SÉRIE. Desafios 2026: Kheirallah: "O pequeno varejo sobreviveu graças ao Simples. Sem ele, muitos somem"

Uma image de notas de 20 reais
"A união das entidades empresariais é o que pode mudar o Brasil de verdade"
(Andre Lessa/Agência DC News)
  • Para o executivo, a Reforma Tributária, como está hoj evai desestimular novos negócios e incentivar a informalidade
  • Inspirado na perseverança fenícia, Kheirallah defende que a união da sociedade é chave para transformar o Brasil e impulsionar o comércio
Por Naiara Magalhães

[AGÊNCIADE NOTÍCIAS DC NEWS] 
Na série especial Desafios 2026, iniciativa da AGÊNCIA DC NEWS, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), as histórias de quem move a economia real ajudam a compor o retrato do empreendedorismo brasileiro em um momento decisivo, marcado pela transição tributária e pela busca de equilíbrio entre o poder público e o setor produtivo. A reportagem começou ouvindo Roberto Mateus Ordine, presidente da entidade, e segue com conversas com seus oito vice-presidentes e com o presidente do Conselho Superior, Rogério Amato. Agora é a vez de Nelson Kheirallah, vice-presidente da ACSP e coordenador do Conselho do Varejo, analisar as transformações do comércio nas últimas décadas e refletir sobre o futuro do setor. Com fala serena e olhar analítico, Kheirallah tem a disciplina de quem foi executivo e a vocação natural de quem nasceu no balcão – onde aprendeu a observar o comércio e sua gente. “O comércio é feito de perseverança e curiosidade”, afirmou. A frase sintetiza o espírito de quem aprendeu, ao longo de seis décadas trabalhando no varejo, que o segredo de permanecer é nunca perer o foco. 

A história de Nelson Kheirallah é a síntese da construção de São Paulo. Filho de imigrantes libaneses e criado no bairro do Ipiranga, cresceu entre teares, balcões e conversas de comércio – aprendendo cedo o valor da disciplina e da palavra empenhada. Formado em Economia pelo Mackenzie e pós-graduado pela Fundação Getulio Vargas, passou pelas áreas industrial, de exportação e pela expansão da Camisaria Colombo, onde coordenou a abertura de mais de 300 lojas em todo o Brasil. Desde 1995, integra a ACSP quando passou a entender as transformações do setor de modo mais amplo. Foi no marchar da história que ele viu nascer também o Simples Nacional, regime especial de tributação voltado para os pequenos e médios empresários. Com as mudanças desenhadas pela Reforma Tributária podendo afetar este perfil de tributação, o executivo tem uma certeza: “O pequeno varejo sobreviveu graças ao Simples; sem ele, muitos somem.”

Aos 77 anos, Kheirallah enxerga o cenário atual como o mar – na calmaria e na tempestade. O executivo considera imprescindível a colaboração entre os jovens, com seus conhecimentos em tecnologia e energia de trabalho, e “a experiência dos cabelos grisalhos” daqueles que já navegaram por mares intempestivos. Para fazer essa ponte, lidera desde 2007 o braço da ACSP que dialoga diretamente com o empresariado de todas as gerações. Um dos frutos dessa jornada será apresentado no dia 22 de outubro, com o lançamento do livro Gestão do Varejo, coordenado por ele e escrito por 20 autores ligados à associação. No texto de apresentação, Kheirallah exprime seu apego às tradições e à ânsia de aprender o novo. Traça o paralelo entre os fenícios, comerciantes que cruzavam mares sem comunicação, e o comércio digital do presente “do comércio sem fio dos fenícios ao comércio sem fio do e-commerce”, escreveu. A comparação é também seu manifesto sobre adaptação e coragem: “O comerciante que se fecha ao novo deixa de existir”, afirma, para em seguida completar: “Sobrevive quem se arrisca a aprender todos os dias.” Confira a entrevista.

AGÊNCIA DC NEWS – Para começarmos, a pronúncia do seu sobrenome é “Keirála” [se escreve Kheirallah]? 
NELSON KHEIRALLAH Isso.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual a origem?
NELSON KHEIRALLAH – Libanesa. Meu pai é libanês. Aliás, meus quatro avós são do Líbano. Então, eu sou 100% libanês! Meu pai veio para o Brasil em 1938. Chegou pelo porto de Santos e subiu para São Paulo. Ele já tinha um irmão mais velho morando aqui e montaram uma indústria de meias femininas, aquelas de nylon, no bairro do Ipiranga. Lá, conheceu minha mãe e se casaram em 1944. A família dela também tinha indústria no Ipiranga, uma tecelagem.

