Alexandre Lorenzetti, diretor de patrimônio: "A empresa manteve o espírito de meu pai" (Andre Lessa/Agência DC News)

Lorenzetti, detentora da patente do chuveiro elétrico automático, busca inovação na automação fabril

  • A Lorenzetti revolucionou o banho quente nas casas dos brasileiros e, atualmente, é a principal marca do segmento no imaginário da população
  • Empresa fundada por italianos no Brasil, atingiu receita de R$ 1,7 bilhão em 2024 (+7%). Para o futuro, companhia visa continuar expansão da presença em todo o país
Por Victor Marques 7 de Agosto, 2025 - 17:50
Atualizada às 7 de Agosto, 2025 - 15:45

[AGÊNCIA DC NEWS]. O Museu do Instituto de História e Filologia, em Nangang (Taiwan), afirma que o primeiro banho com água quente pode ser de até 3,3 mil anos atrás, na dinastia Shang, na China. Um grande caldeirão era usado para ferver a água, e pequenos caldeirões com uma única alça retiravam a água para ser despejada em bacias para uso. Desde então, o banho mudou. Foi compartilhado, em grupos, no império romano. Evitado na Europa, no século 14, para combater a peste. Nas primeiras décadas do século 19, passou a ser utilizado, como conhecemos atualmente para higiene, de forma generalizada. E, apesar do Brasil ser um país muito mais jovem, a história do banho moderno é bem brasileira – e grande parte dela se deve à Lorenzetti.

A companhia brasileira nasceu no ano de 1925 em um dos bairros mais italianos da capital paulista, a Mooca, fazendo jus à família. A Lorenzetti detém a patente do primeiro chuveiro elétrico automático – que esquentava a água assim que era ligado – se tornando a marca mais conhecida do segmento no país até hoje. Aos 102 anos e na terceira geração da família, a companhia está nas mãos de Aldo Lorenzetti, que olha para as raízes. Para conhecer melhor não apenas a própria história, mas entender como a inovação e automação das linhas de produção farão parte de sua história. Mas, para contar o futuro, é necessário, antes, o passado. E, curiosamente, apesar de ter sido o trunfo da empresa para chegar até aqui, a história da Lorenzetti não começa com chuveiros. Por conta do pioneirismo da companhia, a Lorenzetti recebe o prêmio 2025 de Comércio Histórico – Estabelecimentos Tradicionais de São Paulo, criado este ano pela Agência de Notícias DC News, que pertence à Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

Em meados de 1900, o engenheiro italiano – formado em Roma em 1886 – Alessandro Lorenzetti vem ao Brasil, a serviço de uma empresa de montagem de estruturas metálicas. Aqui, participa de projetos como a estrada de ferro Santos-Jundiaí e o porto marítimo de Vitória (ES). Durante esse tempo de ofício, fez amizade com Carlos Tonanni, com quem investiu em terras de reflorestamento na região do ABC paulista. Ele volta para Itália e só retorna ao Brasil duas décadas depois. Em 1920, vem ao país para tratar da venda dos terrenos comprados, devido a uma reforma agrária que proibia que estrangeiros de possuir terras vinculadas a agricultura – e o reflorestamento se enquadrava. Durante ambas estadias em solo brasileiro, Alessandro notou que o Brasil não fabricava os parafusos necessários para as obras que participou – e nem para máquinas industriais. Virou ideia de negócio. Com o dinheiro da venda dos terrenos, ele e Tonanni montam uma pequena fábrica para produção de parafusos, na Mooca, onde fica a atual fábrica da Lorenzetti. Em 1923, é formada a Sociedade Tonanni e Lorenzetti.

SUCESSÃO – Em 1925, Alessandro volta à Itália e chama dois de seus quatro filhos, Lorenzo e Eugênio, para cuidar do negócio a partir daí. Eugênio Lorenzetti, engenheiro industrial e químico, ficou responsável pelos setores administrativos e comercial da empresa. Lorenzo Lorenzetti, técnico agrimensor, homem de grande vocação criativa, foi então, encarregado das criações engenhosas da companhia – detentor de diversas patentes, inclusive, futuramente, a do chuveiro elétrico automático. “Meu pai sempre foi muito empreendedor”, afirmou Alexandre Lorenzetti, diretor de patrimônio da companhia (e o guardião da história da empresa), filho de Lorenzo. Do início do ofício em parafusos e peças a máquinas industriais, o negócio logo começou a diversificar. Em 1928, a empresa começa a produzir bandejas para restaurantes, açucareiros, galheteiros, vasos de latão, acessórios de metal para cortinas, patins e isqueiros. “Meu pai e meu tio faziam o que o mercado pedia e deixavam de fazer quando se tornava obsoleta”, afirmou. “Até hoje somos um pouco assim. Talvez seja o porquê de chegarmos aos 100 anos.”

