[AGÊNCIA DC NEWS]. Rodrigo Alves faz parte da quarta geração à frente do restaurante Ponto Chic. Nascido na Bela Vista, bairro localizado na região central de São Paulo, o empresário e advogado atua como proprietário do estabelecimento. O restaurante, um dos mais antigos da cidade, foi criado por Odílio Cecchini em 1922, no mesmo ano da Semana de Arte Moderna. Por isso, era comum, na época, ver o local cheio de intelectuais e artistas, como Mário de Andrade, Anita Malfatti e Monteiro Lobato.
Trabalhando como garçom do Ponto Chic, Antônio Alves de Souza, avó de Rodrigo, foi escolhido por Odílio para administrar o estabelecimento na década de 1970. No comando, Antônio ampliou o cardápio do estabelecimento, enquanto mantinha receitas tradicionais, como o lanche de bauru. Desde 2021, Rodrigo recebeu a mesma responsabilidade que o avô, de manter o restaurante de 102 anos relevante. O que faz até hoje, aos 46. Isso, ao mesmo tempo que o moderniza, mas sem esquecer das tradições. Nesta entrevista concedida à Agência DC NEWS, Rodrigo fala sobre a história do Ponto Chic, o Centro de São Paulo e sua visão de futuro.
AGÊNCIA DC NEWS – Quando começou a frequentar e trabalhar no Ponto Chic?
Rodrigo Alves – Quando eu era criança, era comum ir até o restaurante em confraternizações e eventos. Aos 14 anos, meu pai me presenteou com uma carteira de trabalho assinada no Ponto Chic. Com a minha irmã foi o mesmo. Trabalhei por quatro anos e decidi fazer direito aos 18. Apesar de ser um negócio da família, meu pai sempre nos deu a liberdade para escolher nossas profissões. Ele falava que a gente poderia estudar o que quisesse e poderíamos voltar se a gente desejasse. Em 2011, após trabalhar alguns anos como advogado, resolvi voltar a trabalhar com meu pai e avô.

AGÊNCIA DC NEWS – Quando você assumiu as funções de proprietário? Como foi essa transição?
Rodrigo Alves – A transição aconteceu naturalmente. Cheguei com a intenção de modernizar o restaurante em 2011. Dez anos depois, em um momento em que eu já tinha aprendido bastante das funções administrativas, meu pai faleceu e meu avô se aposentou. E eu assumi o negócio da família. Anos depois, a minha irmã, que se formou em nutrição, veio para dividir as funções administrativas do negócio que conta com três unidades. É muito trabalho.
AGÊNCIA DC NEWS – O que você sentiu ao se tornar proprietário?
Rodrigo Alves – Foi ótimo pegar empresa montada e consolidada, mas enfrentei muitos desafios. E o sentimento é o mesmo desde o começo. Até hoje sinto o peso da responsabilidade em tocar uma marca tão icônica. Os clientes conhecem os valores e o estilo da casa, por isso quando a gente muda algo, tem que ser com cuidado.
O restaurante acabou se tornando um lugar tradicional que é passado de pai para filho

AGÊNCIA DC NEWS – Quando o restaurante passou a ser comandado pela sua família?
Rodrigo Alves – Foi na década de 1970. Nessa época, o senhor Odílio Cecchini já era bem idoso, não tinha sucessores e queria se aposentar. Como ele conhecia meu avô há muitos anos, decidiu vender o negócio para ele. Junto ao meu pai (José Carlos), meu avô chegou cheio de vontade para tocar o negócio. Ele atualizou o cardápio, implementou as entregas de bicicleta e criou duas novas unidades.
AGÊNCIA DC NEWS – Quando as outras unidades foram criadas?
Rodrigo Alves – Quando meu pai e avô assumiram o negócio, eles quiseram expandir e criaram as unidades Paraíso, Mooca, Moema e Perdizes. A unidade da Mooca durou alguns anos, porém fechou e acabou virando a estação de metrô atual. As outras duas continuam até hoje. A unidade de Perdizes foi criada em 1987 e a do Paraíso no ano de 1985. Mantemos a mesma ordem em todos: atendimento com qualidade e tradição.

