Grupo Tristão pretende faturar R$ 3 bilhões este ano e fará investimento em logística para elevar exportações

Uma image de notas de 20 reais
Sérgio Tristão: "O custo do terreno é baixo perto do ganho que teremos com o espaço"
(Divulgação)
  • Empresa está investindo R$ 30 milhões em fábrica de cafés especiais e segue de olho nas negociações de tarifas entre Brasil e Estados Unidos
  • Plano é utilizar porto no Espírito Santo para acelerar a logística e reduzir em até dois dias o tempo de deslocamento do café exportado
Por Bruno Cirillo

[AGÊNCIA DC NEWS] Com um plano estruturado de investimentos e de olho no mercado externo, o Grupo Tristão mira um crescimento de 20% no faturamento em 2025, alcançando a marca de R$ 3 bilhões. A empresa capixaba, que completa nove décadas este ano, fechou 2024 faturando R$ 2,5 bilhões, e aposta na expansão logística para sustentar os planos de avanço. Para isso anunciou a construção de uma nova fábrica de cafés especiais, com aporte de R$ 30 milhões, e planeja um armazém em Aracruz (ES), próximo ao porto da Imetame, previsto para iniciar operação em 2026. “São investimentos estruturais para sustentar nosso crescimento. Não dá para pensar em aumento de receita sem preparar a casa”, disse o CFO do grupo, Wanderson Leal, à AGÊNCIA DC NEWS. A estratégia inclui maior foco no café do tipo conilon e um olhar atento ao tarifaço de Trump, que pode afetar as exportações para os Estados Unidos.

Ainda que o comportamento de Trump seja mapeado pelo mercado do café desde sua posse em  janeiro, a crescente escalada da tensão após o anúncio da tarifa de 50% para a entrada de todos os produtos brasileiros em solo norte-americano é vista com mais preocupação. Hoje, 20% das exportações da companhia são direcionadas aos Estados Unidos. “O mercado americano é historicamente importante para o segmento de café. Seguimos acompanhando o desfecho e as negociações em andamento”, disse Leal. As novas tarifas, prevista para começar no primeiro dia de agosto, podem atingir diretamente o volume exportado da commodity. Entre janeiro e junho deste ano, segundo o ComexStat, plataforma do governo federal, foi exportado US$ 1,3 bilhão nas variadas formas de café aos Estados Unidos. O resultado é 45% superior ao verificado um ano antes, no primeiro semestre, quando as exportações totalizaram US$ 915,7 milhões. 

Enquanto o jogo de xadrez global continua, Sérgio Tristão, presidente do grupo, se diz focado em diversificar a logística e o portfólio da empresa. A aposta é que o novo terminal portuário capixaba amplie as possibilidades de acesso a mercados na Ásia e Europa, diminuindo a dependência dos EUA. Além do armazém em Aracruz, a companhia anunciou a construção de uma fábrica de cafés especiais com capacidade para cinco mil sacas por ano, em Viana (ES). A operação será integrada à estrutura já existente, voltada ao beneficiamento e torrefação de cafés. O grupo também tem uma unidade em Varginha (MG). A produção anual da Tristão gira entre 1,5 milhão e 2 milhões de toneladas, das quais cerca de 1,2 milhão são exportadas. Além das exportações de café cru e solúvel, a companhia atua no varejo com as marcas Realcafé e Cafuso, que também devem absorver parte do café especial a ser produzido a partir de 2025.

Escolhas do Editor

Localizado a apenas 70 quilômetros da obra portuária, o novo armazém da Tristão será erguido num módulo de 50 mil metros quadrados. Por enquanto, não há outros projetos previstos para o restante da área adquirida, que tem 400 mil metros quadrados. “Compramos um diamante”, disse Sérgio. “O custo do terreno [R$ 16 milhões] é baixo perto do ganho de qualquer coisa que seja colocada lá.” Uma vez que grande parte das lavouras está localizada no norte do estado ou na região que compreende Aracruz, conhecida como Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), outras exportadoras de café seguirão o mesmo caminho e passarão a utilizar o Imetame em vez dos portos ao sul do estado ou em outras localidades. O porto, inclusive, fica mais perto da Ásia do que Santos, poupando um dia e meio de viagem, segundo a concessionária Imetame, e a China é um dos mercados de consumo mais promissores para o café.     