Meu pai e meu tio faziam o que o mercado pedia. Até hoje somos um pouco assim e talvez seja o porquê chegamos aos 100 anos

Alexandre Lorenzetti, diretor de Patrimônio na Lorenzetti


A sorte dos irmãos não parou nos negócios. Em 1929, Eugênio ganha na loteria e usa parte do prêmio para trazer a família para perto, no Brasil. Vêm da Itália a mãe, Adele, e a irmã, Amélia. Amélia trabalhou no departamento de contabilidade da empresa até os anos 1950. A gêmea de Amélia, Battistina, vem ao Brasil anos mais tarde, com o marido e o filho. A família morava em uma casa dentro da fábrica, que hoje virou o ambulatório da empresa e continua com a fachada preservada. Na época, foi lá que a mãe montou uma creche para os filhos das funcionárias. As funcionárias eram em sua maioria as pessoas que trabalhavam na creche e, segundo Alexandre, peculiaridade que continua até hoje em algumas linhas de produção da empresa. “Isso acontece devido ao processo de montagem. As mãos das mulheres, menores, eram mais apropriadas.”

Logo acontece a revolução de 1930, que marcou o fim da chamada República Velha, desencadeada pela crise econômica e o desgaste da política “do café com leite”, que favorecia as elites paulistas e mineiras. Sob a gestão de Getulio Vargas, a Lorenzetti entra no setor de energia elétrica, produzindo isoladores de disco de porcelana e ferragens para linhas de transmissão de energia. E, para isso, constrói o primeiro forno industrial para cerâmica no Brasil. Em 1934, fabrica, pela primeira fez na América do Sul, a resina conhecida como baquelite – utilizada para isolamento de fios e cabos, componentes de interruptores, tomadas e outras aplicações em diversas indústrias, como a automotiva, de brinquedos e até em utensílios de cozinha. O pioneirismo não parou por aí. Em 1938, a empresa fabricou o primeiro motor elétrico de até 100 cavalos de força para máquinas industriais. Em meio ao sucesso da empresa, começa a Segunda Guerra Mundial e grande parte dos materiais, anteriormente importados, tiveram que começar a ser produzidos nacionalmente. E quem se deu bem nessa história foi a Lorenzetti.

Devido à escassez de gasolina, a Lorenzetti desenvolve um equipamento para adaptar motores ao uso de gasogênio, gás obtido por meio da queima de carvão. O equipamento podia ser instalado em máquinas e até em automóveis e caminhões. O sistema levava a marca LOZ. Em 1942, a empresa também inicia a fabricação de materiais elétricos como interruptores, chaves, porta-lâmpadas e fusíveis. Tornou-se a maior fábrica de materiais elétricos de baixa tensão da América Latina, tamanho era o sucesso da empresa, mas sua era de ouro demoraria mais uma década para chegar.

Em 1950, pouco após o fim da Segunda Guerra, o mundo começa a se recuperar economicamente. Consequentemente, a urbanização das cidades se torna um padrão e a rede de energia elétrica se expande, apesar de ainda não chegar a zonas rurais afastadas. Em 1952, mesmo ano de nascimento de Alexandre, a Lorenzetti vive o momento mais importante de sua história: a criação do primeiro chuveiro elétrico automático. E porque o primeiro automático e não o primeiro e ponto? Isso porque o primeiro chuveiro elétrico foi criado em Jaú, no interior de São Paulo, por Francisco Canho. Alternativa mais barata ao aquecimento a gás, amplamente utilizado na Europa, utilizava uma resistência elétrica para aquecer a água. O diferencial do produto da Lorenzetti era a capacidade de esquentar a água assim que a torneira era ligada, sem a necessidade de ligar a energia separadamente. Foi um sucesso tamanho que a empresa expandiu a linha com torneiras e aquecedores independentes.

No início dos anos 1960, o sucesso dos chuveiros possibilitou a expansão da presença da marca nas casas dos brasileiros. São lançados produtos como ventiladores, ferros elétricos e condensadores para aparelhos de rádio e TV – utilizados para estabilizar a tensão e filtrar ruídos, e também em circuitos de sintonia. Em 1964, acontece o golpe militar, mas nem isso parou os irmãos Eugênio e Lorenzo. O governo aposta nas hidrelétricas como principal fonte de geração de energia e a Lorenzetti surfa essa onda, apostando no setor de infraestrutura, mas sem abandonar a produção de chuveiros e eletrodomésticos. No início da década de 1970, Aldo Lorenzetti, irmão mais velho de Alexandre, assume a presidência da empresa. Cinco anos depois, Alexandre começa a fazer parte da história da companhia, quando se forma em Engenharia Civil e é chamado pelo cunhado para trabalhar na companhia. “Minha primeira atribuição foi construir um vestiário onde era a fundição”, afirmou. Ele conta que, apesar da boa estrutura do prédio e seguir de pé até hoje, a beleza visual não agrada. “Por que não fiz algo mais bonitinho? Mas eu era engenheiro, não arquiteto.”

