Selic alta reflete no bolso do varejista e do consumidor; avanço do comércio fica em 0,9% no segundo trimestre

Uma image de notas de 20 reais
Comércio desacelera com menos apetite do consumidor por compras de longo prazo
(Danilo Verpa/Folhapress)
  • Apesar do impacto dos juros, houve aumento na formação de capital das empresas e obtenção do crédito pelos consumidores no segundo trimestre
  • Para os próximos trimestres, expectativa é que a desaceleração aumente, com crescimento podendo ficar próximo de zero
Por Victor Marques Compartilhe: Ícone Facebook Ícone X Ícone Linkedin Ícone Whatsapp Ícone Telegram

[AGÊNCIA DC NEWS]. Divulgado nesta terça-feira (2) pelo IBGE, o PIB do segundo trimestre registrou alta de 2,2% anual, frente a igual período do ano anterior, totalizando R$ 3,2 trilhões. A agropecuária registrou a maior alta anual (10,1%), impulsionada por ganhos de produtividade e em linha com o crescimento do primeiro trimestre (10,1%). Os serviços ficaram estagnados (alta de 2%), levemente abaixo do resultado do primeiro trimestre (2,1%). Já o comércio sentiu mais o impacto, resultado, segundo economistas, dos reflexos diretos da política monetária e pressão na renda do consumidor. No segundo trimestre de 2024, ante ao mesmo período de 2023, o setor havia registrado alta de 4%. Este ano, na comparação com o ano passado, o incremento foi de 0,9%. “É uma preocupação para o varejo”, afirmou Claudio Felisoni, presidente do Ibevar e professor da FIA Business School. “As razões disso são o endividamento das famílias, compressão do consumo e a taxa de juros.”

Para ele, a assimetria nos resultados do comércio significa uma contração real do setor, impulsionado pelo endividamento acumulado das famílias e a compressão do consumo, em um cenário que deve piorar nos próximos meses. A proporção de famílias com contas a vencer cresceu de 78,2% em maio para 78,4% em junho, segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC). O que, segundo Felisoni, indica um estrangulamento do poder de compra. Na mesma linha vão os analistas Fabio Ramos, Alexandre de Azara e Rodrigo Martins, que assinaram o relatório da UBS BB, banco de investimentos resultante de parceria do banco global USB e o Banco do Brasil. Segundo eles, o resultado apresentado do PIB indica uma provável desaceleração nos próximos trimestres. “Esperamos um terceiro e quarto trimestres com crescimento próximo de zero.”

Ainda que a perspectiva não se mostre tão otimista, os dados passados podem contar uma história diferente. O Banco Central, por exemplo, lançou um mapa sobre a situação do crédito destinado às empresas e aos consumidores no mês de julho, que revela que o saldo do crédito ampliado ao setor não financeiro atingiu R$19,5 trilhões (158,5% do PIB), com alta de 0,9% no mês. Em doze meses, o crédito ampliado cresceu 10,5%. O crédito ampliado às empresas somou R$ 6,7 trilhões em julho (54,6% do PIB), avanço de 1,2% no mês. Em doze meses, crescimento de 9,1%. O crédito ampliado às famílias ficou em R$4,5 trilhões (36,4% do PIB), com expansões de 0,7% no mês e de 11,4% em doze meses, refletindo o desempenho dos empréstimos do Sistema Financeiro Nacional (SFN). No caso do IBGE, o recorte sobre a situação de consumo das famílias também merece destaque, com alta de 1,8% na comparação entre o segundo trimestre deste ano e do ano passado, influenciado, segundo o instituto, “pelos aumentos na massa salarial real, pelo crédito disponível das famílias e pelas transferências de renda às famílias”.

Escolhas do Editor

Ainda que tenha havido aumento na oferta de crédito aos empresários, mesmo diante da Selic em dois dígitos, Felisoni afirma que o maior vilão para o desempenho atual do comércio é a política monetária. “O capital de giro está comprometido devido ao aumento e manutenção da taxa de juros”, afirmou. O indicador de Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), métrica do IBGE para medir  os investimentos em ativos fixos que aumentam a capacidade produtiva de uma economia, como máquinas, equipamentos e construções reporta queda de 2,1% nos investimentos das empresas quando comparado o primeiro e o segundo trimestre do ano. Na análise internual, no entanto, houve avanço de 4,1%. Com o resultado, os investimentos feitos pelos empresários de todos os setores em ampliação de seus negócios ficou em R$ 532,9 bilhões.

(Fonte: IBGE)

REFLEXO TARDIO – Segundo Ulisses Gamboa, economista-sênior do Instituto de Economia Gastão Vidigal, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), pelo lado da produção, os serviços foram o destaque positivo, impulsionados por renda e emprego, enquanto a indústria extrativa avançou e a de transformação ficou parada. Pelo lado da demanda, o consumo das famílias sustentou o crescimento, ainda sem refletir totalmente os impactos tarifários dos EUA. O consumo do governo e os investimentos caíram, pressionados pelos juros elevados. “Veio dentro do que se esperava de uma desaceleração”, afirmou. “A tendência é que continue desacelerando até o fim do ano e feche o período com crescimento em torno de 2%.” A expectativa é que o setor de serviços sinta o peso dos juros e da desaceração da economia nos próximos balanços.

Segundo o IBGE, o valor adicionado dos Serviços avançou 2,0%, ante o mesmo período do ano anterior, com resultado positivo em todos os setores: Informação e comunicação (6,4%), Atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (3,8%), Outras atividades de serviços (2,7%), Atividades imobiliárias (2,2%), e Transporte, armazenagem e correio (1,3%) e Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social (0,2%). Comércio, que pela leitura do IBGE figura dentro do guarda-chuva de Serviços, também entrou na contagem.

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O resultado do PIB é uma preocupação para o varejo

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Cláudio Felisoni, FIA

Para a Associação Paulista de Supermercados (Apas), devido ao ciclo de política monetária restritiva, esse resultado já era esperado. Em comunicado para a imprensa, Felipe Queiroz, economista-chefe da Apas, afirmou que o resultado do PIB reflete também a conjuntura internacional. “A demanda agregada e a taxa de juros nesse patamar, consequentemente, é um freio de mão da economia”, afirmou. Segundo ele, havia potencial para o Brasil apresentar taxa de cresciemnto acima 2,2% no anualizado, mas com a manutenção da taxa de juros a 15% ao ano, “é inviável manter um crescimento robusto do PIB”. A Apas tem a expectativa de maior desaceleração, caso não haja alteração na curva de juros para os próximos trimestres. “Se esse for o caso, o PIB deve ficar entre 2,2% e 2,4%, no máximo.”

A agropecuária registrou a maior alta anual do período, resultante de crescimentos na estimativa na produção anual e produtividade em itens como milho (19,9%), soja (14,2%), arroz (17,7%), algodão (7,1%) e café (0,8%). A Indústria cresceu 1,1%, também na base internaual, tendo destaque as Indústrias Extrativas que avançaram 8,7%, devido ao aumento na extração de petróleo e gás, além da extração de minério de ferro. A Construção registrou variação positiva de 0,2%, corroborada pela variação negativa na produção e comercialização dos insumos típicos.

As Indústrias de Transformação mostraram estabilidade (0,0%) no período, quando as altas em alguns setores (metalurgia, máquinas e equipamentos, química e têxtil) foram compensadas por quedas na fabricação de caminhões e ônibus, fabricação de coque e derivados de petróleo, na fabricação de alimentos e na indústria farmacêutica. Já Eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos, por sua vez, caiu 4,0%, influenciada pela piora nas bandeiras tarifárias e pela queda no consumo total de energia.

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