José Tadeu da Silva, presidente da Acrefi: “Há crédito para o varejo, mas ele está mais restrito e mais caro”

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José Tadeu da Silva, da Acrefi, indica redução de estoques e gestão apurada para obtenção de crédito
(Divulgação)
  • "Operações bem estruturadas e que tenham algum lastro vão conseguir crédito. E isso vale para todos os portes de empresa"
  • "Nas pequenas empresas, aquelas que tem um bom histórico e se oferecem alguma garantia, também terão acesso a crédito"
Por Victor Marques Compartilhe: Ícone Facebook Ícone X Ícone Linkedin Ícone Whatsapp Ícone Telegram

[AGÊNCIA DC NEWS].Em outubro do ano passado a Selic, taxa básica de juros, entrou em trajetória de alta. Subiu de 10,75% naquele mês, até 15% em julho deste ano – e deve continuar no mesmo patamar, com previsão para queda somente no segundo semestre de 2026, conforme o último Boletim Focus do dia 15 de agosto. Segundo José Tadeu da Silva, presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), ainda que o custo do crédito esteja alto, ainda há oferta de capital disponível no sistema financeiro. “Só que ele está mais seletivo, mais caro e com foco em garantias.”

Para os varejistas que estão pensando em obter crédito, o executivo, que representa as instituições de crédito brasileiras, afirma que é o momento de fazer a lição de casa internamente. “As operações bem estruturadas, que tenham algum lastro, vão conseguir crédito”, disse. E isso vale para todos os portes de empresa, inclusive para as pequenas. “Se ele tem um bom histórico e se ele oferece alguma garantia, ele terá acesso a crédito também.” E olhando para o cenário atual do setor financeiro do país, Silva prevê a continuidade da seletividade do crédito pelo menos até o fim do ano.

Olhando para o futuro do país, ele também está preocupado com o endividamento das famílias, que reduz o espaço para vender a prazo e eleva o risco de inadimplência das empresas que contratam crédito. Para tentar mitigar essa questão, a solução, segundo o executivo, é tratar o tema como um problema de todos. E não apenas dos bancos ou do poder público. “É importante que a educação financeira seja incentivada e seja colocada cada vez mais no currículo do brasileiro”, afirmou à AGÊNCIA DC NEWS. Confira a entrevista completa.

Escolhas do Editor

AGÊNCIA DC NEWS – A Selic está em trajetória de alta desde outubro do ano passado, com previsão para queda do patamar atual, em 15%, somente no segundo semestre do próximo ano. Como fica o crédito para o varejo atualmente, considerando esse cenário?
JOSÉ TADEU DA SILVA – Há crédito. Porém, mais seletivo, mais caro e também com foco em garantias. Isso devido a toda essa questão desse cenário econômico de incertezas. O que posso garantir é: há liquidez onde há lastro.

AGÊNCIA DC NEWS – Como isso funciona na prática para o varejista?
JOSÉ TADEU DA SILVA
O mercado está trabalhando bastante com o colateral, com a garantia. Porque ninguém quer ter grandes problemas na carteira, em termos de turbulência. As instituições estão solicitando entradas maiores para poder ter maior garantia e ajustar prazo. Na prática, o crédito existe, especialmente quando há recebíveis, ou garantia real, um histórico sólido.

AGÊNCIA DC NEWS – E onde o risco é mais alto?
JOSÉ TADEU DA SILVA Onde o risco é alto e sem lastro, o acesso diminui e o custo aumenta.

Aspas

O arrefecimento da economia no segundo semestre vai exigir gestão mais conservadora do varejista

Aspas
José Tadeu da Silva

AGÊNCIA DC NEWS – Visto isso, me parece que o crédito fica mais disponível para as grandes empresas, que geralmente têm algum tipo de lastro disponível. E fica menos acessível para a pequena empresa. Isso é verdade?
JOSÉ TADEU DA SILVA É, mas o pequeno continua a ter acesso. A gente tem muitas operações com os pequenos. Porque o ponto não é ele ser pequeno. Se ele tem um bom histórico e se ele oferece alguma garantia, ele terá acesso a crédito também. Agora é lógico que o aquele que está mais endividado, que tem menor garantia ou que está sofrendo muito operacionalmente, vai ter dificuldade com isso. Independentemente de ser grande ou pequeno. Empresas bem estruturadas conseguem crédito.

AGÊNCIA DC NEWS – Você acredita que o varejo está com um índice de alavancagem alto? Isso gera um estresse no setor?
JOSÉ TADEU DA SILVAAfeta o setor, sim, mas, na verdade, não há um estresse extremo. O que existe hoje, são alguns bolsões de fragilidade. O sistema financeiro está bem capitalizado, líquido e com ampla diversificação de fatura. Tivemos mudanças na resolução CMN nº 4.966/21 do Banco Central, que trouxe novidades nos cálculos das previsões e incentivou a postura mais conservadora na classificação da cobertura de risco. Isso reforça a resiliência das instituições financeiras e ajuda a manter essa qualidade da carteira. 

AGÊNCIA DC NEWS – Além do lastro, o que afeta a seletividade do crédito? A ACSP está projetando uma intensificação da desaceleração no varejo para o segundo semestre. Isso pode indicar também uma queda demanda de crédito pelo varejo?
JOSÉ TADEU DA SILVA –
Pelo contrário. Com a expectativa de diminuição dos volumes, o mercado vai precisar de mais crédito para suprir a falta de vendas. E o aumento na seletividade da concessão também se manterá. Esse período vai exigir uma gestão mais conservadora, de preservação de caixa, trabalhar com um estoque mais enxuto, com foco em margens e renegociação de prazos.

AGÊNCIA DC NEWS – Com a possibilidade de manutenção da Selic em patamares altos, como a Acrefi enxerga os próximos meses do setor de crédito?
JOSÉ TADEU DA SILVA –
As linhas de crédito se manterão, só que seguirão mais caras. Os comerciantes que atravessarem esse período, mantendo a sua saúde financeira, vão estar bem melhor posicionados para capturar o crescimento quando houver essa redução consistente na Selic que a gente imagina que haverá a partir de 2026. É hora de fazer a lição de casa.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual outro indicador econômico preocupa a Acrefi atualmente?
JOSÉ TADEU DA SILVAO comprometimento da renda das famílias continua muito elevado. Isso reduz o espaço para vender a prazo e eleva o risco. Por mais que o governo dê incentivo, a renda não subiu e as famílias estão muito endividadas. Esse endividamento pode comprometer as concessões de crédito.

AGÊNCIA DC NEWS – Na sua visão, como deve ser abordado esse problema no longo prazo?
JOSÉ TADEU DA SILVA – Com educação financeira. A gente sabe que o povo brasileiro tem um déficit educacional. O brasileiro não consegue ter uma boa performance em português e em matemática. Imagine colocar a educação financeira junto.

AGÊNCIA DC NEWS – E isso deve ser responsabilidade de quem?
JOSÉ TADEU DA SILVA
De toda a sociedade. As políticas públicas, as instituições, e até o comércio. É importante que a educação financeira seja incentivada e seja colocada cada vez mais no currículo do brasileiro.

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