STF vai discutir pejotização. Para a Fecomercio, sociedade prevalece sobre corporações

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STF reunirá representantes patronais e de empregados, advogados e poder público no dia 6 de outubro
(Tom Molina/Folhapress)
  • Gilmar Mendes, relator, suspendeu ações relativas ao tema. Especialistas afirmam que legislação precisa se adequar a mudanças no trabalho
  • Advogado José Pastore diz que receio de que "o Brasil vai pejotizar tudo" é injustificado. Mas produtividade exige transformações legais
Por Vitor Nuzzi

[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
O Supremo Tribunal Federal (STF) promove em 6 de outubro, a partir das 8h, audiência pública para discutir “os desafios econômicos e sociais” da chamada pejotização. A Corte aprecia recurso sobre a licitude da contratação de trabalhadores autônomos ou pessoas jurídicas (PJs) para prestação de serviços. O número de inscritos (508) dá conta do interesse do assunto entre representantes empresariais e de trabalhadores. Desse total, foram selecionados 42 expositores, entre representantes patronais, dos empregados, da academia e do poder público. Até que a questão seja julgada, o relator, ministro Gilmar Mendes, suspendeu todos os processos relativos ao tema.

A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) reuniu, na última sexta-feira (26), especialistas para discutir a questão. Na abertura da live, o presidente em exercício da entidade, Ivo Dall´Acqua Júnior, defendeu a negociação direta. E criticou o que chamou de “ativismo institucional” do Judiciário. “As transformações têm que ser tratadas de forma concertada. De modo que todos possamos criar um ambiente que decorra do interesse da sociedade e não do interesse das corporações”, afirmou. Para ele, a Justiça do Trabalho “acaba assumindo um papel que exacerba a condição de proteção ao cidadão e ao trabalhador”.

Além disso, segundo o dirigente, existem na legislação “brechas e espaços, pelo fato de a nossa Constituição garantir princípios e não direitos objetivos”. Isso permite certo oportunismo, conclui. “Esse espaço dá oportunidade para partes levarem vantagens além do que elas próprias contrataram e pactuaram.” Dall´Acqua Júnior será o representante da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) na audiência do Supremo.

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O que se discute é o Tema 1.389, de Repercussão Geral. Isso significa que a decisão do STF, seja qual for, terá reflexo nas demais instâncias do Judiciário em que há ações sobre a questão. A Corte julga o Agravo com Recurso Extraordinário (ARE) 1.532.603, modalidade de recurso que contesta decisão anterior. A origem do caso está no Paraná, envolvendo a contratação, para prestação de serviços, de um corretor e uma empresa de seguros. O contratado perdeu na Justiça do Trabalho e decidiu recorrer.

TRANSFORMAÇÕES – “Há uma certa apreensão de que o Brasil vai pejotizar tudo. Isso é irrealista”, afirmou o presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP, José Pastore. Tudo dependerá da natureza da atividade, acrescentou. “O grosso da força de trabalho vai continuar por muito tempo como a tradicional, empregado e empregador”, disse o advogado. “A sociedade vai adaptando as formas de trabalho às suas necessidades.” Segundo ele, os sistemas produtivos se transformaram nas últimas três ou quatro décadas. A globalização dividiu tarefas e levou à exigência de especialização, área dos PJs. “É uma necessidade econômica imperiosa para poder ter produtividade, ter competitividade e gerar recursos.”

Trata-se de uma situação complexa, acrescentou Pastore. “Existem Pjs que entregam serviços. Tem PJs que entregam produtos às empresas. Tem PJ que entregam produtos e serviços.” Às vezes, o trabalho é feito dentro da empresa, outras vezes fora. E também individualmente ou exigindo a participação de empregados da própria corporação. De forma continuada ou não. “E bem diferente da relação binária entre empregado e empregador.”

Para Estêvão Mallet, professor na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP), o “núcleo” da controvérsia jurídica está na forma de contratação sob a forma de prestação de serviços. “Na prática, esses conceitos são muito fluidos”, afirmou. “Nem sempre é fácil distinguir a verdadeira relação autônoma de um contrato de trabalho.” Na linha de Pastore, ele observou que “não estamos mais naquela época da indústria clássica, em que todos os meios de produção convergiam para um determinado local”. É preciso encontrar um ponto de equilíbrio, defendeu, entre a flexibilidade “que não protege” e um sistema excessivamente rígido. Segundo ele, o ministro Gilmar Mendes quer examinar três questões, basicamente: 1) qual é o órgão do Poder Judiciário que deve decidir se é contrato trabalhista ou civil?; 2) Como caracterizar o contato civil para que não seja reconhecido como trabalhista?; 3) A quem cabe o ônus da prova (do vínculo)?

A economista Luciana Yeung, professora especializada em Análise Econômica do Direito e associada do Insper, é preciso pensar em novos modelos. “Uma legislação extremamente protecionista pode gerar o efeito contrário”, afirmou. “Pode ser um desincentivo à contratação”. Ela prefere aguardar a manifestação do STF. “A gente viu outras situações em que o posicionamento do STF gerou mais insegurança ainda”, disse. “Algumas vezes, o posicionamento não foi suficiente para pacificar o problema.”

É preciso não confundir terceirização (já admitida pelo STF) e pejotização, comentou o professor Otavio Pinto e Silva, presidente da Comissão de Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil São Paulo (OAB-SP). “Há a necessidade de separar o joio do trigo, é isso que o STF deverá decidir”, afirmou. “Reconhecer a validade das situações de contratação de PJ, mas reconhecer também que isso não é um opção que fica a critério do tomador de serviços.”

Outra discussão no STF que cria expectativa refere-se ao universo das franquias. Na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.149, o Partido Novo pede que a Corte declare a inconstitucionalidade de decisões da Justiça do Trabalho reconhecendo vínculo empregatício entre franqueadores e franqueados. Para a Associação Brasileira de Franchising (ABF), isso fere a Lei 13.966/2019. A relatora é a ministra Carmen Lúcia.

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