AGÊNCIA DC NEWS – Como era a vida no Ipiranga nesse tempo?
NELSON KHEIRALLAH Era um bairro misto – industrial e residencial. As crianças podiam brincar na rua à vontade. Eu lembro que minha mãe não era de soltar os filhos, era muito preocupada. Porém, com 10 anos de idade, ela me deixava pegar o bonde. Eu saía lá do Ipiranga e vinha até a Praça Clóvis [no centro da cidade]. Descia, andava até a Praça João Mendes [também no centro] e pegava outro bonde que ia para a Avenida Ibirapuera. Nós éramos sócios do Clube Monte Líbano, então, à tarde, depois da escola, eu ia fazer esporte lá. Natação, basquete, vôlei… Não tinha problema algum ir sozinho.

Aspas

Mais de 90% das empresas do Brasil estão no Simples – e a Reforma Tributária, como está, incentiva a informalidade

Aspas
Nelson Kheirallah

AGÊNCIA DC NEWS –E, mais tarde, chegou a trabalhar na indústria da família do seu pai ou da sua mãe?
NELSON KHEIRALLAH Meu pai resolveu vender a parte dele na fábrica de meias e montou uma indústria de roupas. Eu tinha 18 anos e comecei a trabalhar com ele. Começamos na Casa Verde e depois fomos para a Rua Augusta, no centro. Meu início de vida profissional foi esse. Eu cuidava da parte administrativa, do financeiro, da produção – comprava os tecidos, desenvolvia os modelos com outra pessoa, organizava os pedidos, supervisionava as vendas…Não era uma indústria muito grande. No auge, teve 40 ou 50 funcionários. Então, eu cuidava um pouco de cada coisa. Uma visão 360o do negócio. Meu pai do lado, orientando. 

AGÊNCIA DC NEWS –Pouco depois de ter começado a trabalhar com seu pai, você foi fazer faculdade?
NELSON KHEIRALLAH – Exatamente. Eu estava fazendo cursinho com 18 anos. Entrei na faculdade de Economia do Mackenzie com 19 anos. Me formei com 22 e ali pelos 25-26 anos fui fazer pós-graduação em Mercadologia na Fundação Getúlio Vargas para ter mais conhecimento na área de administração. Tivemos a indústria de roupas por uns 10-12 anos e resolvemos vender. Àquela altura, ali por 1975, nós já tínhamos também uma construtora, e quem cuidava era o meu irmão. Depois, com um amigo, compramos uma indústria química de produtos para a construção civil. Mas, no começo da década de 1980, teve uma crise muito forte no setor, que durou até 1984-85, e nós resolvemos vender as empresas. 

AGÊNCIA DC NEWS –E então?
NELSON KHEIRALLAH Em seguida, fui trabalhar com comércio exterior – me tornei sócio da IAT Autoparts, que exportava autopeças. Foram mais dez anos. Brinco que, até aí, eu fui comerciante; depois, virei comerciário, indo atuar como executivo no grupo da Camisaria Colombo. Fiquei quase 20 anos no grupo e, a partir de 2004, passei a cuidar da área de expansão da empresa – fazia abertura de lojas. Era o seguinte: eu ia ao shopping, escolhia o ponto, negociava o contrato, contratava o arquiteto e a construtora, escolhia o mobiliário e, quando a loja estava pronta, eu entregava para o setor de abastecimento para a inauguração. Eu fiz isso mais ou menos em 350 lojas. Até então, a empresa só tinha unidades em São Paulo e Brasília. Eu abri lojas nos 26 estados do país. Cheguei a fazer mais de 100 voos por ano, estava sempre no ar. Fiquei nessa posição mais ou menos de 2004 a 2014, um período de forte expansão.

AGÊNCIA DC NEWS – Que visão de Brasil essa experiência te deu? 
NELSON KHEIRALLAH – Me deu a visão de que existem em vários Brasis. Muitas vezes, eu voltava de viagem e falava para o pessoal: ‘Vocês já ouviram falar da rede de lojas tal?’. O pessoal respondia: ‘Rede o quê?’. Eles faturavam um bilhão e o pessoal nunca tinha ouvido falar porque, naquela época, a coisa era muito regionalizada. As lojas do Nordeste não vinham para o Sul, assim como as lojas do Sul não passavam para o Sudeste. E, depois, as coisas foram mudando, as redes de varejo foram expandindo para o Brasil inteiro. 

