O varejo de eletrônicos é multimilionário, mais especificamente, o varejo de eletrônicos de consumo deve chegar a US$ 732 bilhões em 2024. Dentro desse montante, porém mais segmentado, está Logitech, empresa suíça líder mundial de venda de periféricos e outros itens de escritório – faturou no ano passado US$ 4,54 bilhões. Localmente, a atuação é focada no público gamer, que representa a maior parte da receita, US$ 1,2 bilhão. Em seguida, faturaram mais as divisões de teclados e combos, dispositivos de colaboração via vídeo, mouses, periféricos de áudio, acessórios de tablet, webcams e, por último, caixas de som.
Definem-se os periféricos como dispositivos acessórios que são conectados aos computadores, tablets e até telefones celulares. A Logitech domina a diversidade de atuação, focando nos dispositivos específicos, mas também produzindo dispositivos interconectáveis, que podem ser ligados tanto nos computadores quanto em smartphones ou tablets. Para o CEO, Jairo Rozenblit, o segredo do sucesso no varejo de eletrônicos está tanto no trabalho de mais de 13 anos que a empresa faz no Brasil, desde 2012, mas também se faz presente em abraçar a diversidade de públicos do mercado brasileiro, que vai desde o diretor de tecnologia das empresas, até o gamer de carteirinha, que é o mais exigente quanto a qualidade e performance. Na entrevista para o DC News, ele fala sobre o desempenho da empresa no Brasil, reforma tributária, público gamer, inteligência artificial e competitividade no varejo de eletrônicos.
DC News – Por que a Logitech vê o Brasil como um país estratégico para venda de periféricos?
Jairo Rozenblit – Quando a gente começou a operação no Brasil, há 13 anos, o Brasil era o quarto maior mercado de venda de computadores. Hoje caímos, mas ainda estamos entre os top 10. Por isso, é um mercado muito significativo para a Logitech. Mudou muito desde aquela época.
DCN – O que mudou no mercado desde então?
Rozenblit – Na época, a maioria, 80% dos periféricos, eram vendidos com fio e participamos dessa mudança de ecossistema, mudando esse cenário hoje para uma maioria sem fio. Para mudar esse cenário, trouxemos campanhas focadas na experiência do cliente, onde ele podia testar efetivamente os produtos sem fio e ver os benefícios. O mesmo vale para o público gamer. Os principais jogadores profissionais do mundo começaram a usar os mouses e teclados sem fio, garantindo um tempo de resposta baixo para os jogos, o que chancelou essa categoria de produtos para os consumidores.
DCN – No Brasil, a venda de periféricos para outros segmentos como o corporativo é tão forte quanto a venda para o público gamer?
Rozenblit – A área para escritórios, para enterprise, é uma que a gente coloca bastante foco. Entendemos que ter um bom produto, aumenta a produtividade do funcionário. Então seja no home office, modelo híbrido ou totalmente presencial os bons equipamentos contribuem para que o funcionário seja mais produtivo. Isso tem a ver com o conforto e bem-estar dos colaboradores. Isso é algo que as empresas têm olhado com mais atenção. Temos hoje uma linha grande focada para ergonomia, isso porque, para o empresário, é positivo que ele evite que as pessoas tenham dor, como por exemplo uma lesão como LER [lesão por esforço repetitivo]. Uma pessoa percorre em média 27 km no ano com seu mouse, então é importante que ela utilize um produto com conforto adequado para não gerar essas dores.
Isso vale também para produtos como uma webcam de boa resolução, ou um fone de ouvido sem fio. Com o home office, se tornou necessário funcionalidades como o cancelamento de ruídos, tanto para a saída de áudio, como para os microfones. Isso vale para evitar barulhos caseiros, como um latido de cachorro, crianças, assim como para quem está trabalhando em uma cafeteria barulhenta. Para o conforto geral em grandes escritórios, também temos produtos silenciosos, como mouses e teclados que têm o ruído de tecla e cliques reduzidos.
DCN – Por que a experiência é tão importante no varejo de eletrônicos?
Rozenblit – A gente investe muito em experiência, tanto no varejo de eletrônico como no offline. Fomos pioneiros em trazer a parte da experimentação, de testar o produto fisicamente, como parte do encantamento do cliente. Começamos isso lá atrás, com a Kalunga. Com isso, o cliente consegue testar se o produto é realmente o que ele precisa. Por exemplo, nos mouses, se a pegada é confortável, o barulho dos botões, se tem o número de botões suficiente, entre outros fatores. Na Fast Shop, por exemplo, conseguimos deixar os produtos ligados, como os headsets e os volantes gamers. Isso traz outra experiência para o cliente.
DCN – Com a expansão de players do varejo internacional como Aliexpress e Shopee, o público têm acesso a muitos outros produtos que competem nas categorias de vocês, principalmente do segmento gamer. Como vocês enxergam esses novos competidores na Logitech e como vocês mantêm a competitividade?
Rozenblit – Tudo tem um preço. Nós temos um investimento muito pesado em tecnologia e sustentabilidade. Vamos ser uma empresa neutra em emissões de carbono até 2030. Também temos todos os produtos traduzidos e localizados, além de um grande cuidado com o consumidor no pós-venda e no atendimento. Essas coisas vão se somando e fazem com que os preços dos produtos sejam um pouco mais elevados. Acompanhamos os fóruns dos diretores de tecnologia das empresas e os principais fóruns gamers. A recomendação de compra é 90% Logitech. O texto é, na maioria das vezes, o barato sai caro para os produtos chineses ou muito baratos. Isso é um trabalho nosso de anos de fidelização. Mas acho, de maneira geral, que a concorrência é saudável, faz parte.
