Motim bolsonarista impulsiona projeto para mudar foro e expõe Motta, mas anistia fica sem acordo

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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O motim bolsonarista que tomou o plenário da Câmara dos Deputados por cerca de 30 horas em protesto contra a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) impulsionou a discussão de propostas para blindar políticos contra investigações e denúncias criminais, deixando de fora a anistia para os condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.

O acordo também fragilizou o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que não participou diretamente da costura.

Partidos do centrão e da oposição fecharam um acordo para acelerar esses projetos. A ideia é proibir investigações contra deputados e senadores enquanto não houver aval prévio do Congresso e estabelecer três graus de julgamento para os processos contra os congressistas, retirando os casos do STF (Supremo Tribunal Federal).

Paralelamente, União Brasil, PP e PSD comprometeram-se a debater com o PL de Bolsonaro e o Novo um projeto para anistiar o ex-presidente e os condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Mas o acordo, neste caso, é apenas para tentar chegar a um texto de consenso -o que atualmente está longe de existir, já que os bolsonaristas querem perdão “geral, amplo e irrestrito” e o centrão defende punir quem vandalizou e organizou a depredação.

O acordo foi negociado para que houvesse a desocupação do plenário, que ocorreu no fim da noite de quarta-feira (6). Ele foi costurado pelo ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) sem participação direta do atual presidente.

Motta disse que se recusou a negociar pautas enquanto o motim não acabasse. O levante bolsonarista fragilizou o poder do deputado e aliados admitem que ele chegou perto de perder a governabilidade na Casa.

Embora esse grupo avalie o desfecho de forma positiva, com a reabertura dos trabalhos, interlocutores reconhecem que o episódio atrapalha a gestão de Motta, e até ameaçar sua reeleição para o cargo em 2027.

A cena de Motta sem conseguir ocupar a própria cadeira foi comparada nos bastidores à postura do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que, também enfrentando um motim, retomou o comando do plenário sem qualquer constrangimento, e ainda recebeu pedidos de desculpas da oposição.

O presidente da Câmara afirmou que analisa imagens das câmeras do plenário para definir se e quais deputados serão punidos por terem resistido a liberar a Mesa Diretora. Há pelo menos três deputados que são mencionados pelos colegas como possíveis alvos de punição -Zé Trovão (PL-SC), que barrou por alguns segundos a subida de Motta à mesa, e Marcel van Hattem (Novo-RS) e Marcos Pollon (PL-MS), que se recusaram a deixar as cadeiras que ocupavam.

Motta afirmou, no entanto, que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que muda o foro privilegiado tem apelo no Congresso, por haver “um sentimento de incômodo dentro da Câmara como do Senado com algumas decisões que são tomadas no Supremo Tribunal Federal”, e que se guia por esse sentimento para decidir o que vai para a pauta.

“Essas pautas digamos anti-Supremo ou anti-Poder Judiciário acabam tendo solidariedade recíproca por causa desse incômodo. É o dever de todos que fazem a pauta focar o que é importante para fortalecer as prerrogativas parlamentares, o Legislativo não abre mão disso”, afirmou nesta quinta, em entrevista ao site Metrópoles.

Atualmente, os processos criminais contra deputados e senadores são julgados diretamente no Supremo quando envolvem questões relacionadas aos mandatos. Com isso, o julgamento se esgota no próprio STF, instância máxima do Judiciário brasileiro, sem possibilidade de solicitar uma revisão a outros tribunais.

O objetivo de parte dos deputados é que os processos contra eles tenham três graus de jurisdição: começariam nos tribunais regionais federais (TRFs), com possibilidade de recursos ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e ao próprio STF.

A defesa feita pelo centrão é de que a Constituição prevê o duplo grau de jurisdição para todos os brasileiros, mas que os congressistas não têm essa possibilidade de revisão das acusações criminais contra eles por outros juízes.

O centrão se aproveitou da pressão dos aliados do ex-presidente para retomar essa pauta de olho em uma blindagem própria: há mais de 80 inquéritos no STF contra os deputados e senadores por irregularidades e desvios de dinheiro por meio de emendas parlamentares ao Orçamento.

O ministro Flávio Dino tem sob sua relatoria uma investigação contra toda a cúpula da Câmara na gestão de Lira, para que a Polícia Federal apure a tentativa de burlar a decisão que exigia transparência no envio desses recursos para estados e municípios, com o nome dos autores de cada indicação.

A volta na discussão sobre mudança no foro privilegiado foi demandada pelos bolsonaristas como forma de retirar o processo do ex-presidente do STF e mandá-lo para instâncias inferiores, o que atrasaria o julgamento sobre tentativa de golpe de Estado -que, no Supremo, está previsto para ocorrer em setembro.

Outro argumento dos bolsonaristas é de que os senadores se tornaram “reféns” dos ministros do Supremo, sem possibilidade de contestá-los, já que podem ser julgados criminalmente por eles depois. Isso, na visão deles, impediria o andamento de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes e outros integrantes da corte.

Integrantes de PL, União Brasil e PP também trabalham para blindar os deputados e senadores de investigações. Eles querem retomar uma regra que existia desde a primeira Constituição brasileira e que só permitia inquéritos contra os parlamentares no exercício do mandato para os casos após a autorização expressa do Legislativo, em votação.

Isso fazia com que os inquéritos ficassem parados enquanto o parlamentar não perdesse o mandato, e foi revogado pelo próprio Congresso em 2001, num pacote ético encampado pela Câmara diante de denúncias de corrupção.

O líder do PP na Câmara, deputado Dr. Luizinho Teixeira (RJ), diz que é favorável “ao retorno das prerrogativas parlamentares da Constituição de 1988”. “A mudança do texto constitucional criou um desequilíbrio, o Judiciário é um Poder acima do Congresso Nacional”, afirma.

A deputada Bia Kicis (PL-DF) chamou a proposta de “PEC da alforria do Congresso”. “Aqueles que têm medo terão coragem de fazer seu papel sem a chantagem dos togados. Vamos acabar com esse câncer que é o foro privilegiado. E depois vamos votar a anistia”, disse no plenário.

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