BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A deputada Jack Rocha (PT-ES) apresentou nesta quarta-feira (28), no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, relatório final em que recomenda a cassação do mandato do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ).
O crime, ocorrido em março de 2018, resultou também na morte do motorista Anderson Gomes e teve repercussão nacional.
O próximo passo agora é a votação do parecer pelo Conselho de Ética, formado por 21 deputados, cuja decisão tem força apenas de recomendação. A palavra final sobre cassação ou manutenção do mandato do parlamentar é do plenário da Câmara.
Brazão está preso desde 24 de março por ordem do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes.
Ele fez sua defesa nesta quarta-feira, durante a sessão, de forma remota.
“Sou inocente, totalmente inocente nesse caso. A vereadora Marielle era minha amiga, comprovadamente. (…) A Marielle saía do lugar dela e pedia as vezes uma bala, um chiclete [na Câmara de vereadores do Rio], isso até um dos depoentes, que foi meu assessor, falou. Não tem uma única testemunha, sem tirar o Ronnie [Lessa, suposto executor do crime], que me acusa, não tem uma que me acusa, não tem nenhuma testemunha que fala de mim. É uma versão, em relação a mim e ao meu irmão, totalmente descabida”, disse o parlamentar.
Além dele, estão atrás das grades o seu irmão, o conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Rio Domingos Brazão, e o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil no Rio.
Eles também negam envolvimento com o crime.
A defesa de Chiquinho Brazão chegou a pedir a troca da relatoria do processo afirmando parcialidade da relatora. De acordo com seus advogados, Jack Rocha tornou público o seu posicionamento acerca do caso. O pedido cita publicações da parlamentar em redes sociais cobrando o encaminhamento da representação do PSOL pela cassação ao Conselho de Ética.
O pedido, porém, não prosperou.
Nesta quarta, a defesa de Brazão também pediu que o conselho usasse o mesmo parâmetro usado para livrar o deputado André Janones (Avante-MG) da suspeita de rachadinha, a de que o suposto delito ocorreu antes do atual mandato parlamentar.
E disse que a PF não conseguiu comprovar a relação do deputado com o ocorrido, mas que foi forçada a entregar a solução do crime.
Em seu voto, a relatora afirmou que a tese de que os assassinatos ocorreram antes do mandato não pode ser salvo-conduto para cometimento de crimes.
Ela argumentou também que o caso, mesmo sem decisão definitiva da Justiça, atinge a imagem da Câmara dos Deputados.
“As provas coletadas tanto por esse colegiado, quanto no curso do processo criminal, são aptas a demonstrar que o representado [Chiquinho Brazão] tem um modo de vida inclinado para a prática de condutas não condizentes com aquilo que se espera de um representante do povo”, escreveu Jack Rocha em seu voto.
“Por todo o exposto, voto pela perda do mandato do deputado Chiquinho Brazão, tendo em vista este incorrido na conduta tipificada no inciso VI do artigo 4º do Código de Ética e Decoro Parlamentar, pelas razões contidas no presente voto.”
O artigo citado diz ser incompatível com o decoro parlamentar, punível com a perda do mandato, “praticar irregularidades graves no desempenho do mandato ou de encargos decorrentes, que afetem a dignidade da representação popular”.
A deputada do PT usou como argumento de seu voto supostos atos de Brazão que representariam quebra de decoro, como a suposta ligação com a milícia e com loteamentos ilegais no Rio, além da incompatibilidade da prisão e o exercício do mandato.
Sobre o assassinato de Marielle em si, ela disse que a relação de Brazão com a milícia no Rio e a oposição de Marielle a esse grupo “fornecem uma motivação clara para o assassinato”.
“Portanto, a imputação é verossímil e sustentada por evidências significativas.”
Em abril, o plenário da Câmara decidiu manter a prisão do deputado, por 277 a 129 votos.
No dia seguinte à prisão do deputado, a bancada do PSOL na Câmara protocolou no Conselho de Ética a representação por quebra de decoro parlamentar. “O autor intelectual da morte de Marielle Franco e Anderson Gomes não pode estar como representante da Câmara dos Deputados. Sua cassação é urgente e sua presença, uma vergonha para a Casa”, dizia o documento.
Caso o Conselho referende o parecer da deputada do PT, a defesa de Brazão pode recorrer da decisão à Comissão de Constituição e Justiça da Casa.
Se a CCJ negar o recurso, o processo segue então para decisão do plenário, ainda sem data definida. Cabe ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), agendar a votação.
O plenário é formado por 513 deputados que, em votação aberta, pode ou não seguir o parecer do Conselho. Para que haja a cassação do mandato, é preciso o voto de pelo menos 257 dos 513 parlamentares.
Os mais de seis anos de investigações do assassinato de Marielle e Anderson foram marcados por morosidade, mudanças recorrentes no comando das apurações e acusações de tentativas de despistar as autoridades.
A prisão dos irmãos Brazão e de Rivaldo Barbosa ocorreu dias após Alexandre de Moraes homologar a delação premiada do ex-policial Ronnie Lessa, suspeito de ser o executor do crime.
Lessa afirma que foi contratado pelos irmãos para executar o assassinato e que, em troca, recebeu como promessa de recompensa a exploração de terrenos na zona oeste do Rio de Janeiro, atividade que poderia lhe render, segundo afirma, R$ 25 milhões.
De acordo com a versão do ex-policial, a vereadora representaria um obstáculo aos negócios dos Brazão envolvendo loteamentos ilegais na zona oeste do Rio.