DCN – Como vocês veem as novas taxações de produtos internacionais de baixo custo (abaixo dos US$ 50)?
Rozenblit – Afeta nossos parceiros. O Brasil é um país que tem uma cadeia de impostos muito alta, e nossos parceiros varejistas, tanto online como offline, pagam o preço desse sistema tributário pesado. Sobre as novas taxações, por um lado protege os clientes aqui no Brasil, mas por outro lado prejudica o consumidor que quer um produto mais barato. O mundo ideal era ter uma reforma tributária e que os impostos fossem revisados de uma maneira que fosse muito mais simples para todo mundo.
DCN – Vocês veem a reforma tributária como positiva para a Logitech? O imposto único vai ajudar?
Rozenblit – É um assunto muito complexo, né? Há anos o mercado sonha por uma reforma tributária. Quando a gente tá numa multinacional, diversas vezes temos que explicar para o time global como é a composição do preço aqui no Brasil. Daí começa: vai incidir imposto sobre imposto, é crédito, é débito. Os caras perguntam para a gente como a gente consegue lidar com isso. Então, por um lado, o imposto único vem favorecer muito toda essa complexidade que a gente tem de diversos tributos e de diversas formas de calcular os impostos, o que eu vejo como positivo. Mas é preciso ficar atento aos valores desses impostos, que ainda não estão definidos. O ideal seria de maneira nenhuma aumentar a carga tributária, pelo contrário, diminuir. A carga mais baixa torna os produtos mais acessíveis para todo mundo, o que gera mais consumo e consequentemente, mais imposto. Um imposto mais alto é um tiro no pé, com certeza.
DCN – Vocês foram pioneiros em enxergar o potencial do público gamer no Brasil e no mundo. Qual é o recado que você deixa para quem ainda não viu?
Rozenblit – Hoje, o mercado gamer é bilionário [faturou US$ 183.9 bilhões em 2023]. Já no nosso começo, há 13 anos, vimos o mercado de games passar a indústria do cinema, depois passou o cinema e a indústria da música juntos. É um mercado que depois da pandemia deu um salto muito grande. Também aumentou muito o tamanho porque antes o gamer era um perfil muito específico, mas hoje é muito diverso, de várias idades. Tem o Gamer pai, o avô, a pessoa que joga um jogo no celular, são todos gamers. É que nem esporte, têm opções para todos os gostos. É um mercado que só tende a crescer e vale olhar para ele com carinho.
DCN – Uma tendência no mercado de periféricos têm sido os teclados que o consumidor compra peças de diversos fabricantes para montar um produto totalmente único e personalizado. Vocês estão observando tendências como essas? Planejam algum produto focado em customização?
Rozenblit – Sempre estamos tentando olhar os desejos dos consumidores. Nossos laboratórios na Suíça estão sempre pensando em novos produtos para os próximos cinco ou 10 anos. Muita coisa que eles desenvolvem nem vai para o mercado porque passou o momento. Eu posso falar que vem muita coisa legal pela frente esse ano e a gente tá com um pipeline de novos produtos muito legais. Sobre a questão de customização, é um tema importante para nós. Cada vez mais, o consumidor quer fazer algo customizado, com a cara dele. Olhamos para o assunto com carinho.
DCN – Qual a estratégia da Logitech para implementação de IA nos seus produtos?
Rozenblit – A inteligência artificial ajuda a gente em parte nas operações, como no desenvolvimento, assim como em funcionalidades nos produtos. Eu gosto muito do exemplo que temos no nosso produto de videoconferência. A gente ensinou para a IA embutida no microfone 20 mil tipos de vozes. Com isso, ela passa a captar apenas vozes e passa a não captar ruídos e barulhos que não estão dentro desse espectro. Nessa mesma solução, na câmera, ela foi ensinada através de IA a focar e aproximar apenas nas pessoas que estão falando, mesmo com dez pessoas na mesma sala.
DCN – No dia 19 de julho, o mundo viu um dos primeiros apagões gigantes de TI, causado por uma atualização de software da ferramenta de cibersegurança da Cloud Strike. Quais são as lições aprendidas pela Logitech com esse acontecimento e como prevenir problemas como esse em empresas com softwares e produtos de grande capilaridade?
Rozenblit – É sobre segurança. Um exemplo que a gente faz aqui é para ajudar as empresas que estão dentro dos receptores de mouse sem fio. Ele é uma entrada que, através dela, pode receber um possível ataque, ou uma falha de segurança. Com isso em mente, lançamos uma nova tecnologia chamada bolt, que é muito utilizada em bancos hoje. Alguns nem permitem a compra de mouses ou teclados se não tiver essa tecnologia. Ela inibe qualquer tipo de ameaça de hackers, seja pela porta de entrada de qualquer periférico.
Também vejo como algo importante que as empresas com alta capilaridade tenham um bom plano de redundância, para evitar essas quedas por longos períodos de tempo, além de prevenir de ciberataques como os ransomwares.