(Acervo/Ponto Chic)
AGÊNCIA DC NEWS – O que mudou no cardápio de 1922 para 2024?
Rodrigo Alves – No começo, o restaurante era focado em vender petiscos. Na década de 1960, meu avô, que ainda atuava como garçom, deu a sugestão de colocar arroz no cardápio. Essa adição abriu um leque muito grande de opções. O próprio lanche de Bauru foi criado a partir dos ingredientes que eram vendidos como petiscos. Atualmente o cardápio é muito diferente. Seguimos servindo os pratos feitos que são comuns aos dias da semana, como a feijoada às quartas, mas de restante tudo igual. Para fazer qualquer mudança, levamos a opinião dos consumidores sempre em consideração. Inclusive, recentemente incluímos a opção de hambúrguer vegetariano a pedido de alguns clientes.
AGÊNCIA DC NEWS – O que diferencia o restaurante em relação aos concorrentes?
Rodrigo Alves – Tradição e cuidado com atendimento do consumidor. Tradição é a nossa bússola e nossa chave de sucesso. Em todos esses anos, a gente se atualizou e mudou para atender as necessidades dos clientes, que mudaram com o tempo, porém nossa hospitalidade permanece a mesma há 102 anos. Até no nosso atendimento online o cuidado é o mesmo.
AGÊNCIA DC NEWS – Criado em 1937, o lanche de Bauru ainda mantém a mesma receita?
Rodrigo Alves – Esse lanche foi criado há quase 90 anos por Casimiro Pinto Neto, um dos alunos mais famosos da Faculdade de Direito do Largo São Francisco. E até hoje mantemos a mesma receita. Mesmo velho, esse patrimônio cultural imaterial do estado de São Paulo, continua se mantendo relevante e muito pedido, porque é uma delícia. Só no ano passado, vendemos 146 mil unidades do lanche.
AGÊNCIA DC NEWS – Qual era o perfil dos clientes no início? E o que mudou?
Rodrigo Alves – No começo eram muitas famílias, políticos e personalidades. Hoje é uma mistura de pessoas. Continuam vindo muitas famílias, principalmente aos sábados com os filhos. O restaurante acabou se tornando um lugar tradicional passado de pai para filho. E, durante a semana, é comum ter consumidores que trabalham na região. A noite os jovens vêm principalmente para comer o lanche de Bauru.
AGÊNCIA DC NEWS – Como foi a pandemia para vocês?
Rodrigo Alves – Foi muito difícil, assim como para muitos estabelecimentos comerciais. E, assim que a pandemia começou, fechamos as lojas, porém, decidimos não demitir ninguém. Com dois anos de fechamento, apenas funcionando no delivery, adquirimos uma dívida imensa. Quando reabrimos, economizamos muito porque não foi necessário gastar com o treinamento de novos profissionais.
AGÊNCIA DC NEWS – O que o futuro guarda para o Ponto Chic?
Rodrigo Alves – Existe um plano de expansão da rede, mas isso só será feito com muito cuidado e no momento em que for financeiramente viável e seguro.

O lanche de Bauru foi criado há quase 90 anos por Casimiro Pinto Neto, um dos alunos mais famosos da Faculdade de Direito do Largo São Francisco

Gravura de Cláudio Dias representa o Ponto Chic na década de 1980, o lugar era considerado de luxo e seus garçons estavam sempre de gravata

Fotografia mostra garçons no balcão da unidade do Paissandu do Ponto Chic – espaço era famoso por seus garçons jovens, simpáticos e bem arrumados

A unidade do Ponto Chic na Mooca, criada pelo avô de Rodrigo, durou alguns anos. O local hoje abriga o metrô Mooca

Dona Nina, avó de Rodrigo, no caixa do Ponto Chic na década de 1970 pouco tempo depois de assumir o comando do restaurante