Sandra Takata, do Instituto Mulheres do Varejo: "Muitas não enxergam o setor como porta para cargos de liderança"

  • Parceria com entidade ligada à comunidades pretende mostrar para mulheres que é possível alcançar cargos de liderança no varejo
  • Instituto realiza workshops. Um deles, na Nestlé, resultou em abordagem da companhia com varejistas para proteger time de vendas externas. "Sofriam assédio"
Por Bruna Lencioni Compartilhe: Ícone Facebook Ícone X Ícone Linkedin Ícone Whatsapp Ícone Telegram

[AGÊNCIA DC NEWS]. O Instituto Mulheres do Varejo foi fundado em 2018 por vários acasos, especialmente pela percepção de mulheres executivas sobre a necessidade de existir uma entidade organizada com olhar holístico para o segmento, mas com foco no feminino. “Tivemos um caso de violência doméstica com uma executiva do varejo. Decidimos agir”, afirmou a CEO da entidade, Sandra Takata, em entrevista ao DC NEWS Talks. De lá para cá, o grupo agora composto por 400 mulheres promove eventos e workshops. O projeto mais recente é uma parceria com o G10 Favelas por meio do projeto Emprega Comunidades, conhecido como o LinkedIn das Favelas. O objetivo é mentorar mulheres que podem trabalhar no varejo e mostrar que há oportunidades de crescimento nesse segmento. “Muitas mulheres não enxergam o varejo como carreira, mas ele pode ser uma porta de entrada para que alcancem posições de liderança.”

As mulheres do Instituto Mulheres do Varejo são ligadas ao universo corporativo e, predominantemente, têm relação direta ou indireta com o varejo. Desde o início da jornada, que teve como premissa criar um espaço de troca, networking e debates sobre as necessidades das mulheres neste segmento setorial da economia, Sandra tem algumas histórias sobre como o Instituto tem impactado o mercado. O caso Nestlé Brasil é um dos projetos mais emblemáticos da entidade, segundo Sandra. O Instituto realizou um workshop com a gigante global, que, segundo Sandra, enfrentava desafios em seu departamento comercial.

Eles procuraram o Instituto porque este era o único setor que não conseguia implementar a diversidade de gênero, mas a história piora. “As mulheres sofriam assédio moral e sexual ao negociar com varejistas [em atendimento externo], o que as levavam a pedir demissão ou mudar de área”, disse Sandra. O workshop, que contou com a participação de neurocientistas e executivas do varejo, abordou os vieses inconscientes e a importância de criar um ambiente respeitoso.

Escolhas do Editor

Durante uma das sessões, uma colaboradora da Nestlé compartilhou uma experiência marcante: “Ela contou que, para se manter no jogo, ria das piadas sexistas, mas aquilo a consumia por dentro.” Sandra explicou que a funcionária até que decidiu se posicionar, mas, no momento crucial, riu novamente. “Foi quando várias mulheres na sala começaram a chorar.” Esse momento foi um divisor de águas, contou a presidente. Um dos homens presentes se levantou e disse: “a partir de hoje, nos comprometemos a apoiar vocês.” “Se alguém contar uma piada sem graça, vamos dizer: ‘Essa já não tem mais graça'”. 

Esse compromisso gerou um movimento interno na Nestlé, que enviou uma carta de respeito a seus parceiros varejistas, reforçando a importância de um ambiente inclusivo, conforme a presidente do Instituto relatou. Nos últimos três anos, o Instituto Mulheres no Varejo realizou 12 workshops em grandes empresas. Essas ações têm como objetivo conscientizar sobre comportamentos inadequados e promover a igualdade de gênero. “Grandes empresas estão mais abertas a isso, especialmente por causa das exigências de compliance e da Bolsa de Valores”, afirmou Sandra.

PARTIDA – O ponto de partida do Instituto é mais uma história triste envolvendo violência doméstica. De acordo com Sandra, um grupo de mulheres reuniu esforços para tentar recolocar uma executiva – ela estava fora do mercado há dois anos. Mas a mulher em questão nunca chegava ao local combinado. “Ela foi agredida pelo marido, que não queria que ela voltasse a trabalhar”, disse Sandra. Em dado momento, decidiram ir até a casa desta mulher e a cena que encontraram foi de horror. “Esta moça estava caída no banheiro, com duas costelas quebradas, esganadura no pescoço e o rosto ensanguentado”, afirmou. Segundo Sandra, a mulher não aceitou fazer boletim de ocorrência.

As fundadoras, Vanessa Sandrini e Fátima Merlin, “sensibilizadas com a situação”, decidiram, a partir disso, e de outros acontecimentos na área do varejo, criar um grupo de apoio para mulheres do setor, inicialmente no WhatsApp. “O propósito não era somente este, a coisa ficou maior, então o Instituto foi criado”, disse Sandra. Hoje, o Instituto atua em diferentes áreas do ecossistema do varejo, desde fornecedoras até indústrias. “Capacitamos e inspiramos para que mais mulheres alcancem cargos de alta liderança”, afirmou Sandra.

FUTURO – O Instituto Mulheres no Varejo planeja ampliar seu impacto por meio de métricas e parcerias com associações do setor, de acordo com Sandra. “Precisamos de dados para entender onde estamos e para onde vamos.” “Queremos que as associações incluam informações sobre a presença feminina em cargos de liderança.” Além disso, a entidade mantém um grupo de homens aliados, chamado “Eles por Elas”, que participam de workshops e ajudam a promover a mudança. “Precisamos trazer os homens para a conversa. Eles são os líderes hoje, e sem eles, não há transformação.”

Confira a entrevista.

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