SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As inovações trazidas pelo marco do saneamento destravaram projetos de concessão que, somados, preveem mais de R$ 370 bilhões em investimentos para os próximos anos. As mudanças, contudo, ainda não se refletiram na evolução dos indicadores de água e esgoto no país, que seguem estagnados cinco após a aprovação da lei.
Os achados são de um novo estudo do Instituto Trata Brasil em parceria com a GO Associados, publicado nesta terça-feira (19).
De acordo com o trabalho, o marco legal consolidou mudanças significativas para impulsionar o setor rumo à sua universalização. “O cenário atual, porém, ainda é precário: 16,9% da população brasileira vive sem acesso à água potável e 44,8% não possui coleta de esgoto”, diz o estudo.
Entre 2019 e 2023 último ano com dados disponíveis o país não apresentou melhora significativa no saneamento básico. No atendimento com água, inclusive, a variação no período foi negativa, de 0,5 ponto percentual. Em relação à coleta de esgoto, houve aumento de 2 pontos percentuais, enquanto no tratamento o salto foi de 5,5 pontos.
O estudo destaca que embora o indicador de tratamento de esgoto tenha mostrado a melhor evolução, ele segue sendo o mais distante da meta de universalização.
O marco legal do saneamento básico (14.026/2020), sancionado em julho de 2020 pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), estabeleceu metas para a universalização dos serviços de água e esgoto e buscou atrair investimento privado para o setor.
Na prática, a medida alterou a forma como os contratos de concessão são feitos, tornando obrigatória a abertura de licitação prévia o que abriu maior espaço para a participação de empresas privadas na disputa.
A nova legislação definiu a meta de ampliar o acesso à água potável para 99% da população até 2033. Até lá, o tratamento e a coleta de esgoto também devem alcançar 90%.
“Diante desses dados, torna-se evidente a lentidão com que os serviços de saneamento básico avançam no Brasil, apesar das metas estabelecidas”, diz o estudo. “A universalização não será alcançada sem um maior engajamento dos prestadores de serviços e o comprometimento dos governos federal, estaduais e municipais”, acrescenta.
O trabalho ressalta que, mesmo com os cinco anos passados desde a aprovação da nova lei, a disponibilidade de dados mais recente corresponde a um período de três anos após sua promulgação (20202023), o que é breve para que haja efeitos significativos sobre os indicadores.
Luana Pretto, presidente executiva do Instituto Trata Brasil, lembra que estados com grandes desafios no saneamento, como Pará e Piauí, concluíram suas concessões recentemente.
“A tendência é que possamos ver no futuro próximo uma melhoria na qualidade de vida, mas vamos seguir monitorando esses avanços”, afirma.
“Infelizmente, a evolução [nos indicadores] ainda é muito tímida. Mas quando avaliamos o aumento no volume de investimentos após a aprovação do marco, vemos que houve uma melhoria. Em 2020, por exemplo, foram investidos R$ 18,35 bilhões. Em 2023, esse valor saltou para R$ 25,59 bilhões.”
Como os projetos de água e esgoto costumam ser complexos (envolvendo licenciamentos, obras de infraestrutura e outras etapas demoradas), o estudo avalia que a melhoria nos indicadores vai ocorrer no médio e no longo prazo.
Um dos motivos para a previsão otimista é a evolução da agenda de concessões, privatizações e PPPs (parceria público-privada) no setor de saneamento básico. De 2020 para cá, houve mudança nos serviços prestados em 1.557 municípios, que representam uma população de quase 80 milhões de pessoas.
O estudo do Instituto Trata Brasil mostra que, entre 2020 e 2025, pelo menos 66 projetos de saneamento básico foram implementados no Brasil. A modalidade predominante foi a concessão comum que corresponde a 57 dos 66 projetos, seguida pelas PPPs, com 7 casos, e por 2 processos de privatização (Corsan, no Rio Grande do Sul, e Sabesp).
Somados, os projetos preveem investimentos de mais de R$ 370 bilhões. A Sabesp sozinha responde por R$ 257 bilhões.
Ainda que os investimentos estejam em alta, os valores precisam dobrar para que a universalização seja atendida no prazo.
Segundo estimativas do Plansab (Plano Nacional de Saneamento Básico), são necessários R$ 516 bilhões para atender as metas de água e esgoto. O estudo mostra que, subtraindo os investimentos feitos entre 2021 e 2023, restam R$ 454,1 bilhões a serem aportados, ou seja, R$ 45 bi anuais. O volume implicaria uma mudança brusca de rota, visto que a média de investimentos no país tem sido de R$ 20,7 bilhões por ano.