As duas unidades processadoras da Tristão, em Viana e Varginha, têm cada uma capacidade para beneficiar (solúvel, torrado e moído) até 300 mil sacas de café (60 Kg) por ano e 12 mil metros quadrados de espaço para armazenagem. A fábrica de cafés especiais que será lançada na unidade capixaba ainda em 2025 terá capacidade para a produção de 5 mil sacas por ano. O investimento também inclui a criação de um estoque para cafés já embalados e melhorias nos processos internos. Além de exportar o café em grãos crus ou solúveis (segmento para o qual o conilon é mais apropriado), a Tristão possui duas linhas no varejo: a Realcafé e o Cafuso – o café especial será vendido por meio destas marcas ou exportado via outsourcing, segundo o executivo. 

SUPERAÇÃO DO ARÁBICA – Sérgio aposta na superação do café arábica pelo canéfora globalmente por uma questão de adaptação do paladar. Segundo ele, a percepção de que o robusta é de pior qualidade está mudando e, além disso, as cafeterias e consumidores ao redor do mundo começam a perceber que, se for para misturar o café ao leite ou adicionar açúcar, o robusta é muito mais apropriado porque tem o sabor mais forte – o arábica deveria se restringir ao consumo sem nenhuma mistura, segundo ele. “Não adianta comprar um café especial de R$ 50, R$ 60 o quilo e depois encher de leite, açúcar”, disse ele, durante o 10º Coffee Dinner & Summit, realizado pelo Conselho dos Exportadores de Café (Cecafé) em Campinas (SP). “O conilon é totalmente factível para esse consumidor.” Segundo Tristão, antigamente as torrefações tinham “vergonha de dizer que usavam robusta. Hoje, perderam a vergonha”. Nos hotéis, diz ele, o café que está lá na garrafa térmica “com certeza é 60%, 70% robusta”. Em compensação, completa, a maior parte das pessoas tomando café da manhã nesses hotéis mistura com leite e açúcar.

A história da Tristão é também a história do conilon no Espírito Santo. Fundada em 1935 em Afonso Cláudio, a empresa cresceu apoiando produtores locais durante a erradicação dos cafezais de arábica nos anos 1960, quando o governo incentivou o corte de 1,3 bilhão de cafeeiros. Foi a Tristão quem apostou no robusta (espécie até então pouco utilizada) e garantiu a compra do produto em troca do plantio. “Plante que a Tristão garante”, dizia o lema da companhia. Hoje, o Espírito Santo é o segundo maior produtor nacional e disputa com o Vietnã o topo do ranking global da variedade. A empresa, que lançou a marca Cafuso em 1971 e chegou a Minas Gerais com nova planta em 2016, disputa espaço com grandes players como Louis Dreyfus e Niccafé. Com o investimento em logística e café especial, mira agora o futuro da cadeia global do grão.

Os capixabas, de modo geral, colheram 16,3 milhões de sacas de café (60 kg) no ano passado, sendo 80,4% do tipo conilon, segundo a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab). No Brasil, o Espírito Santo concorre com Minas Gerais em volumes totais; no mundo, está atrás apenas do Vietnã na produção de robusta (Embrapa). Pouco mais da metade da oferta local (8,3 milhões de sacas) se exporta via portos do Complexo de Vitória, enquanto a outra parte é absorvida pela demanda interna ou escoada pelos terminais portuários de Santos (SP) e Rio de Janeiro (RJ). Com a entrega do porto Imetame em Aracruz no segundo semestre de 2026, a logística da exportação de café deve ser facilitada e o nível de embarques, aumentar – o terminal terá capacidade para movimentar 1,6 milhão de contêineres por ano, e o café entrará na pauta de exportações como um dos principais produtos.

O desenvolvimento do conilon no Espírito Santo, que consolidou o estado como segundo polo produtor dessas variedades no mundo, está ligado à origem e crescimento do próprio Grupo Tristão, que hoje disputa mercado com a Niccafé e Louis Dreyfus, entre outras empresas de grande porte. Completando 90 anos em 2025, a companhia foi fundada em 1935 em Afonso Cláudio (ES), num armazém de secos e molhados que, nos anos seguintes, passou a negociar mercadorias com os produtores da região em troca de sacas de café. Em 1950, o grão era o principal produto do armazém e, em 1960, já na segunda geração da família, a empresa fez seu primeiro embarque, com 250 sacas, para o Porto de Havre, na França. 

