Donald Trump vence. A economia global perde. Pelo menos no curto e médio prazo. E nem se trata de uma visão ideológica. A vitória do republicano nesta quarta-feira (6) marcará um mandato mais à sua imagem do que foi o primeiro. Por duas razões. Ele está mais ciente dos caminhos para emplacar sua agenda. O segundo motivo é o domínio do Congresso, o que facilitará a aprovação de suas medidas – o Senado já tem maioria republicana (52 a 42) e a Câmara segue para o mesmo caminho (197 a 177 eleitos, às 10h de Brasília). E o que pensa e quer Trump para a economia? Proteger a indústria americana de duas maneiras. Taxando produtos importados e diminuindo impostos corporativos. “Trump tende a produzir mais inflação, e isso impediria que a taxa de equilíbrio dos juros, que está em 4,25%, chegue aos patamares históricos de 2,75%-3%”, afirmou à DC NEWS o economista VanDyck Silveira, que é CEO da Humaitá Digital e colunista do canal BM&C News. “Isso fará o dólar ficar mais forte perante todas as moedas do mundo, inclusive a brasileira, o que vai pressionar a inflação por aqui também.” Às 10h de Brasília, o dólar subia 1,3%.
Como lembra VanDyck, o Brasil é um país que importa muito – US$ 217,6 bilhões no acumulado do ano até a quarta semana de outubro – e apesar do saldo positivo na balança é dependente de produtos-chave e propulsores de preços para toda a cadeia da economia. “Importamos, por exemplo, mais de 90% dos fertilizantes, o que faz com que as coisas fiquem mais caras no Brasil”, disse. Assim como todas as commodities, que são cotadas em dólar. “Vai provocar pressão inflacionária e deixará os juros daqui mais elevados.”
Pelo mundo, o efeito deverá ser semelhante. O presidente da poderosa Associação Alemã da Indústria de Engenharia Mecânica, Thilo Brodtmann, disse à agência de notícias Deutsche Welle que “é preciso levar especialmente a sério os anúncios de Trump sobre tarifas”. Ele teria prometido taxar pelo menos em 10% os produtos importados pelos Estados Unidos, tarifa que para os chineses seria de 60% e chegou a sugerir até 100%. “O segundo mandato de Trump será um desafio maior para a indústria alemã e europeia do que seu primeiro mandato”, disse Brodtmann.
Em entrevista à agência de notícias Reuters, o consultor econômico-chefe do grupo UniCredit, Erik Nielsen, disse que as promessas de Trump são seriamente problemáticas para a economia dos EUA e para os mercados financeiros globais. “Elas devem expandir enormemente um déficit já excessivo”, afirmou Nielsen. Ruim para o Brasil e emergentes – que dependem ainda mais de financiamento em dólar –, pior para os europeus e… ainda pior para a China. Segundo a rede americana CNBC, “a nova era política nos Estados Unidos acontece em meio a uma desaceleração econômica chinesa”, que passa por uma fraca confiança do consumidor e queda no mercado imobiliário. “Medidas de estímulo devem ser anunciadas no final desta semana para impulsionar a demanda doméstica.” Dependendo da intensidade desse potencial pacote chinês, a notícia pode ser boa para o Brasil, que tem na China seu maior importador.
RALI – Entre os players que devem se dar bem com a vitória de Trump estão as empresas americanas. Para VanDyck, S&P 500 e Nasdaq farão um rali por causa da promessa de corte de impostos. “Ao cortar impostos corporativos, isso se reverte em investimentos e aumenta o preço das ações”, afirmou. A vantagem disso, segundo VanDyck, é que parte de todo esse dinheiro virá para o Brasil. “Tanto no investimento em portfólio, o chamado hot money, quanto em investimento direto. E o maior investimento direto no país ainda vem dos americanos.” Às 10h de Brasília, o Nasdaq Composite Index subia 1,43% e o índice futuro do S&P 500 tinha alta de 2,28%.
Se pelo lado econômico o pacote de más notícias traz algumas boas, pelo lado político a vitória de Trump será ruim para o governo Lula. “O Brasil está muito alinhado com a China, com o Sul Global, e isso pesa contra”, disse VanDyck. Para ele, o país vai perder por esse alinhamento imediato prévio e a postura do governo Lula em apostar contra Trump. “O Brasil não é um país pragmático. E Lula nunca perde a chance de ficar calado. Deveríamos ficar quietos e depois levantar a bandeira de quem foi eleito.”
O pacote de promessas do republicano – de corte de impostos, aumento de tarifas de importação, incentivo à indústria e deportação em massa de imigrantes ilegais – vai aumentar os salários, e mesmo que num segundo momento pressione ainda mais a inflação, o discurso foi suficiente para convencer os eleitores americanos, que enfrentam os altos preços dos alimentos e da moradia. “Mais uma vez, it’s the economy stupid!”, afirmou VanDyck. “É um recado forte a políticos que se esquecem da economia e através de políticas fiscais populistas fazem a inflação avançar corroendo o poder aquisitivo dos mais pobres.”