MP da Venezuela diz que oposição deveria seguir exemplo de Bolsonaro e aceitar derrota na Justiça

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, saudou nesta sexta-feira (23) a homologação da reeleição do ditador Nicolás Maduro, anunciada pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) na véspera e contestada por diversos países e organizações independentes.

Em pronunciamento transmitido pela TV estatal, Saab disse que convocará Edmundo González, o adversário de Maduro nas urnas, para depor. O ex-diplomata havia se recusado a comparecer em uma audiência do TSJ no início do mês e não aparece em público desde 30 de julho, quando participou de uma manifestação, por temor de represálias, limitando sua atuação às redes sociais.

“Ele vai ter que dar as caras”, disse Saab sobre González. “Terá que atender a esta convocação para falar sobre a sua responsabilidade antes, durante e depois do 28 de julho [data das eleições presidenciais] por sua contumácia e desobediência às autoridades legitimamente constituídas.”

A oposição afirma que o opositor venceu com 67% dos votos, uma conclusão amparada por mais de um estudo independente. O regime, por sua vez, declarou o ditador presidente eleito com 52% dos votos, mas não demonstrou evidências disso.

Ainda durante o pronunciamento, o chefe do Ministério Público venezuelano pediu pena de prisão para González e María Corina Machado, a líder da oposição impedida pela Justiça de disputar a Presidência. Ele os acusa de incitar a violência e o crime nos protestos contra a ditadura que tomaram as ruas após o anúncio da reeleição pelo regime. Duramente reprimidas pelas forças de segurança, as manifestações deixaram ao menos 27 mortos e quase 200 feridos, além de resultarem na prisão de mais de 2.400 pessoas.

O procurador-geral também atribuiu a González a responsabilidade pelo que chamou de falsificação das atas eleitorais -documentos que, como os boletins de urna brasileiros, permitiriam comprovar a lisura do processo eleitoral de forma independente e que a ditadura se recusa a divulgar a despeito da pressão internacional.

Saab disse que, ao publicar as atas em um site aberto ao público, González usurpou “poderes que só cabem ao Poder Eleitoral”. Uma checagem dos papéis realizada por um projeto independente colombiano constatou, porém, que há “sérios indícios” da integridade das cópias virtuais divulgadas.

Por fim, Saab tentou justificar a decisão do TSJ comparando os questionamentos feitos à lisura do processo eleitoral venezuelano com disputas judiciais ocorridas no âmbito de pleitos de outros países.

Um dos exemplos citados por Saab era brasileiro: uma ação impetrada pelo PL de Jair Bolsonaro depois que ele foi derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições presidenciais no Brasil em 2022. O processo buscava invalidar votos depositados em parte das urnas eletrônicas no segundo turno, defeituosas segundo a legenda.

Em sua fala, Saab disse que até mesmo Bolsonaro, que descreveu como “um homem de extrema direita que fez apologia do fascismo”, reconheceu na Justiça a competência de “examinar, verificar e decidir temas controversos” e acabou por cumprir sua determinação.

O procurador-geral venezuelano não mencionou, porém, que a ação não só foi negada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) brasileiro, como resultou na cobrança de uma multa de quase R$ 23 milhões da coligação do então candidato, formada por PL, PP e Republicanos, por “litigância de má-fé”.

Saab ainda repetiu um equívoco cometido pelo TSJ na véspera ao tentar usar exemplos internacionais para sustentar a competência do tribunal para decidir a questão. Ele comparou uma decisão do TSE brasileiro ao do TSJ venezuelano —mas o TSE é o equivalente ao CNE (Conselho Nacional Eleitoral), o órgão máximo eleitoral venezuelano.

O Brasil inclusive reforçou no início de agosto que cabia ao CNE aclarar a situação eleitoral em Caracas, e não o Supremo venezuelano. O regime ignorou, porém, o pedido, feito ao lado da Colômbia e do México.