Turma do TST confirma indenização por dano existencial a motorista com jornada de 21 horas

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Terceira Turma do TST (Tribunal Superior Eleitoral) garantiu o pagamento de indenização no valor de R$ 20 mil a um motorista de caminhão que processou a empresa JBS alegando ter jornada de trabalho de até 21 horas por dia.

Segundo o caminhoneiro da cidade de Lins, no interior do estado de São Paulo, sua jornada diária era das 6h às 22h, com duas folgas mensais de 24 horas, o que lhe privava de ter momentos livres com a família e colocava em risco sua integridade física e de outros motoristas na estrada.

Em nota enviada à Folha de S.Paulo, a JBS afirma fechou acordo e irá pagar o valor da indenização, mesmo tendo validado o controle de jornada em todas as instâncias da Justiça.

“Ainda assim, a empresa optou por firmar acordo, nos autos do processo, em 30/06/2025. Esse acordo já foi homologado e validado pelo órgão jurisdicional competente”, diz.

Os ministros acompanharam o voto do relator, Alberto Balazeiro, que entendeu haver dano existencial por cumprimento de jornada extenuante, impedindo “o exercício dos direitos fundamentais do empregado, violando o princípio da dignidade da pessoa humana”.

O caso chegou ao TST após a empresa recorrer de decisão da segunda instância, em Campinas (SP), que determinou pagamento de R$ 20 mil. A JBS solicitava indenização menor, afirmando que mesmo se comprovada a jornada maior, o fato por si só não seria suficiente para o dano existencial, cujos prejuízos pessoais deveriam ser provados pelo profissional.

Na primeira instância, o trabalhador havia conseguido indenização de R$ 5.000. No entanto, tanto ele quanto a empresa recorreram à segunda instância; o profissional buscava valor maior, e a JBS, menor.

Segundo a advogada Érica Coutinho, sócia do escritório Mauro Menezes & Advogados, o dano existencial vem ganhando relevância na Justiça Trabalhista brasileira, com decisões do TST que podem ser tomadas como precedentes.

Ela diz que os processos julgados reforçam que o dano existencial vai além do prejuízo financeiro, reconhecendo um abalo à dignidade humana.

“O dano existencial se configura quando as condições de trabalho prejudicam os projetos de vida do empregado, afetando suas relações pessoais e sua integridade física ou psíquica.”

Mauricio Corrêa da Veiga, advogado trabalhista e sócio do Corrêa da Veiga Advogados, afirma que a tese do dano existencial tem origem na Itália, no final do século 20, mas é relativamente nova no Brasil. No entanto, vem ganhando força na Justiça, mesmo sem previsão expressa na reforma trabalhista de 2017.

Segundo ele, a tese trata da responsabilidade do empregador quando há comprometimento da vida pessoal do trabalhador, como falta de tempo livre, de convívio familiar e impossibilidade de tocar projetos de vida que não sejam dentro do trabalho.

O advogado ressalta, no entanto, que o entendimento consolidado atual exige prova concreta do dano, e que, no caso específico, o que foi apresentado poderia, em outras ocasiões, ser considerado não tão robusto.

Esse era o argumento da empresa, mas, no julgamento, o TST entendeu que era ônus da empresa provar não haver jornadas extenuantes. O trabalhador apresentou testemunha, assim como o empregador.

“A decisão ignorou a necessidade de produção de prova por parte do reclamante”, diz. Para ele, a medida contraria entendimento já firmado pela Subseção 1 do TST, especializada em dissídios individuais, que exige comprovação efetiva da jornada extenuante.

O QUE DIZ O TST SOBRE DANO EXISTENCIAL

De acordo com Érika, a Constituição Federal, o Código Civil e a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) reconhecem a possibilidade de reparação por esse tipo de dano e o TST já julgou alguns casos emblemáticos sobre o tema, com base em situações como a não concessão de férias por longos períodos ou mesmo as jornadas extenuantes.

Uma decisão de destaque reconheceu a violação de direitos da personalidade de uma trabalhadora que passou dez anos sem férias, o que afetou sua saúde e vida privada, contrariando o inciso 10 do artigo 5º da Constituição.

Outro caso analisado no tribunal superior envolveu um motorista rodoviário quer seria submetido a jornadas superiores a 13 horas diárias de trabalho por mais de cinco anos, incluindo domingos e feriados.

A corte entendeu que a conduta da empresa prejudicou de forma grave o desenvolvimento pessoal do trabalhador, configurando dano existencial e garantindo direito à indenização.

ENTENDA O CASO

O motorista procurou a Justiça solicitando diversas verbas trabalhistas, como horas extras, pagamento de valores por não fazer o intervalo dentro da jornada para alimentação e não ter respeitado o descanso mínimo entre as jornadas, pediu o pagamento de domingos e feriados em dobro, solicitou indenização por tempo de espera, integração de prêmios e diárias à remuneração, diferenças salariais do piso e indenização por danos morais.

Teve parte dos pedidos confirmados e a concessão de dano moral no valor de R$ 5.000. Na segunda instância, o dano foi elevado para R$ 20 mil, valor mantido pelo TST.

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