O resultado do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que em agosto teve a primeira deflação (-0,02%) desde junho do ano passado é visto com cautela por especialistas. O indicador oficial de inflação no país saiu do teto da meta de inflação, de 4,50%, no acumulado de 12 meses, para 4,24%. Apesar da retração, que evidencia uma inflação nem tão pressionada quanto se esperava, itens monitorados – que incluem água, energia, gás e transportes – seguem acima (5,58%), assim como a de serviços (5,18%).
“A taxa de juros curta está refletindo essa melhora, mas isso não é suficiente para trazer um grande alívio. As principais métricas continuam acima da meta [de inflação]”, disse Alexandre Maluf, economista da XP Investimentos. “É um IPCA marginalmente mais benigno, porém ainda com uma composição desafiadora.”
Para o analista, os dados divulgados nesta terça-feira (10) trouxeram algumas “surpresas benignas”, embora o resultado geral tenha vindo próximo do esperado – a XP, por exemplo, esperava 0,02% de alta. Entre essas surpresas, o banco destaca a taxa para itens de higiene pessoal, citando perfume (-0,73%) e os chamados serviços subjacentes, com destaque para alimentação fora do domicílio, que teve alta (0,33%) abaixo de julho (0,39%) e também aquém do previsto pela XP (0,43%).
O grupo Alimentação e Bebidas registrou a segunda queda seguida, embora menos intensa (-1% em julho e -0,44% em agosto). Produtos do dia a dia, como batata inglesa (-19,04%), tomate (-16,89%) e cebola (-16,85%) tiveram redução significativa de preços no mês passado. De acordo com o gerente da pesquisa do IBGE, André Almeida, o principal fator que levou a essa queda “foi uma maior oferta desses produtos no mercado por conta de um clima mais ameno no meio do ano, que favorece a produção desses alimentos, com maior ritmo de colheita e intensificação de safra”.
BANDEIRA – Outro fator para o resultado do IPCA foi, segundo Almeida, a mudança de bandeira tarifária. “A principal influência veio de energia elétrica residencial, com o retorno à bandeira tarifária verde em agosto, onde não há cobrança adicional nas contas de luz, após a mudança para a bandeira amarela em julho.” Mas o mercado já espera pressão inflacionária em setembro, porque a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) acionou bandeira vermelha neste mês, que prevê cobrança adicional – na semana passada, a Aneel revisou a decisão do patamar 2 para o 1, menos oneroso.
É o que assinala Matheus Ferreira, economista da Tendências Consultoria, que espera aceleração dos itens administrados no IPCA de setembro, com “forte aumento” da tarifa de energia elétrica residencial. Só esse item, segundo ele, deve adicionar em torno de 0,24 ponto percentual à inflação do mês. “Além disso, a expectativa de queda menos intensa das cotações de alimentos e de avanço das passagens aéreas impactarão positivamente os preços livres no próximo mês.” Ele projeta IPCA de 4,2% neste ano e 4% no ano que vem.
“Apesar da inflação pouco disseminada e da composição favorável, o contexto de atividade econômica aquecida e baixa ociosidade mantém nossa visão cautelosa”, afirmou Ferreira. “Além deste aspecto, destacam-se como fatores adicionais de risco uma maior persistência das pressões cambiais e prolongamento da seca no país, que podem pressionar o IPCA no restante do ano.”
Jefferson Laatus, chefe-estrategista do grupo Laatus, disse que o resultado parece indicar que a pressão para uma alta adicional dos juros pode ser menos urgente. “O IPCA surpreendeu positivamente com uma queda de 0,02%, o que representa o primeiro dado negativo de inflação do ano. Esse resultado alivia, especialmente, as expectativas de aumento de juros.”
Para Fábio Murad, sócio da Ipê Avaliações, a inflação – “controlada e abaixo das expectativas” – poderá fazer o BC rever se sobe juros. “O cenário geral é favorável para a economia brasileira.”