Sandra Nalli, Escola do Mecânico: alta de 32% mostra como mixar negócio e propósito

Uma image de notas de 20 reais
Sandra Nalli: “Sempre digo que meu negócio nasceu de uma necessidade e virou um propósito”
(Divulgação)
  • Escola tem 50 unidades, entre rede própria e franquia. A instituição já formou mais de 125 mil alunos
  • Em 2024, faturamento de R$ 62 milhões e previsão para este ano é de R$ 82 milhões. É esperado crescimento de 32% no volume de matrículas
Por Aryel Fernandes

[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
A reparação automotiva, por muito tempo dominada por homens e oficinas familiares, começa a ganhar uma nova cara e – um novo comando. À frente da Escola do Mecânico, Sandra Nalli transformou a falta de mão de obra qualificada em um modelo de negócios que une impacto social e rentabilidade. Criada a partir de um projeto desenvolvido na Fundação Casa, a rede especializou-se em formar profissionais para suprir a carência crescente do setor automotivo. Hoje, soma 50 unidades entre escolas próprias e franquias, com planos de chegar a todos os estados brasileiros nos próximos cinco anos. “Sempre digo que meu negócio nasceu de uma necessidade e virou um propósito”, disse ela à AGÊNCIA DC NEWS.

A força da expansão se reflete nos números. Em 2024, a Escola do Mecânico faturou R$ 62 milhões e prevê alcançar R$ 82 milhões neste ano — avanço de 32%. O mesmo ritmo é observado nas matrículas, que seguem em alta no país. Ao todo, mais de 125 mil estudantes já passaram pelas salas de aula, e 20 mil devem ser formados até o fim do ano. E o caminho até aqui foi longo. Desde os 14 anos dirigindo o Fusca vermelho do pai, Sandra Nalli começou sua trajetória na reparação automotiva. Começou como jovem aprendiz em uma rede de oficinas e, por quase 20 anos, enfrentou preconceito e resistência por ser mulher em um setor historicamente masculino.

Porém, sabia que podia fazer diferente com o próprio negócio: capacitando profissionais da área. “Vejo um futuro em que mulheres estarão cada vez mais em posições estratégicas, não apenas ocupando espaços, mas definindo agendas”, disse. E assim tem sido. Hoje mais da metade das unidades da escola é comandada por mulheres – e, para Sandra, esse é o verdadeiro diferencial competitivo. A diversidade, diz ela, “não é pauta social, é estratégia de crescimento”. O projeto foi mantido com recursos próprios até 2021, quando recebeu um aporte de R$ 1 milhão da Yunus Corporate – conhecida por financiar projetos de alto impacto social. De acordo com Sandra, ser selecionada pelo projeto foi um marco, já que poucos negócios fundados por mulheres haviam recebido esse tipo de investimento.  Além das salas de aula, a Escola do Mecânico lançou um aplicativo para conectar estudantes e ex-alunos a vagas de emprego, fortalecendo o elo entre formação e empregabilidade. Confira a entrevista a seguir.

Escolhas do Editor

AGÊNCIA DC NEWS – Como surgiu a ideia de criar uma escola de mecânica?
SANDRA NALLI –
A percepção da falta de profissionalização na área foi o ponto de partida. Comecei aos 14 anos, por necessidade financeira, e passei quase 20 anos em uma oficina, o que me deu base para construir uma carreira sólida.

AGÊNCIA DC NEWS – Você enfrentou resistência ao tentar assumir um cargo de liderança?
SANDRA NALLI –
 Sim. Aos 22 anos, pedi para assumir uma função tradicionalmente masculina e fui negada. Persisti, estudei por conta própria e consegui provar minha capacidade.

AGÊNCIA DC NEWS – E como começou seu envolvimento com ação social?
SANDRA NALLI – Foi por gratidão à empresa. Comecei a atuar na Fundação Casa, oferecendo palestras motivacionais que evoluíram para aulas de mecânica.

Aspas

No futuro, mulheres estarão em posições estratégicas e definindo agendas

Aspas
Sandra Nalli

AGÊNCIA DC NEWS – Esse projeto virou um negócio? Qual era o foco inicial da escola?
SANDRA NALLI – Sim. Vi uma oportunidade de negócio com impacto social. Mesmo com inseguranças e poucos recursos, vendi bens pessoais e montei um plano de negócios viável. Capacitar pessoas da classe C-D-E para gerar renda. A educação acessível era o pilar, com apoio do Sebrae para estruturar o plano de negócio.

AGÊNCIA DC NEWS – Quanto tempo levou até receber um aporte financeiro significativo?
SANDRA NALLI – Foram 10 anos. Em 2011, fiz um curso do Sebrae. O aporte de R$ 1 milhão só veio em 2021, após muito esforço e reinvestimento do próprio retorno financeiro.

AGÊNCIA DC NEWS – Você participou de processos seletivos para empreendedores sociais?
SANDRA NALLI – Sim. Abri mão do pró-labore para investir na empresa e fui selecionada por fundos internacionais, o que ajudou a superar a pandemia e a inovar.