AGÊNCIA DC NEWS – Poderia falar mais sobre as mudanças no setor de varejo ao longo das últimas décadas?
NELSON KHEIRALLAH – Antes, tinha muito pequeno varejista. Meu avô mesmo, o pai da minha mãe, tinha uma loja muito grande de tecidos na rua 25 de Março. Os varejistas, então, tinham uma loja boa, mas uma loja só. Ele que cuidava. Depois, começaram a surgir as redes de varejo – Casas Bahia, Renner, Riachuelo, Pontofrio, Magazine Luiza –, que foram espalhando suas filiais pelo país. E aí surgiu também a figura da franquia, uma coisa que não existia antigamente. Ou seja, você terceiriza para outra pessoa a sua marca. Isso também se espalhou pelo Brasil inteiro. Hoje, existem cerca de 200 mil franquias no Brasil – roupa, estética, alimentos, comércio em geral. Então, foi mudando o perfil do varejo. 

AGÊNCIA DC NEWS –E nesse contexto de grandes redes e franquias, ainda há espaço para os pequenos varejistas? 
NELSON KHEIRALLAH Tem espaço, ainda que reduzido. O grande tem financiamento mais fácil, pode contratar uma boa empresa de marketing, pode contratar um bom escritório de advocacia. O pequeno é aquele que abre a loja de manhã, acende a luz, liga o computador; aí chegam os funcionários, ele está lá o dia inteiro acompanhando; fim da tarde, fecha, pega a vassoura, dá uma varrida e abaixa a porta. O que melhorou muito a subsistência dos miúdos de varejo foi a criação do Simples – que, infelizmente, com a reforma tributária que vai começar a vigorar a partir do ano que vem, vai praticamente acabar. 

AGÊNCIA DC NEWS – Por quê?
NELSON KHEIRALLAH – Vai deixar de ser vantajoso, porque o novo sistema tributário foi criado especificamente para quem trabalha com lucro presumido, lucro real. Você precisa ter um histórico de contabilidade, tem livros fiscais diferentes. Impossível. No sistema do Simples é, como o nome diz, muito mais simples: você recolhe um único imposto que engloba tudo: INSS, ICMS, etc. Quem está no Simples, vai ter que pagar os impostos de acordo com o novo sistema fiscal. Então, vai passar a ser desvantajoso. Isso é muito ruim, porque você desestimula a criação de novos negócios e incentiva a informalidade. A Associação Comercial tem trabalhado para que, antes de entrar em vigor o novo regime tributário, seja feita alguma alteração para não prejudicar tanto as empresas que estão no Simples.

AGÊNCIA DC NEWS – As empresas do Simples respondem por que parcela das empresas no Brasil hoje? 
NELSON KHEIRALLAH Mais de 90%! 

AGÊNCIA DC NEWS – Você é responsável pelo Conselho de Varejo na ACSP, certo? 
NELSON KHEIRALLAH Sim. Eu vim para a Associação em 1995 para fazer parte da Diretoria Plena. Em 2007, o presidente da época, Alencar Burti, resolveu criar o Conselho do Varejo e me convidou para ser o primeiro coordenador. Eu coordenei o Conselho do Varejo de 2007 a 2019 e, em 2023, voltei, com o Conselho tendo assumido um perfil um pouco diferente, mais técnico. A maior parte dos membros do Conselho do Varejo hoje são consultores, professores. Aliás, eles acabaram de escrever um livro, que será lançado em setembro.

AGÊNCIA DC NEWS – Ah, é? Como se chama?
NELSON KHEIRALLAH Chama-se Gestão do Varejo.

AGÊNCIA DC NEWS – E é um trabalho de quantas pessoas?
NELSON KHEIRALLAH – São vinte autores. Quem coordenou foi o professor Juedir Teixeira. Eu escrevi uma página [de apresentação] para falar um pouco “do varejo sem fio ao varejo sem fio” – ou seja, dos fenícios [povo originário da Fenícia, região que hoje corresponde ao Líbano], que não tinham nenhuma comunicação, ao e-commerce. 

AGÊNCIA DC NEWS – Que interessante! Então, revisitou as suas origens?
NELSON KHEIRALLAH Sim, fui dos meus antepassados até a venda virtual de hoje. 

AGÊNCIA DC NEWS – E o que o varejo sem fio dos fenícios ensina para a gente? 
NELSON KHEIRALLAH Ele ensina a força de trabalho, a persistência, a perseverança. Eles navegaram no começo pelo Mediterrâneo, principalmente, indo de porto em porto, vendendo, comprando, trocando mercadoria para depois vender em outros portos. Era uma vida muito dura, né? Ficar navegando lá pelos mares sem ter qualquer tipo de comunicação, sem saber exatamente que dia você ia chegar em tal porto. Eles foram os precursores do comércio, essa é a verdade.

