Pousada em Fernando de Noronha aposta em soluções sustentáveis

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FERNANDO DE NORONHA, PE (FOLHAPRESS) – Fernando de Noronha tem o poder de fazer o visitante desacelerar. Em vez de ser um incômodo, a pequena fila para comprovar o pagamento da taxa ambiental, ainda no aeroporto, é um convite a levar a vida com menos pressa nos dias que estiver por ali.

Essa impressão se confirma ao chegar à pousada Mar Aberto.

Iluminação baixa, toalhas dobradas com capricho, uma bandeja com bolo e delicadas pétalas de flores artificiais espalhadas pela cama. Ao lado delas, uma caixinha branca com um recado: “Guarde aqui as nossas pétalas para que continuem sendo usadas”.

A atmosfera aconchegante e de prevenção ao desperdício mostra o que esperar da estadia. Situada no coração do arquipélago, a poucos minutos de caminhada da Vila dos Remédios, a pousada prioriza práticas sustentáveis.

Enquanto o município usa uma termelétrica a diesel, um combustível fóssil, para prover a maior parte da energia usada pelos moradores e visitantes, o estabelecimento aproveita o sol que brilha o ano todo para alimentar sua pequena central fotovoltaica. Assim, aquece a água dos chuveiros e gera energia elétrica para seus nove quartos sem emitir gases de efeito estufa, causadores da mudança climática.

Também são adotadas soluções mais simples, mas nem por isso menos eficientes: são utilizados produtos de limpeza biodegradáveis, os itens de higiene pessoal disponibilizados não vêm em embalagens descartáveis e a troca de roupas de cama é reduzida, para economizar água e sabão.

É feita a separação do lixo e, além de reciclar o óleo de cozinha produzido ali, a pousada é um ponto de coleta do óleo descartado por outros moradores. Após a reciclagem, esse resíduo é transformado em sabão, que é vendido e o lucro é revertido para um hospital em Recife.

O modelo de ar condicionado dos quartos é econômico e não agride a camada de ozônio —a proprietária, Adriana Flor, pede, já no check-in, que os hóspedes não deixem o aparelho ligado quando não estiverem presentes.

“Antes [da adoção das práticas sustentáveis], a Mar Aberto produzia dez quilos por dia de resíduos sólidos. Isso já caiu para algo entre cinco e seis quilos diários. E o nosso maior resíduo hoje é o orgânico”, conta ela. Todo o lixo de Noronha precisa ser levado para Recife.

“A gente também tem um lava-pés, feito com duas jarras de barro e uma concha, que incentivamos os clientes a usarem ao voltar da praia. Isso ajuda a não prejudicar a tubulação com a areia e economiza água”.

Cada vez mais turistas procuram esse destino —o número de visitantes saltou de pouco mais de 85 mil, em 2015, para o recorde de 131 mil em 2024— e, com isso, os impactos também se multiplicam.

A água que sai da torneira é especialmente valiosa em Noronha: é a água do mar dessalinizada. Outra característica é a pegada de carbono desse bem essencial, já que, como toda a estrutura da ilha, o sistema de dessalinização é alimentado pela energia da termelétrica.

CUIDADO COM O PLANETA E A TERRA NATAL

Diferentemente de tantos que vêm de fora para abrir empreendimentos de luxo no arquipélago, Flor é noronhense e fundou a pousada no início dos anos 1990, inicialmente com apenas um quarto, dentro da sua própria casa. O plano era complementar a renda para poder garantir a educação das duas filhas.

No início, o negócio foi crescendo aos poucos, um quarto por vez. O ano da virada foi 2005, quando houve uma ampliação de três para nove apartamentos.

“Com isso, comecei a desenvolver a parte da sustentabilidade, buscando ter uma estrutura diferenciada com a qual eu não machucasse tanto o meu lugar”, conta a dona. “Por exemplo, os forros do teto são de chita, um tecido muito comum no nordeste. É um tecido colorido, que traz alegria, e eu não precisei introduzir madeira ou plástico”.

O espaço é cercado por um jardim e uma grande varanda, que proporcionam sombra e brisa para ajudar a aplacar o calor da maior parte do ano. Em um convite para aproveitar o espaço externo (e poupar o ar condicionado), há uma piscina e os quartos dispõem de rede de balanço —cada uma com um trançado diferente, da confecção potiguar Santa Luzia.

A decoração conta, ainda, com obras da artesã mineira Regina de Paula, que reutiliza materiais que seriam descartados para criar peças únicas.

“As nossas mesas do café da manhã têm em formato de tartaruga, de peixe. Os pés delas são forquilhas das árvores que já estavam descartadas na própria natureza”, explica Flor, acrescentando que até mesmo a placa com o nome da pousada, de mosaico, foi feita com azulejos reciclados.

Esses elementos, somados à integração com a natureza e ao capricho da proprietária, formam o ambiente acolhedor da pousada.

“É muito fácil a gente colocar um concreto, uma mesa de mármore, de vidro. E é difícil ter ideias [de opções mais sustentáveis]”, diz Adriana Flor. “Mas tudo que eu faço aqui é tentando fazer o meu melhor, tendo como base o respeito pelo meio ambiente, pelo meu espaço, pela minha terra, pelo meu lugar. Eu tento gerar o menor impacto possível para esse local”.

As diárias custam em torno de R$ 835 (exceto em feriados e nas festas de final de ano) para um quarto duplo, incluindo café da manhã.

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A repórter viajou a convite do Projeto Golfinho Rotador.

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