[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
A rua 25 de Março, no centro da capital paulista, completará 160 anos de existência sob este nome nesta sexta-feira (28). Apesar da data registrada, a veia comercial do local é muito mais antiga, resultado do fluxo histórico, das mudanças geográficas e ondas migratórias que narram a construção do comércio paulistano. A rua se tornou sinônimo de resiliência, cuja cultura de consumo nasceu das adversidades e segue se renovando por meio delas. Em entrevista ao DC News Talks, o videocast da Agência DC NEWS, o pesquisador Lineu Francisco de Oliveira, responsável por desenterrar a história da rua, destacou as circunstâncias que construíram a 25 de Março como o brasileiro conhece hoje, as transformações da era digital e a importância do local para a economia paulista. “Os brasileiros começaram a enxergar São Paulo como um polo de comércio por causa da 25 de Março”, afirmou.
No século 16, quando os jesuítas se estabeleceram no que viria a ser a cidade de São Paulo, as comunidades indígenas da região permitiram que os padres construíssem sua base entre duas regiões alagáveis, banhadas pelos rios Anhangabaú e Tamanduateí. Nos séculos seguintes, a cidade cresceu em torno deste marco zero, o Pateo do Collegio. A 600 metros dali, onde atualmente está a rua 25 de Março, foi construído um porto por onde escoavam as mercadorias trazidas do porto de Santos pelo rio Tamanduateí. Já no final do século 19, a abolição da escravidão formal no Brasil gerou as primeiras ondas migratórias vindas da Ásia e da Europa. Nas margens do rio e subindo o que hoje se conhece como a Ladeira Porto Geral, se estabeleceram imigrantes sírios e libaneses, que enxergaram no fluxo de mercadorias uma oportunidade de importar produtos para atender à demanda da crescente população estrangeira por preços mais acessíveis. “O rio foi fundamental. Permitia negociar diretamente com os fornecedores santistas e seus alagamentos naturais diminuíram o preço dos imóveis”, disse o pesquisador.
Esses alagamentos também foram essenciais para a construção da fama de preços baixos da região. Em janeiro de 1929, aconteceu a maior enchente da história de São Paulo, que atingiu também os comércios da 25 de Março. Para evitar tanto prejuízo, os comerciantes da rua promoveram liquidações com os produtos danificados, o que acabou virando estratégia de vendas. Nas décadas que se sucederam a esta e outras tragédias do gênero, o poder público se lançou na empreitada de desviar o curso do rio e asfaltar as ruas adjacentes. Segundo Lineu, a infraestrutura desenvolvida no período, a localização central e os preços baixos determinaram o destino da rua como a conhecemos hoje. A resiliência dos lojistas e trabalhadores da rua no período das enchentes foi absorvida pela cultura local, se integrou às ofertas e mantém a clientela fiel mesmo em tempos de e-commerce.
TRANSFORMAÇÕES – O comércio popular paulistano sempre foi bom em se adaptar às tendências, e esta é uma expertise da 25 de Março. “Essa adaptabilidade acontece tanto ao longo do ano quanto ao fluxo histórico, perdurando em mãos árabes e, posteriormente, chinesas”, afirmou o pesquisador. Enquanto no século passado a rua era tomada por armarinhos e lojas de tecidos, os mais de 3.800 comércios na região atualmente, segundo dados da União Lojistas 25 Marco (Univinco), vendem de eletrônicos à perucas, sem contar os ambulantes que ocupam as calçadas ao longo de toda a extensão da rua. Para Lineu, o comércio informal e as lojas fixas respondem fisicamente à uma demanda criada pelas tendências das redes sociais, que mudam todos os dias.
Um dos pontos abordados pelo pesquisador é justamente a competição com o e-commerce, que atende às tendências com muito mais velocidade por não esbarrar nas dificuldades de anunciar e fazer estoque em uma loja física. Ainda assim, mesmo com a possibilidade de comprar qualquer produto com alguns cliques, cerca de 200 mil pessoas de todas as regiões do país circulam diariamente pela 25 de Março. Segundo Lineu, a rua atende aos consumidores que não abrem mão de conhecer fisicamente os produtos, por isso muitas lojas da região operam em multicanalidade. “O tino comercial permanece mesmo com a passagem do tempo, das tendências e das etnias predominantes. Inclusive no digital.” Confira a entrevista.