AGÊNCIA DC NEWS – Sim, os libaneses são conhecidos por serem bons comerciantes. 
NELSON KHEIRALLAH Exatamente. 

AGÊNCIA DC NEWS – E os que vieram para cá deram boas contribuições ao comércio no Brasil?
NELSON KHEIRALLAH Os sírio-libaneses chegaram aqui sem nada. Muitas vezes tinham algum amigo, algum parente e começavam a mascatear – rodavam as cidades do interior, vendendo tecido, gravata, penduricalhos, enfim. Os anos se passaram e muitos deles se tornaram grandes empresários, grandes industriais, grandes comerciantes. Começaram uma vida muito difícil, mas com o comércio no sangue, né? Então, vem das origens de 3 mil anos atrás. 

AGÊNCIA DC NEWS – A habilidade de se associar contribuiu para essa trajetória bem sucedida? 
NELSON KHEIRALLAH Sim. Um vinha, começava a trabalhar, começava a prosperar, mandava uma carta que demorava não sei quanto para chegar lá, de navio, e falava para os irmãos e amigos: ‘Venham para o Brasil’. Os libaneses começaram a vir ao Brasil nos fins do século 19, por volta de 1880, depois que Dom Pedro II foi ao Líbano. Vieram para a agricultura, a indústria têxtil, o comércio…

AGÊNCIA DC NEWS – E, na sua visão, quais são os principais desafios do varejo hoje no Brasil? 
NELSON KHEIRALLAH O primeiro desafio é capital de giro, falta de financiamento. O segundo grande desafio é a mão de obra. A mão de obra no varejo é muito ruim. As pessoas acham que ser vendedor é pejorativo, então, acabam indo para esse setor gente que não têm nenhuma experiência profissional em nada. Alguns se tornam grandes vendedores, passam muitas vezes a gerenciar e supervisionar as lojas. Mas a maior parte acaba pulando de empresa em empresa. 

AGÊNCIA DC NEWS – E a gente reconhece nitidamente um bom vendedor, né? Quando fui a Istambul, fiquei impressionada com a arte do comércio nos bazares de lá. 
NELSON KHEIRALLAH É, de fato, a arte do comércio. Recentemente, eu estive com minha mulher no Egito e na Turquia. Eu dizia pra ela: ‘não fala gostei ou maravilhoso porque eles entendem, pode ter certeza’. Você diz ´é lindo!’, o preço já vai lá para cima. 

AGÊNCIA DC NEWS – E adoram a negociação!
NELSON KHEIRALLAH Eles adoram, e você também tem que ser um bom negociador. ‘Quanto custa isso?’. ‘Custa 100’. ‘Gostei muito, mas é muito caro. Acho que vale 20, 30’. ‘Não, que 20, 30, imagina…’ No fim, depois de uma boa negociação, você compra por 40.

“O bom negócio é aquele que faz sentido hoje sem perder o olhar no amanhã”
(Andre Lessa/Agência DC News)

AGÊNCIA DC NEWS – Para uma cidade como São Paulo ou para o Brasil, qual é o impacto de ter um perfil de varejo mais concentrado em grandes redes ou mais pulverizado em pequenos comércios? 
NELSON KHEIRALLAH Olha… A cidade de São Paulo é tão grande, são 12 milhões de habitantes, que tanto as grandes redes do varejo como o pequeno varejo são importantes. Nos bairros, a maior parte das empresas são de pequenos varejistas e você acaba comprando até por facilidade. Dependendo de há quanto tempo você mora no bairro, você entra na loja e o dono ou a dona te chamam pelo nome. Isso conquista o cliente, você vai se sentir mais feliz do que entrando em uma grande rede do varejo onde é um número – ninguém te conhece, você precisa ficar procurando um vendedor para te dar informação. Então, muitas vezes, a pessoa prefere até pagar mais caro, mas comprar naquele local onde tem um atendimento especial. Então, tem mercado para tudo.

