[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS].
Chega perto de 20 o número de marcas chinesas atuando ou prestes a entrar no mercado brasileiro. A maioria tem como foco automóveis elétricos e híbridos e metas de mudar o ranking de vendas, hoje liderado por empresas que estão no Brasil há pelo menos cinco décadas – Fiat (desde 1976), Volkswagen (1953) e General Motors (1925). Algumas das asiáticas falam em estar entre as cinco maiores até 2030, ou até mesmo no topo da lista.
Dinheiro para essa ofensiva não falta. Investimentos anunciados só por quatro grupos somam R$ 26 bilhões. A estratégia das entrantes é de aquisição de fábricas desativadas ou parcerias com montadoras já estabelecidas para acelerar o processo fabril, reduzir custos e colocar no mercado produtos com preços competitivos.
A Geely, dona de marcas como Volvo e Lotus, adquiriu em novembro 26,4% das ações da Renault do Brasil. Já na segunda metade de 2026 iniciará a produção de dois modelos na fábrica do grupo francês no Paraná. O primeiro será o híbrido plug-in EX5 RM-i. A parceria inclui o uso da rede de revendas da Renault, que está abrindo lojas específicas para a Geely, e prestará serviços de pós-venda. A marca asiática já vende dois SUVs elétricos importados, o EX5 e o EX2.
A empresa que surgiu dessa união anunciou investimento de R$ 3,8 bilhões em uma plataforma para produzir seus carros eletrificados, assim como os da Renault. “É uma parceria de ganha-ganha”, disse Fabrice Cambolive, CEO global da marca Renault.
A parceria envolve todos os processos industriais, além de desenvolvimento de produtos e compartilhamento de fornecedores. A Renault, além do acesso à tecnologia de eletrificação, vai aumentar a ocupação da fábrica, que hoje opera com 50% de sua capacidade. “Queremos dobrar nossa produção e estar entre as cinco maiores montadoras em cinco anos”, afirmou Cambolive.
Ariel Montenegro, presidente e diretor geral da Renault Geely Brasil, cita outra vantagem da união. “O preço do carro é resultante da competitividade do custo de produção e da amortização dos investimentos”, disse. Para ele, a sinergia não só acelera o tempo para início de operações,”como faz uma conexão entre as capacidades produtivas mais interessantes, reduzindo o preço dos produtos para o consumidor”.
MERCADO EM ALTA – Do total de carros vendidos no Brasil neste ano, os elétricos e híbridos representam 10,7%, ou 245,4 mil unidades até novembro. A previsão da Anfavea (associação das fabricantes) é de que chegue a 44% em uma década. O volume atual é 58% maior que o de 2024 e grande parte, principalmente dos elétricos, vem da China.
Além da Renault e da Geely, a Stellantis – dona de Citroën, Fiat, Jeep, Peugeot e RAM – anunciou no mês passado a produção de carros da chinesa Leapmotor em sua fábrica de Goiana (PE). A marca iniciou recentemente a venda do importado SUV C10 em versões elétrica e híbrida. A companhia ítalo-americana é dona de 20% da Leapmotor desde 2023.
Outra gigante chinesa, a GAC, negocia com a HPE (fabricante e importadora de modelos da Mitsubishi e da Suzuki) a fabricação de seus modelos na planta de Catalão (GO), que também opera com ociosidade. A GAC programa investimento de cerca de R$ 7 bilhões no Brasil e já tem cinco modelos importados à venda no país.
O pioneiro nas parcerias foi o grupo brasileiro Caoa, ao se aliar à Chery em 2017. A produção dos modelos da marca, antes feita em Jacareí (SP), foi transferida para o complexo da Caoa, em Anápolis (GO). A instalação é cobiçada por submarcas da Chery.
A Caoa concretizou recentemente parceria com outra chinesa, a Changan, e também vai montar veículos da marca em Goiás, além de importar modelos da Avatr, marca de luxo do grupo Changan.
TURNING POINT – A invasão chinesa teve um ponto de virada, desta vez com carros de qualidade, tecnologia e preços competitivos. E isso ganhou tração com a chegada da BYD e da GWM. Ambas optaram por adquirir fábricas prontas. A BYD escolheu a planta que foi da Ford em Camaçari (BA), e a GWM comprou a da Mercedes-Benz em Iracemápolis (SP).
