Massi assume direção da Mário de Andrade e tem como uma das missões construir novos públicos (Andre Lessa/Agência DC News)

Novo diretor da Biblioteca Mário de Andrade prepara festa do centenário e maior conexão com a cidade

  • “Aqui é um espaço que acolhe. Estou pensando em trabalhar um clube de leitura com moradores em situação de rua”
  • “A programação (do centenário) está sendo montada. Queremos que seja uma construção coletiva e a gente quer fazer barulho”
Por Vitor Nuzzi 23/07/2025
Atualizada em 28/07/2025
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[AGÊNCIA DC NEWS]. A primeira semana de Rodrigo Massi à frente da Biblioteca Mário de Andrade (BMA) incluiu a Feira do Livro, no bairro do Pacaembu, e contatos internacionais. É uma área familiar: ele já foi assessor especial e secretário municipal adjunto de Relações Internacionais, além de trabalhar na representação do Itamaraty em São Paulo. Está lendo agora A Inconveniente Loja de Conveniência, do sul-coreano Kim Ho-yeon, autor contemporâneo que acaba de passar pelo Brasil. “Posso dizer, como Mindlin, que sou um leitor indisciplinado”, disse Massi. “Leio vários livros ao mesmo tempo.” A referência é ao empresário José Mindlin (1914-2010), colecionador voraz de livros, que teve o acervo doado à USP, dando origem à Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) – Brasiliana (1916-2006) era mulher de Mindlin.

Massi, assim como seu antecessor à frente da Mário de Andrade – Guilherme Galuppo Borba –, não tem formação na área: é formado em direito pela PUC-SP. Fez curso técnico de museologia no Centro Paula Souza e diz que a experiência de duas décadas como gestor público o faz valorizar a dimensão humana e ajuda a identificar desafios. Para anunciar a troca de comando na biblioteca, o secretário municipal de Cultura e Economia Criativa, Jose Antonio Totó Parente, disse por meio de uma postagem no LinkedIn que Massi assume “com a missão de ampliar o acesso à literatura na principal biblioteca pública de São Paulo” e que a orientação do prefeito Ricardo Nunes é clara, “levar a Mário de Andrade até a periferia e trazer a periferia para a biblioteca”.

A saída do agora ex-diretor Borba, atribuída a influências políticas, surpreendeu pelo pouco tempo à frente da biblioteca – apenas cinco meses. “Tivemos um diálogo cortês e civilizado”, afirmou Massi. “Reconheço o empenho e o profissionalismo dele.” O novo diretor, que tomou posse no dia 10, comenta que a alternância é um processo normal. “O corpo técnico fica. Tenho dialogado com ex-diretoras e ex-diretores.” Ele pretende também incrementar o contato com o setor produtivo (editoras e livrarias), incentivar a visita de estudantes (“É uma premissa da gestão, a formação de novos públicos”) e as visitas guiadas. Na zeladoria, está firmando parceria com o Instituto Cervantes e o Consulado da Espanha para recuperação da escultura de Miguel de Cervantes que fica na praça Dom José Gaspar, onde está a Mário de Andrade. Pretende fazer o mesmo com o português Luís de Camões, o italiano Dante Alighieri e o pianista polonês Frédéric Chopin. “A biblioteca não é uma ilha. Precisa dialogar permanentemente com o entorno.”

Massi cita ainda o recente convênio firmado entre a Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa de São Paulo, a biblioteca e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep, vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação), que inclui investimento de R$ 4,4 milhões para preservação e digitalização do acervo histórico. Isso inclui jornais dos séculos 19 e 20. A Mário tem outro prédio, atrás do principal, onde fica a hemeroteca. Também por ali, o novo diretor pretende abrir o portão que dá acesso à praça Dom José Gaspar e à Galeria Metrópole, conectando os espaços.

CENTENÁRIO  A ação já visa as celebrações pelo centenário da Biblioteca Mário de Andrade, originalmente Biblioteca Municipal (o nome atual é de 1960) e que ficava instalada na Câmara. A Lei 2.836, de 1925, determinou a mudança para “local mais adequado” e que passasse a ser aberta ao público. A biblioteca começou a funcionar na rua 7 de Abril, também na região central, e está desde 1942 no atual endereço, no quadrilátero que inclui a praça Dom José Gaspar, a avenida São Luís e as ruas da Consolação e Coronel Xavier de Toledo, a 500 metros do Theatro Municipal, na praça Ramos de Azevedo, e a 400 metros da praça da República. O centenário terá três dias de atividades comemorativas, em outubro. “É uma programação que está sendo montada. Queremos que seja uma construção coletiva”, afirmou Massi. “A gente quer fazer barulho.”

É uma programação que está sendo montada. Queremos que seja uma construção coletiva. A gente quer fazer barulho

O diretor da biblioteca quer também “jogar muita luz” sobre o próprio Mário de Andrade, que foi o primeiro diretor do Departamento de Cultura, criado em 1935. No ano seguinte, surgiram a primeira biblioteca infantil (que em 1955 ganharia o nome de Monteiro Lobato) e a chamada Biblioteca Circulante (um furgão com livros, jornais e revistas que ficava nas praças da República e da Luz) – outra aposta do novo diretor. Mário de Andrade também foi autor do anteprojeto do então chamado Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan, o atual Iphan).

O paulistano Massi, que nasceu na região da Paulista e já morou na Zonas Sul e Norte, cita três obras que tem como referência: Fausto (Goethe), Grande Sertão: Veredas (Guimarães Rosa) e Esaú e Jacó (Machado de Assis). Frequentador da biblioteca, ele já foi inquilino do Copan e hoje permanece na região central da cidade, perto da Mário de Andrade. O suficiente para, se quiser, fazer o trajeto a pé. Essa conexão entre persona e território pode ser decisiva para o posto num ano tão simbólico. Em suas caminhadas, já observou moradores em situação de rua escrevendo em papeizinhos. E planeja levá-los para a Mário de Andrade, em parceria com outros órgãos municipais. “Aqui é um espaço que acolhe. Estou pensando em trabalhar um clube de leitura com esses moradores”, afirmou. A biblioteca, diz, precisa ser um espaço realmente público e inclusivo. “O que a torna indispensável? É uma pergunta que tem de ser feita todos os dias.”

Rodrigo Massi, na sacada da biblioteca com imagem de Mario de Andrade ao fundo
(Andre Lessa / Agência DC News)

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