AGÊNCIA DC NEWS – Hoje em dia, quais são as principais demandas do varejo para a Associação Comercial? Quais são as principais pautas nessa área? 
NELSON KHEIRALLAH Hoje a principal pauta é essa questão tributária, do Simples. Nosso presidente, junto com outras entidades, já esteve com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, levando uma demanda que é a modificação da legislação, antes que ela entre em vigor, porque é uma reforma tributária que vai penalizar muita gente. Nós tivemos um período aqui no Conselho do Varejo, mais ou menos de 2010 até 2013-14, onde o comércio estava muito acelerado – o pessoal da indústria de shopping centers captando muito dinheiro. Houve anos em que abriram 50, 60 shoppings no Brasil e começaram a expandir para o interior. Houve caso de dois empreendedores que queriam fazer shopping na mesma cidade, na mesma avenida, um na frente do outro. Então, a gente explicava: se os dois abrirem, numa cidade tão pequena, os dois vão sofrer. Os diretores das grandes redes do varejo, que tinham mais experiência, sabiam que um empreendedor individual não ia conseguir tocar um shopping porque dependia de muitos recursos – 200, 300, 500 milhões de reais – de um bom projeto, de uma boa administração… Eles iam no mais certo. Em alguns casos, acabaram saindo dois shoppings e o varejista se obrigava a abrir loja nos dois pra não ficar de fora. E, no fim, ele não ganhava dinheiro em nenhuma das duas. Era complicado. Mas, enfim, era um trabalho [que a gente fazia] em benefício tanto da indústria de shoppings como da indústria do varejo. A gente recebia gente aqui do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas, Goiás, Bahia, Pernambuco, Bahia, Mato Grosso…O Brasil inteiro conhecia quem estava no setor, nessas reuniões do Conselho do Varejo da Associação. 

AGÊNCIA DC NEWS – E qual a importância das distritais da ACSP?
NELSON KHEIRALLAH Nós temos hoje 15 distritais espalhadas por São Paulo – são como filiais que procuram atrair o empresariado que está nos bairros, ouvindo as demandas, trazendo palestrantes, vendendo serviços de junta comercial, certificado digital, mediação e arbitragem, etc. A pessoa não precisa ficar se deslocando, ela encontra todos os serviços no mesmo lugar. 

AGÊNCIA DC NEWS – Como é a sua rotina na ACSP hoje?
NELSON KHEIRALLAH Às terças, nós temos a reunião da Diretoria Executiva, que é composta por oito vice-presidentes, eu sou um deles. Venho também às reuniões do Conselho Deliberativo, além das reuniões dos outros conselhos. Quando tem alguma palestra de político ou especialista da minha área de interesse, eu venho ouvir. Nunca se é tão velho que não se possa aprender, nunca se é tão jovem que não se possa ensinar. 

AGÊNCIA DC NEWS – Esse interesse em aprender é um ponto que diferencia os varejistas que sobrevivem às crises? 
NELSON KHEIRALLAH Esse fato é muito importante em qualquer tipo de negócio. Os jovens trazem muito conhecimento para os mais velhos, principalmente nos últimos 20-30 anos com esse avanço surpreendente da tecnologia. A coisa está andando em tal velocidade que a gente nem consegue mais acompanhar. Então, os jovens trazem muitos ensinamentos para a gente. Do outro lado, nós temos a experiência dos cabelos grisalhos. Eu trabalho há 60 anos, então, já vi de tudo. Acho que a gente é um complemento para os mais jovens que têm muito mais energia para trabalhar e muito mais conhecimento nesse setor de tecnologia, que hoje é necessário.

AGÊNCIA DC NEWS – E que mensagem deixa para quem está começando no setor de comércio ou que está enfrentando um momento de dificuldade?
NELSON KHEIRALLAH Como é que é aquela frase? É 99% de suor e 1% de sorte…

AGÊNCIA DC NEWS – Noventa por cento de transpiração e 1% de inspiração? 
NELSON KHEIRALLAH – Pronto, você lembrou, obrigado. E eu gostaria que mais pessoas tivessem a consciência da importância das associações. As pessoas são acomodadas: ‘para que eu vou perder meu tempo lá, se tem quem faça por mim?’. Eu aqui sou voluntário, mas estou junto com meus companheiros defendendo a livre iniciativa. Seria importante que as pessoas dedicassem uma hora ou duas horas por mês a uma entidade para o bem comum porque quem pode mudar o Brasil é a sociedade. Nós temos milhares de associações no Brasil e a união de todas mudaria o país radicalmente. Então, deixo esse chamamento. Ao fazer isso, as pessoas vão beneficiar a si mesmas porque amanhã vai ter um bom resultado e vai reverter para quem tem o seu negócio.

Me despeço de Nelson Kheirallah com a sensação de ter conhecido alguém que sabe ler o movimento das marés. Hoje com a agenda mais tranquila, se comparada à dos tempos de empreendedor e executivo, mantém a rotina de ler, ainda pela manhã, os e-mails que frequentemente recebe de entidades do exterior com quem estreitou laços no tempo em que a Associação Comercial organizava comitivas para a feira do varejo, em Nova York. Um navegante que não está pronto para ancorar. Alguém que entende a sutil diferença semântica da frase “navegar é preciso, e viver não é preciso”.

Voltar ao topo