SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente do Fed (Federal Reserve, o BC dos EUA), Jerome Powell, admitiu nesta sexta-feira (22) a possibilidade de reduzir os juros do pais na próxima reunião da autarquia, que será entre 16 e 17 de setembro.
Em discurso no simpósio em Jackson Hole, ele apontou que o risco de a inflação acelerar e o mercado de trabalho enfrentar queda persistem, o que pode levar a uma mudança na política monetária dos EUA. Porém, o presidente do Fed evitou se comprometer com a redução dos juros.
“Com a política em território restritivo, o cenário básico e o equilíbrio mutável de riscos podem justificar o ajuste de nossa postura política”, afirmou Powell.
O Fed vem mantendo a taxa de juros entre 4,25% e 4,5% desde dezembro do ano passado, antes de Donald Trump ser empossado. Foram cinco reuniões neste ano em que os diretores optaram pela manutenção da taxa, apesar da pressão de Trump que defende uma redução de três pontos percentuais.
Os dados mais recentes da economia norte-americana apontaram que o desemprego aumentou e a inflação continua acima da meta de 2% do Fed, com a expectativa de que cresça na medida em que o custo das tarifas de importação de Trump se incorpore aos preços de varejo.
Diante disso, Powell reiterou o que vem falando desde o início do ano sobre a necessidade de ter cautela ao avaliar o cenário atual. “Embora o mercado de trabalho pareça estar em equilíbrio, trata-se de um equilíbrio curioso, resultante de uma desaceleração acentuada tanto na oferta quanto na demanda por trabalhadores. Essa situação incomum sugere que os riscos de queda no emprego estão aumentando. E, se esses riscos se materializarem, poderão fazê-lo rapidamente”, destacou.
“Também é possível, no entanto, que a pressão de alta sobre os preços, devido às tarifas, possa estimular uma dinâmica inflacionária mais duradoura, e esse é um risco a ser avaliado e administrado. A estabilidade da taxa de desemprego e outras medidas do mercado de trabalho nos permitem prosseguir com cautela ao considerarmos mudanças em nossa política monetária”, indicou Powell.
Com isso, aumenta a importância dos próximos relatórios de emprego e inflação que serão divulgados da reunião de setembro do Fed.
O discurso ofereceu pouca orientação sobre quando ou com que velocidade os juros podem cair, provavelmente fomentando ainda mais a pressão do presidente Donald Trump, que afirma não haver risco de inflação e que o Fed deveria cortar os juros imediatamente.
Nas últimas semanas, Trump aumentou a pressão ao dizer que avalia entrar com processo contra Powell pelos gastos previstos na reforma do prédio do Fed e pedir que a diretora da autarquia Lisa Cook renuncie ao posto após denúncia de uma suposta fraude hipotecária.
O discurso desta sexta é o último de Powell como presidente, com seu mandato terminando em 15 de maio de 2026. Trump está buscando um substituto e pressionando Powell e outros membros da diretoria a renunciarem na expectativa de nomear a maioria dos sete membros do órgão.
Junto com sua perspectiva sobre a economia, Powell anunciou uma nova estrutura estratégica do Fed que enfatizou que seu mandato de emprego máximo depende da estabilidade de preços.
Em seu primeiro mandato, Trump promoveu Powell de um cargo na diretoria para presidente, mas logo começou a criticá-lo. Powell foi reconduzido para um segundo mandato de quatro anos pelo presidente Joe Biden.
Powell não pode ser retirado do cargo por disputas sobre decisões de juros ou motivações políticas, conforme decisão da Suprema Corte em maio, e o mandatário do Fed disse que pretende cumprir seu segundo mandato integralmente.
A taxa de juros foi alterada pela última vez em 18 de dezembro de 2024, quando Biden era presidente. Na ocasião, o Fed aprovou um corte de 0,25 ponto percentual. A taxa foi mantida nas reuniões do Fomc (equivalente ao Copom dos EUA) ocorridas de janeiro a julho, apesar da pressão de Trump e da contínua incerteza sobre o impacto de sua política comercial na economia americana.
A última reunião, porém, foi a primeira em que a decisão não foi unânime. Dois diretores, Christopher Waller e Michelle Bowman, defenderem um corte de 0,25 ponto. Ambos foram indicados por Trump. A ata mostrou que os dois estavam isolados ao defenderem a medida.
Desde a última reunião, uma diretora já renunciou ao posto e Trump nomeou um aliado seu para ocupar o cargo interinamente.
MUDANÇAS NO ARCABOUÇO
Em discurso, Powell também anunciou um arcabouço operacional atualizado para o banco central dos Estados Unidos que reflete o retorno de pressões inflacionárias mais altas e a perspectiva reduzida de taxas de juros de curto prazo próximas a zero.
O novo decreto se afasta do desafio onipresente de a política monetária ter de operar com juros muito baixos devido a um período de inflação muito baixa em relação à meta de 2% do Fed, o cenário que informou sua revisão de 2020.
Powell afirmou que na nova estrutura “removemos a linguagem” sobre o ambiente de juros baixos e “retornamos a um arcabouço de metas de inflação flexíveis e eliminamos a estratégia de ‘maquiagem'” apresentada em 2020, a última vez que o Fed atualizou seus princípios operacionais gerais.
“Continuamos a acreditar que a política monetária deve ser voltada para o futuro e considerar as defasagens em seus efeitos sobre a economia” e que o Fed deve equilibrar os riscos para seus mandatos de emprego e inflação ao definir a política monetária, disse Powell.
“Nossa declaração revisada enfatiza nosso compromisso de agir com firmeza para garantir que as expectativas de inflação de longo prazo permaneçam bem ancoradas, para o benefício de ambos os lados de nosso mandato duplo”, complementou o presidente do Fed.
A revisão dos princípios operacionais do banco central era amplamente esperada. A ata da reunião de 29 e 30 de julho, divulgada na quarta-feira, observou que a revisão “seria projetada para ser robusta em uma ampla gama de condições econômicas”.
O último arcabouço foi adotado no contexto de um Fed que estava enfrentando um período prolongado de pressões inflacionárias muito fracas, o que, por sua vez, levou a um longo período de juros de curto prazo muito baixos. As taxas baixas complicaram a capacidade do BC dos EUA de reagir a choques econômicos.
A pandemia, que se instalou em 2020, levando a uma imensa rodada de estímulos do Fed e do governo dos EUA, logo provocou algumas das maiores pressões inflacionárias em décadas. Isso rapidamente colocou o Fed em um caminho que tinha pouco a ver com os objetivos do arcabouço de 2020.
A inflação que começou a subir em 2021, levando a aumentos agressivos de juros pelo Fed, diminuiu em grande parte e o banco central conseguiu reduzir sua taxa de juros.