[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
Mais empresas e menos receita. Assim se resume a participação do setor cultural no universo CNPJ brasileiro, de acordo com pesquisa recém-divulgada pelo IBGE cobrindo o período entre 2013 e 2023. O número de empresas variou positivamente (de 8% para 8,6% em relação ao total de companhias ativas no Brasil). Para efeito de comparação, nos países da OCDE essa média é de 7%. Esse crescimento não foi acompanhado, no entanto, nas receitas. A participação delas no faturamento de todos os negócios recuou de 7,7% para 5,6%, com receita líquida estimada de R$ 910,6 bilhões.
“Em termos de orçamento, o setor cultural não é prioridade. Os gastos públicos são muito baixos em relação a outros setores”, afirmou Leo Morel, músico profissional, pesquisador de cultura e professor de MBA na FGV-Rio. Pode não ser prioridade, mas o volume alcançou níveis recordes nos últimos anos. Em termos federais, os principais recursos públicos para a atividade cultural são a Lei Rouanet e a Lei Paulo Gustavo. A primeira, criada no início dos anos 1990, injetou R$ 3 bilhões no setor em 2024, por meio de renúncia fiscal, o maior valor da série histórica. Este ano, o volume está em R$ 2,3 bilhões. Mesmo inferior ao ano passado, é equivalente a 2023 e o segundo maior da história.
O recuo de quase 24% na Rouanet foi de certa forma compensado pela Lei Paulo Gustavo. Criada em 2022 para minimizar os efeitos da pandemia de covid 19 sobre o setor, ela destinou investimentos de R$ 3,8 bilhões de forma direta e descentralizada – do Ministério da Cultura foi enviado a Distrito Federal, estados e municípios. O prazo para uso do dinheiro, que originalmente era até o fim de 2023, foi prorrogado para o fim de 2024 e novamente estendido, até o próximo dia 31 de dezembro. Além delas, há inúmeras leis estaduais e municipais. “Os recursos ficaram acima da inflação no último ano, o que acaba sendo uma notícia positiva”, afirmou Morel.
RETORNO – O ponto central de quem pesquisa e atua na área é mostrar que o investimento traz alto retorno. Pesquisa divulgada no ano passado pela FGV Projetos (considerando recursos aplicados apenas no estado do Rio de Janeiro) afirmou que para cada R$ 1 investido em cultura via Lei Paulo Gustavo o retorno superou R$ 6. O estudo do IBGE, deste ano, também mostra que o setor cultural se destaca em termos de geração de empregos e salários. No ano passado, a cultura empregava 5,9 milhões de pessoas, a máxima da série histórica iniciada em 2014. O total de salários pagos anualmente (ano-base 2022) foi de R$ 102,8 bilhões, ou 4,5% da massa salarial, o equivalente a um salário médio mensal de R$ 4.658. É um número 31,5% superior à média dos salários (R$ 3.542), segundo a pesquisa.
Para o analista socioeconômico do setor de disseminação da informação do IBGE, Jefferson Mariano, a evolução da cultura no país está ligada a dois fatores principais: o aumento da renda e a escolaridade. “Tem o aspecto relacionado ao crescimento da atividade econômica, que fez as pessoas terem mais acesso à cultura”, disse. O especialista pondera, contudo, que na macroeconomia “a contribuição da cultura ainda é periférica e ainda está distante dos outros setores”. Uma das razões que ele destaca para isso é que gastos com alimentação, educação e saúde ainda são prioridades entre as famílias. “Sobra pouco orçamento para esse tipo de despesa [gastos com cultura].” Outro fator importante, que Mariano observa, é que a cultura ainda está limitada às camadas mais altas da população. “Além de ser secundária na economia, é objeto de alcance da população com renda mais elevada”, afirmo. “Ainda muito restrita entre a população de baixa renda.”
INFLAÇÃO DA CULTURA – O IBGE também elabora um Índice de Preços de Cultura (IPCult), que acompanha os valores de uma cesta de bens e serviços com 30 subitens culturais em seis categorias. Desde 2020, esse índice teve variações menores do que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação — ou seja, os produtos culturais encareceram menos ao longo dos últimos em relação aos outros setores. Entre 2020 e 2024, a variação média anual do IPCult foi de 3,1%, ante 5,9% do IPCA. No ano passado, o IPCult foi de 2,8%, contra 4,8% do IPCA.
Em relação aos Microempreendedores Individuais (MEI) que atuam em cultura, o Cempre inclui no setor 72 CNAEs (Classificação Nacional de Atividades Econômicas). A cultura concentra 9,5% de todos os MEIs no país, ou 1,4 milhão de CNPJs. Os principais CNAEs na análise são design e serviços criativos, que abrangem 44,9% das atividades econômicas consideradas culturais, inclusive publicidade, artes visuais e artesanato. Mariano, do IBGE, diz que são acessórios importantes para o setor cultural. “Acabam contribuindo para outras áreas, como editoração, música e espetáculos.”
Leonardo Athias, coordenador do estudo do IBGE, afirma que as informações das pesquisas por empresa mostram mudanças estruturais no setor em dez anos. Segundo ele, tiveram ganho de importância atividades como cinema, vídeos e TV, e também arquitetura e publicidade. Por outro lado, “há perda em setores ligados ao livro, comércio de equipamentos de informática e comunicação”. Na balança comercial do setor, a China respondeu por mais da metade (55,6%) das importações, seguida por EUA (6,3%) e Alemanha (5,0%). Cerca de um terço do valor importado (35,1%) esteve ligado a aparelhos eletrônicos, sobretudo microfones, alto-falantes e smartphones.