolsonaro e seu entorno ficaram insatisfeitos com uma gravação de Nunes em apoio à ex-deputada federal Joice Hasselmann (Podemos), hoje candidata a vereadora, considerada “persona non grata” por bolsonaristas desde que rompeu com o grupo em 2019.

Já havia um incômodo com o fato de que, mesmo depois de ter aceitado o indicado de Bolsonaro na vice, o prefeito vinha evitando explorar a imagem do ex-presidente em sua campanha. Nunes segue numa corda bamba: precisa do eleitorado de Bolsonaro, mas teme herdar a rejeição do aliado e perder votos do campo moderado.

Neste contexto, Bolsonaro fez elogios a Marçal e, seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), teceu críticas a Nunes. Em entrevista na quinta-feira (15) à Rádio 96 FM, de Natal, o ex-presidente disse que o influenciador “fala muito bem”, é “uma pessoa inteligente” e “tem suas virtudes”. Afirmou, ainda, que o prefeito não é o “candidato dos sonhos”, ainda que tenha assumido o compromisso de ajudá-lo.

Poucos dias depois, porém, Bolsonaro ajustou o discurso e afirmou à CNN que Marçal mentiu ao dizer que nunca buscou seu apoio. Também no fim de semana, segundo a colunista Raquel Landim, do UOL, enviou um vídeo a sua lista de transmissão no WhatsApp dizendo que Marçal e Lula (PT) são “farinha do mesmo saco” e que “certas coisas você não precisa experimentar para saber que é um produto estragado”.

Nesta segunda-feira (19), o PL publicou nas redes um vídeo no qual o ex-presidente reforça o apoio à candidatura de Nunes.

Segundo uma pessoa próxima de Bolsonaro, caciques partidários pressionaram o ex-presidente a manifestar, mais uma vez, que está com o prefeito. O pedido teria partido do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, do presidente do PP, Ciro Nogueira, e do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Tarcísio já manifestou a aliados, diversas vezes, preocupação com o crescimento do influenciador. Ele foi peça-chave no processo de aceitação de Mello Araújo como vice de Nunes, defendendo que a indicação seria importante para amarrar o ex-presidente com o prefeito e estancar a onda Marçal.

Enquanto o prefeito patina entre os bolsonaristas, o autodenominado ex-coach avança neste eleitorado, como mostrou o último Datafolha, do início de agosto. Ele conquistou, até agora, 29% das preferências entre os que escolheram o ex-presidente em 2022, ante 22% no levantamento anterior, de julho.

Aliados do ex-presidente afirmam que o perfil de Marçal, alguém mais agressivo, que vai para o confronto nos debates e que tenta parecer autêntico, agrada o eleitor bolsonarista. O influenciador também tem apostado em reforçar a imagem de virilidade e masculinidade, um aceno para os homens conservadores.

Políticos do grupo afirmam que não irão fustigar Nunes ou declarar apoio público a Marçal. Mas ponderam que o ecossistema digital revela que os eleitores estão animados com o influenciador e que líderes conservadores sem amarras com Bolsonaro podem acabar manifestando apoio ao empresário.

A estratégia de acionar símbolos bolsonaristas ficou clara na convenção do PRTB que confirmou a pré-candidatura de Marçal. Ele foi mencionado por dirigentes do partido como alguém que defende os valores “Deus, pátria e família”, lema de origem fascista que compôs a fundamentação ideológica do governo Bolsonaro.

O influenciador costuma dizer que tinha como candidato à prefeitura o deputado federal Ricardo Salles (Novo), que teve sua intenção de concorrer barrada por Valdemar Costa Neto, com apoio de Tarcísio, que entendia que um nome mais moderado teria melhor desempenho na capital.

Com Salles fora da jogada, afirma Marçal, ele entendeu que precisava entrar na disputa para evitar a vitória do psolista Guilherme Boulos.

Na convenção, o influenciador explorou o medo do comunismo transmitindo um vídeo que gravou na fronteira do Brasil com a Venezuela, disse que não admite a “ideologia de gênero” e afirmou que não irá tolerar as drogas, e sim tratar os usuários.

Ao fim do evento, sua mulher, Ana Carolina Marçal, entrou no palco com os quatro filhos do casal, crianças pequenas, sedimentando a imagem da família conservadora e cristã. O empresário se referiu aos filhos como 01 e 02, da mesma forma que sempre fez Bolsonaro.

Ana Carolina disse que Marçal sentiu um chamado no coração da parte de Deus e que, por isso, decidiu se candidatar. “Vai para o front, vai para a guerra”, ela afirmou ao marido, acrescentando que a família ficaria em casa no aguardo de sua volta.

O influenciador, que já disse antes da campanha que não é religioso, encerrou a convenção com uma oração. “Me dá sabedoria, senhor […]. Não sou mais um homem do setor privado, sou um homem do setor público, quero amar essas pessoas como ninguém nunca amou.”

Marçal também tem se colocado como um candidato que luta contra o sistema, como fez Bolsonaro em 2018. Nesta segunda-feira (19), o influenciador afirmou que as campanhas Nunes, Boulos e José Luiz Datena (PSDB) se reuniram em conchavo e tomaram a decisão de faltar ao debate Veja/ESPM para ridicularizá-lo. Os três não foram ao evento, adotando a mesma estratégia de fugir da agressividade do empresário.

“Esse teatrinho todo está armado para o Boulos ser prefeito, só que ele não estava esperando que um homem ia encontrar ele (sic) pelo caminho”, disse Marçal. “Não vamos admitir loteamento de 12 partidos políticos. Eles estão fazendo de tudo para um vagabundo assumir a prefeitura, só que não contavam com minha astúcia.”