AGÊNCIA DC NEWS – Quando começou a expansão por franquias?
SANDRA NALLI – Em 2015, percebemos o interesse de outras cidades. A formatação começou em 2016 com consultoria especializada. Hoje, temos 50 unidades, sendo 13 próprias.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual a importância das unidades próprias?
SANDRA NALLI – São essenciais para entender as dores do negócio e testar inovações antes de repassar aos franqueados. Influenciadores também ajudam a escalar com propósito.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual foi o momento decisivo da sua trajetória?
SANDRA NALLI – Aquela resposta negativa que recebi no início da carreira. Foi o impulso para buscar capacitação e provar meu valor. Não se trata apenas da pauta social==

AGÊNCIA DC NEWS – Como você lida com as expectativas no mundo corporativo?
SANDRA NALLI – Com autenticidade. A fala impositiva é percebida de forma diferente dependendo do gênero, mas o foco é entregar resultados e manter a essência.

AGÊNCIA DC NEWS – Como equilibrar uma personalidade marcante no ambiente corporativo? Você sente que muda de postura dependendo do ambiente?
SANDRA NALLI – É um desafio constante. A gente aprende a ajustar o tom, sem perder a essência. O ambiente exige foco, mas não precisa apagar quem somos. Totalmente. No trabalho, sou mais dura e orientada a resultados. Em casa, sou doce, espontânea e até brincalhona. É uma dualidade necessária.

AGÊNCIA DC NEWS – Como é atuar em um segmento majoritariamente masculino?
SANDRA NALLI – Desafiador, mas necessário. A diversidade é essencial, dentro e fora da empresa. Ela traz novas perspectivas e melhora os resultados. A diversidade é, por fim, não apenas uma pauta social, é também uma estratégia de crescimento estruturada e pautada em demandas reais da sociedade.

AGÊNCIA DC NEWS – Como avalia a presença feminina nesse mercado nos próximos anos?
SANDRA NALLI – Vejo um futuro em que mulheres estarão cada vez mais em posições estratégicas, não apenas ocupando espaços, mas definindo agendas.

AGÊNCIA DC NEWS – A contratação na sua empresa é baseada em quê?
SANDRA NALLI – Competência. Não adaptamos a função ao perfil, escolhemos o perfil certo para a função. Mais de 50% das nossas escolas são geridas por mulheres altamente capacitadas.

AGÊNCIA DC NEWS – Você teve uma mentora feminina que te inspirou? Como essa figura influenciou sua trajetória?
SANDRA NALLI – Uma gerente de RH foi fundamental. Ela me apoiou em momentos difíceis e me ensinou muito sobre liderança e diplomacia. Ela foi como uma mãe executiva. Me mostrou que mulheres podem estar onde quiserem, com sensibilidade e força. A conexão humana é um diferencial feminino.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual conselho você daria para mulheres que estão começando na liderança?
SANDRA NALLI – Sejam autênticas. A liderança feminina transforma equipes. O olhar humano engaja, conecta e gera resultados. Não tenham medo de ocupar espaços.

AGÊNCIA DC NEWS – Como você vê o setor automotivo brasileiro?
SANDRA NALLI – Desafiador. A frota é enorme, os gastos são altos e há uma lacuna entre o conhecimento dos mecânicos e a tecnologia dos veículos modernos.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual é a meta de expansão da escola?
SANDRA NALLI – Estar presente em todos os estados brasileiros. Hoje estamos em 12, com 50 escolas. Queremos chegar a 100 unidades nos próximos 5 anos.

AGÊNCIA DC NEWS – Você lançou um aplicativo de empregabilidade. Como ele funciona?
SANDRA NALLI – O objetivo do aplicativo é conectar alunos, ex-alunos e profissionais com vagas de emprego no setor. O app existente está sendo remodelado com tecnologia aprimorada para otimizar o contato entre candidatos e empresas. A nova plataforma, desenvolvida por mulheres na área de tecnologia, visa escalar a empregabilidade e gerar impacto social.

Mais de 125 mil alunos já foram formados na Escola do Mecânico
(Divulgação)

AGÊNCIA DC NEWS – Qual é a taxa de empregabilidade dos alunos?
SANDRA NALLI – Hoje, 30% dos alunos cadastrados na plataforma conseguem emprego. Nosso foco é o sucesso do cliente, mais do que vender cursos.

AGÊNCIA DC NEWS – Há parcerias com grandes empresas?
SANDRA NALLI – Treinamos equipes de empresas como a Toyota e buscamos expandir relações B2B com outras marcas e franquias.

AGÊNCIA DC NEWS – A empresa está crescendo verticalmente?
SANDRA NALLI – Sim. Isso gerou impacto com muitas contratações. A linha de receita já representa 20% do crescimento.

AGÊNCIA DC NEWS – Há novas unidades previstas para este ano? Quais regiões estão no foco de expansão?
SANDRA NALLI – Quatro novas escolas serão abertas até o final do ano. Queremos dobrar nosso número até 2030. Centro-Oeste, Norte e Nordeste, devido à carência de mão de obra. Também estamos desenvolvendo a rede da escola do funileiro.

AGÊNCIA DC NEWS – Como funcionam as escolas de funilaria?
SANDRA NALLI – Elas focam em finalização e estética automotiva. Podem ser integradas às escolas de mecânica, dependendo da demanda local.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual é o investimento para abrir uma franquia?
SANDRA NALLI –  O investimento é de R$ 550 mil, com retorno em cerca de 24 meses. O ponto de equilíbrio é alcançado por volta do sétimo mês, com rentabilidade entre 28% e 30%.

Voltar ao topo