ESPECIAL Comércio Histórico. Padaria Palmeiras, em uma antiga área rural, 5 mil passam todo dia no negócio centenário

Uma image de notas de 20 reais
O gerente Wagner diz que os segredos do sucesso são produto de qualidade e atendimento personalizado
(Andre Lessa/Agência DC News)
  • Estabelecimento em Santa Cecília, em local chamado de subúrbio no século 19, fica em 2º lugar (região central) no prêmio Padocaria
  • Daqueles fornos saem até 7 mil pãezinhos e mais de 100 mil pizzas todos os dias. A mais pedida, claro, chama-se Palmeiras
Por Vitor Nuzzi

[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
“Vende-se a chácara em um dos subúrbios desta capital.” Assim dizia um anúncio de jornal, publicado em 1872. Sim, o futuro bairro de Santa Cecília, no miolo da capital paulista, já foi chamado de subúrbio. Naquela área ficava a Chácara das Palmeiras, onde se vendiam laranjas e de onde fugiam animais – e também, em tempos de escravidão, se “alugavam crianças ou moleques que sirvam para apanhar chá”. As chácaras da região, áreas rurais, foram se transformando em lotes urbanos. Hoje, é difícil imaginar cenário mais urbano que o do Elevado Presidente João Goulart, o popular Minhocão. Debaixo dele, na praça Marechal Deodoro, fica uma padaria que completou 100 anos em meados de 2025. A Padaria e Confeitaria Palmeiras ficou em segundo lugar, entre os estabelecimentos da região central, na Padocaria 2025, premiação que reúne 900 padarias da capital e nesta edição teve 65 mil votos. Agora, recebe o Prêmio Comércio Histórico 2025, da AGÊNCIA DC NEWS e da Associação Comercial de São Paulo.

Antes que se pergunte, o nome da padaria foi escolhido pela chácara (e pelas palmeiras que ornavam a região) e não pelo time de futebol. Apesar de o estádio (Allianz Parque) ficar a menos de meia hora do local. Nem seria possível, porque o Palmeiras, o time, ganhou esse nome apenas em 1942 – até então, e desde 1916, era Palestra Itália. A mudança ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, quando o Brasil entrou no conflito contra o chamado Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Para não deixar dúvidas, o cardápio da casa inclui seis beirutes com nomes de times tradicionais paulistas: Corinthians, Juventus, Palmeiras, Portuguesa, Santos e São Paulo. A casa também oferece um conhecido sanduíche de rosbife e lanches (na baguete, no prato ou natural) que trazem nomes de bairros ou ruas: Brás, Lapa, Vila Madalena, Pompeia, Angélica, Barra Funda, Santa Cecília… E cidades da Grande São Paulo (Barueri, Santo André, São Bernardo e São Caetano).

Mas, entre as pizzas, reina justamente a Palmeiras. Borda de catupiry, calabresa, presunto, ovos, muçarela, bacon, pimentão e azeitonas – R$ 152,90 a pizza grande, R$ 26,90 o pedaço. É o carro-chefe da casa. Segundo o gerente do estabelecimento, Wagner de Melo Martins – que é são-paulino –, diariamente são vendidas de 80 a 100 pizzas, e até 120 nos fins de semana. Pão francês? De 6 mil a 7 mil/dia, assados no forno que não para. São três turnos, das 6h às 14h, das 14h às 22h e das 22h às 6h (horário de abertura ao público – e vai até as 23h). Lanches, pizzas, beirutes e pratos em geral para atender as 5 mil pessoas que passam por lá todos os dias – população equivalente a 1,3 mil municípios brasileiros, pelos dados do Censo de 2022. A padaria e confeitaria, além de conhecida, fica em local estratégico: a meio quarteirão da estação Marechal Deodoro do metrô (Linha 3-Vermelha).

Escolhas do Editor

Três anos atrás, em dezembro de 2022, o estabelecimento abriu um salão anexo, mais reservado, destinado principalmente a eventos. É quase um espaço à parte, separado da agitação dos balcões. E onde fica a única foto antiga da Palmeiras, de 1955. O local havia passado por uma reforma geral em 2002, pouco antes da troca de dono. Os atuais sócios estão lá desde 2004. O gerente da casa, Wagner de Melo Martins, acompanhou a transição. Vindo de Parnamirim (estimados em 272 mil habitantes em 2025, segundo o IBGE), no Rio Grande do Norte, chamado por um tio que já trabalhava lá, ele conseguiu seu primeiro emprego, aos 17 anos, em 2001. E até agora único – é o segundo com mais tempo de casa (o balconista Raimundo Nonato passou dos 30 anos), em um total de 80 funcionários. Começou entregando comandas – que ainda eram de papel – aos clientes que entravam. Passou por todas as áreas. “Fui aprendendo as coisas”, afirmou. Se necessário, pode desempenhar qualquer função. Questão de iniciativa, segundo Wagner, que vê com preocupação alguns jovens que chegam para trabalhar e não demonstram a mesma curiosidade. “Eles não têm atitude.”

Os segredos de uma casa centenária, segundo o gerente, passam por dois fatores: qualidade de produto e atendimento. “Isso é primordial para ter sucesso.” É esquentar o pãozinho para um cliente, garantir uma oferta de vinho para quem quiser acompanhar a pizza. “Tem pessoal que vem pegar pizza lá da Zona Leste”, disse Wagner. “Outro dia, vieram de Ermelino Matarazzo para buscar três pizzas.” Uma, claro, era a Palmeiras. Para quem não conhece, a padaria fica na Zona Oeste. Isso quer dizer que alguém atravessou a cidade e percorreu de 25 a 30 quilômetros para comprar uma pizza. Três. Também é habitual receber antigos funcionários da Rádio Globo, que ficava ali perto, na rua das Palmeiras. O gerente conta que há clientes que aparecem há mais de 40 anos. Ao mesmo tempo, o perfil da clientela mudou muito desde os tempos em que se ia até a padaria apenas para comprar pãozinho. “Temos que estar preparados no mercado.” Ficar em segundo na Padocaria 2025 é um reconhecimento, mas sempre é possível melhorar. “Vamos trabalhar para ser o primeiro no ano que vem.”

Na antiga região de propriedades das famílias ricas, em geral produtoras de café, dona Maria Angélica Souza Queiroz foi dona da Chácara das Palmeiras. Tinha 48 anos e dez filhos quando perdeu o marido, Francisco Aguiar de Barros (filho de Bento Paes de Barros, o Barão de Itu), em agosto de 1890, aos 51. Hoje, a avenida Angélica e a alameda Barros formam esquina a 300 metros da padaria Palmeiras. E a história segue em frente.

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