Entre os anos de 1962 e 1967, os preços do café estavam muito baixos no mercado internacional e o governo brasileiro promoveu uma política de erradicação dos cafezais, pagando pela derrubada dos pés de arábica – 1,3 bilhão de cafeeiros foram desmatados no período. O Grupo Tristão enxergou nisso uma janela de oportunidade e disse aos produtores capixabas que plantassem robusta – uma espécie descoberta no início do século, mas até então não utilizada –, pois garantiriam a compra do produto. À AGÊNCIA DC NEWS o subsecretário de Desenvolvimento Rural do estado, Michel Simon afirmou que o evento foi um divisor de águas. “Tivemos que criar uma nova atividade econômica e a Tristão garantiu a tecnologia e os recursos necessários”, disse. O lema utilizado foi “Plante que a Tristão garante” – Sérgio nega que isso tenha inspirado a política agrícola implementada no governo militar de João Figueiredo, por iniciativa do então ministro Delfim Neto, quase vinte anos depois usou a expressão “Plante que o João garante”. 

Em 1971, foi criada a unidade de beneficiamento Realcafé e lançada a marca Cafuso, consolidando a Tristão como uma referência local na comercialização e exportação do grão – Sérgio assumiu como sócio-proprietário em 1988. A segunda unidade seria instalada no município mineiro de Varginha apenas em 2016, quando a agroindústria já estava há muito tempo entre os líderes da produção de canéfora no Brasil. A principal diferença em relação ao arábica, na produção agrícola, é que o conilon se reproduz por meio da polinização cruzada, mesclando características das plantas que dão sua origem, enquanto o conilon é reproduzido por autofecundação, repetindo as características da planta-mãe. “É uma espécie adaptada a relevos de menor altitude e temperatura mais quente”, disse Simon, destacando as condições climáticas do próprio estado. Nos anos 1980, investimentos público-privados em ciência e tecnologia impulsionam o crescimento do robusta e, em 1993, foi criada a primeira variedade clonal, com produtividade de nove sacas por hectare. “Hoje, mesmo que você empregue um mínimo de tecnologia, não há conilon que produza menos de cem sacas por hectare”, afirmou representante.

A produção mundial de Coffea canephora totalizou 74,1 milhões de sacas na safra de 2023/2024, correspondendo a 43,3% do total, de acordo com estimativas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O Vietnã, tendo quase toda a produção voltada para o canéfora, produziu 27,5 milhões de toneladas do grão no ano passado, na estimativa do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Tristão diz que, considerando a produção do Espírito Santo, Bahia e Rondônia, “a aposta do mercado é que o Brasil passe o Vietnã na produção de conilon em dois ou três anos.” A última safra de robusta no país foi de 14,6 milhões de sacas.

Cinco perguntas para Wanderson Leal, CFO do Grupo Tristão

Leal: “Nos últimos anos, o arábica tem representado aproximadamente 60% das nossas vendas”
(Divulgação)

AGÊNCIA DC NEWS – Qual é a proporção de café arábica e conilon produzido pelo grupo, em volume e percentual em relação ao total?
WANDERSON LEAL Nos últimos anos, o arábica tem representado aproximadamente 60% das nossas vendas, enquanto o conilon, 40% do volume originado do grupo, sendo que o conilon é predominante na nossa unidade de Café Solúvel.

AGÊNCIA DC NEWS – Quanto a empresa faz de torrefação hoje em dia, nas unidades de beneficiamento? 
WANDERSON LEAL Nossa fábrica tem capacidade de 12 mil toneladas de solúvel por ano, e 6 mil toneladas de torrado e moído. Nossos investimentos têm sido feitos especialmente na melhoria de processos, com renovação de equipamentos e armazenagem.

AGÊNCIA DC NEWS – Em que pé está o projeto da Sudene?
WANDERSON LEAL Estamos elaborando os projetos. O crescimento do grupo deve ser direcionado para essa unidade.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual é a previsão para a inauguração do novo silo de armazenagem?
WANDERSON LEAL Não temos ainda uma data definida para inauguração, mas em 2026 devemos avançar em obras na unidade Aracruz.

AGÊNCIA DC NEWS – Como vocês receberam a notícia do tarifaço – deve prejudicar as vendas para os EUA?
WANDERSON LEAL O mercado americano é historicamente importante para o segmento de café. Seguimos acompanhando o desfecho e as negociações em andamento.

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