Quatro anos depois, em 1979, a empresa perde seu gênio inventor. Morre Lorenzo. Segundo Alexandre, a morte foi muito sentida, pois o pai era um líder carismático, mas a transição de liderança foi planejada. “A empresa manteve o espírito de meu pai, continuando a inovar e a reaproveitar recursos”, disse. Algum tempo depois, nos anos 1990, a superinflação destruía o poder de compra do brasileiro. Dada as incertezas político-econômicas da época, a Lorenzetti decide afunilar a produção como foco em aparelhos de uso residencial, apostando forte no seu carro-chefe, os chuveiros elétricos. Durante esses anos, lançou as primeiras duchas com comando eletrônico e pressurizador incorporado, permitindo banhos com mais água e mudanças graduais de temperatura. É lançado o slogan “Pensou em banho, pensou em Lorenzetti.” A companhia também anuncia a nova unidade de negócio de aquecedores de água a gás.

No último ano do milênio, o purificador de água da Lorenzetti chega ao mercado, a partir de uma tecnologia de tratamento de água desenvolvida na própria fábrica. Em linha com a expansão nas casas brasileiras, em 2003 começa a atuar no mercado de metais sanitário e investe em uma nova fábrica, de 24 mil metros quadrados, a menos de uma quadra do prédio original da companhia. Nesse segmento, apresentou inovações como as torneiras com mecanismo cerâmico de um quarto de volta, que economizam água ao diminuir o tempo de fechamento da torneira. Em 2010, com o sucesso dos produtos de metais sanitários, expande o portfólio com a nova linha de plásticos sanitários, com assentos, duchas, acabamentos para registro, válvulas para descarga, acessórios para banheiro e jardinagem. Também marca o investimento em processos automatizados de injeção assistida por gás de tecnologia inglesa.

Dois anos depois, a Lorenzetti começa a desenvolver o fim do gasto energético com lâmpadas. Nesse ano, lança uma linha de lâmpadas fluorescentes compactas e, mais dois anos depois, uma de lâmpadas LED. Em 2015, compra a fábrica de louças sanitárias Sanitex Sanitários Togni Ltda., em Poços de Caldas, no sul de Minas Gerais. No mesmo ano, após a expansão no mercado sanitário, recebe o Prêmio Design do Museu da Casa Brasileira, pelo lançamento da linha Acqua Ultra de duchas e chuveiros. A inovação veio nas resistências, que possuem durabilidade superior às resistências comuns. Quatro anos mais tarde, inicia a adaptar a compatibilidade dos produtos com outros sistemas de aquecimento, como a energia solar.

Fábrica em Poços de Caldas foi comprada por R$200 milhões
Divulgação

A guerra e o golpe não interromperam as inovações da empresa. Nem a pandemia. A Lorenzetti ficou paralisada somente por um mês – entre 23 de março e 30 de abril de 2020, quando retomou as atividades com um plano de segurança traçado e o funcionamento da fábrica em três turnos. Deu certo: o faturamento cresceu 20% em relação ao ano anterior. Em 2021, quando iniciou a demonstração oficial de resultados financeiros, reportou receita operacional líquida de R$ 1,7 bilhão, ante R$ 1,3 bilhão em 2020. A empresa registra crescimento de 55% durante os anos da pandemia. Em 2022, atinge, pela primeira vez, R$ 2 bilhões anuais de faturamento bruto, exportando para mais de 45 países. Em 2023, a companhia, perto do centenário, lança a linha Lorenzetti 100 anos, de chuveiros elétricos. A inovação vêm dessa vez por meio da tecnologia. Com um timer que indica o uso racional de água – que apita ao atingir oito minutos de banho – e um regulador de temperatura digital.

No ano passado, a receita líquida cresce 7%, para R$ 1,7 bilhão. E a empresa olha para suas raízes familiares a fim de perpetuar sua história. Alexandre, que faz parte do conselho administrativo da companhia, resumiu os próximos cinco anos do negócio em uma palavra: inovação. Segundo ele, as novas gerações da força de trabalho estão exigindo mais dinamismo e a necessidade de automatização dos processos fabris. “Você não vê mais o pessoal de baixão de fábrica com interesse em trabalhar numa linha de montagem”, afirmou. “Esse cara quer operar um computador. E as coisas têm que mudar mesmo. É um desafio.” Para conselheiro e que também é o guardião da história do negócio centenário, para esses próximos cinco anos, a Lorenzetti vai continuar a inovar com um mote: expandir a presença no lar dos brasileiros. “A gente já pensou no passado em mudar estrategicamente. Bobagem como vender bicicleta”, disse. “Mas nosso horizonte está ligado com casa, com cozinha, com banheiro, com água.” E é nas casas que essa companhia centenária continuará a contar sua história.

Lorenzetti S.A. Indústrias Brasileiras Eletrometalúrgicas
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(11) 2065-7200
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