Adquirido em 2023, o complexo da Ford passou por obras que duraram quase dois anos. A montagem dos modelos BYD Dolphin Mini, King e Song Pro, com kits trazidos da China, começou em outubro. O grupo tem plano de investimento de R$ 5,5 bilhões.
Líder no segmento de elétricos, a BYD também passou a vender o B5, um SUV off-road de sua marca premium Denza, que será distribuído em rede própria. Já há estudos para sua montagem na Bahia, informa Alexandre Baldy, vice-presidente sênior de Marketing.
Segundo ele, o objetivo para os próximos três anos é estar entre as três maiores montadoras do Brasil e ser a número um em 2030. Desde sua chegada, a marca vendeu mais de 100 mil carros elétricos e figura em oitavo lugar no ranking brasileiro.
Já no caso da GWM, as alterações na planta paulista levaram mais de três anos e a unidade só foi inaugurada em agosto. Em novembro, passou a operar com um segundo turno e está ampliando seu quadro para 1,3 mil funcionários.
O objetivo é dobrar a produção atual de 1 mil carros por mês. “Mesmo assim ainda não daremos conta da demanda”, afirmou Marcio Alfonso, diretor de Produção. A expectativa até o fim de 2026 é produzir 50 mil unidades ao ano. Para isso, será preciso um terceiro turno e readequação da fábrica.
Segundo Alfonso, a GWM prefere ter unidades próprias sob medida para seguir seu padrão de qualidade. “Usar linhas de terceiros não daria certo porque nossos produtos têm configurações muito próprias.” Ele acrescenta que o desafio é a localização de componentes para atingir 35% de conteúdo nacional em dois anos. “Queremos estar entre os primeiros em vendas nos segmentos em que atuamos.”
A planta paulista atua com várias etapas fabris, como montagem, solda e pintura. Produz versões híbridas e plug-in do Haval H6, o Haval H9 e a picape Poer a combustão. O sistema híbrido flex está em desenvolvimento em parceria com a Bosch e pode equipar modelos a partir da metade de 2026.
ESTRATÉGIA DIVERSIFICADA – Além das que já estão mais avançadas na produção no Brasil há outras a caminho. As marcas Omoda & Jaecoo, da Chery, oferecem quatro elétricos e híbridos importados e mais dois chegarão em 2026. O plano é anunciar produção local no próximo ano. Segundo o diretor de Desenvolvimento, Felipe Amaral, no momento a estratégia é diversificada. “Trabalhamos com oportunidades em paralelo que vão desde aquisição [de uma planta], construção de fábrica ou parceria com outro fabricante”.
As vendas neste ano devem chegar a 10 mil veículos e crescer para 50 mil em 2026. “Queremos estar perto das top 10, e entre as top 5 em três anos”, afirmou Amaral. “Com volume anual de mais de 100 mil carros.”
A marca britânica MG, hoje nas mãos da chinesa Saic, chegou há pouco tempo no Brasil com a venda de importados premium e também fala em produção local com parceiro a ser definido. Já três submarcas da Gelly – Farizon, Riddara (as duas representadas pelo grupo paranaense Timber, cujo core é a mecanbização florestal) mais a Zeekr – também têm negociações de licenças para fabricação local. A chinesa Foton produz desde este ano em Caxias do Suil (RS) e a JAC já estudou uma planta por aqui, mas ainda não chegou a uma solução viável. A Link and Co, também sob o guarda-chuva da Geely, chega em 2026, junto da Jetour, da Chery.
As montadoras veteranas que já atuavam no país estão se valendo de associações já consolidadas com grupos da China para disputar o mercado de eletrificados. Parceira da Saic há vários anos, a General Motors iniciou neste mês a montagem do elétrico Spark, da marca chinesa, em Horizonte (CE). O complexo industrial que pertencia à Ford hoje é administrado pela Comexport, grupo brasileiro do ramo de exportação que também produzirá veículos de outras marcas. Na China, Volkswagen e XPeng fizeram acordo para produção de eletrificados a partir de 2026. A perspectiva é de que alguns deles poderão vir para o Brasil.
A invasão chinesa atua num leque de frentes que vão de jornada própria a parcerias com eventuais concorrentes. E independentemente da estratégia adotada pelas montadoras que já atuavam aqui, nada mais no mercado automotivo brasileiro será como antes.