Maduro aumenta repressão contra imprensa; jornalistas detidos passam de 10

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A crise política na qual a Venezuela mergulhou após as eleições presidenciais do fim de julho completou um mês nesta quarta-feira (28) sem solução à vista e sob o olhar dos principais veículos de comunicação do mundo. Dentro do país, porém, informar-se sobre o conturbado contexto venezuelano virou um desafio.

Desde a contestada vitória do ditador Nicolás Maduro, anunciada na madrugada após a votação, multiplicaram-se os bloqueios a sites informativos, e a perseguição tem feito jornalistas saírem de suas casas e deixarem de assinar textos, de acordo com organizações ligadas à imprensa consultadas pela reportagem. O clima de ameaça afetou até mesmo a grade das rádios, que suspenderam programas de opinião e informação para evitar represálias.

A repressão mostra sua face mais dura no número de detidos –somam 12 os jornalistas presos, de acordo com o SNTP (Sindicato Nacional de Trabalhadores da Imprensa da Venezuela, na sigla em espanhol). Desses, 8 foram capturados após o pleito de 28 de julho, e três, durante a campanha eleitoral. O outro está preso desde fevereiro de 2021.

Os comunicadores engrossam a cifra de 2.400 prisões alardeada com orgulho por Maduro, que classifica os detidos de fascistas. A ONG Foro Penal contabiliza 1.780 presos, dos quais 114 adolescentes. As manifestações deixaram ainda 27 mortos, incluindo dois militares.

Entre os jornalistas presos, um caso se tornou emblemático –o do cinegrafista da emissora VPI TV Paúl León, 26. O estudante de jornalismo foi um dos primeiros detidos após as eleições. Está preso desde 30 de julho.

Ele cobria os protestos em Valera, cidade no noroeste venezuelano, quando agentes da Guarda Nacional Bolivariana e da polícia o levaram em uma moto. A ofensiva não se limitou a León –na mesma ocasião, eles tomaram o celular de Yuliana Palmar, jornalista dos veículos Qué Pasa en Venezuela e Sucesos Trujillo.

A detenção do cinegrafista ganhou contornos ainda mais dramáticos nos últimos dias. Na tarde de domingo (25), seus familiares foram informados que ele havia sido transferido de delegacia. Desde então, não se sabe o seu paradeiro.

“Por que tanta crueldade?”, perguntou-se sua mãe, segundo o SNTP. “Nós nos fazemos a mesma pergunta desde a noite passada, quando soubemos de sua transferência de Trujillo para outro centro de detenção, que ninguém conhece”, afirmou o sindicato nas redes sociais na última segunda (26). De acordo com a organização, León é acusado de terrorismo, incitação ao ódio e associação criminosa -as imputações mais comuns que a ditadura usa contra seus críticos.

Uma semana antes da transferência, o portal venezuelano La Vida de Nos publicou uma carta escrita a mão e atribuída ao jornalista.

“Meus velhos, meus avós, tia Mari, meus irmãos e Daniela: estou bem”, teria escrito ele, citando seus familiares. “Chegará o momento de falar sobre isso, mas quero me concentrar em dizer que vocês são tudo o que tenho, e confio que vamos sair dessa situação que, não vou negar, me entristece muito, mas me enche de força por pensar em vocês e em vê-los em breve. Obrigado por tudo o que estão fazendo por mim. Não terei como pagar quando estivermos juntos novamente.”

O número de presos caiu na última segunda, quando Carmela Longo, uma conhecida jornalista venezuelana detida e acusada de incitação ao ódio e terrorismo na véspera, recebeu liberdade condicional após uma audiência. Ela segue proibida de deixar o país, deverá comparecer periodicamente perante a Justiça e está sob censura, já que não pode fazer declarações sobre o caso, segundo o sindicato.

A falta de informação é comum nas detenções do regime. A repórter do veículo La Patilla Ana Carolina Guaita, por exemplo, conseguiu se comunicar com sua família apenas nesta quarta, após oito dias “detida e desaparecida”, de acordo com o SNTP. Dois dias antes, a CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) havia pedido que a Venezuela adotasse medidas para proteger Guaita.

A Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão do órgão da OEA (Organização dos Estados Americanos) condenou, na sexta-feira passada (23), as “prisões arbitrárias e desaparições forçadas” no país. “A relatoria alerta a comunidade internacional para rejeitar as medidas de censura e práticas repressivas exercidas como parte do padrão que busca gerar terror na população venezuelana”, afirmou a entidade.

O órgão afirmou ainda que há 107 sites bloqueados no país, incluindo 63 meios de comunicação e nove plataformas de direitos humanos. A rede social X, aliás, continua bloqueada mesmo após mais de uma semana do fim do prazo que o próprio Maduro havia dado para manter a plataforma suspensa em parte das operadoras.

Caracas não costuma responder à CIDH. O país não deu informações à comissão em nenhum dos cinco casos em que foram solicitadas medidas cautelares a cidadãos desde o pleito, de acordo com as resoluções.

Sem nenhum obstáculo restam os canais oficiais do regime, como a emissora estatal VTV. Na tarde desta quarta, no momento em que também ocorriam protestos contra a manutenção de Maduro no poder, a TV mostrava manifestantes pró-regime nas ruas para “celebrar um mês da vitória popular nas eleições de 28 de julho”, segundo o apresentador.