SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto, afirmou nesta sexta-feira (16) que o compromisso de levar a inflação de volta à meta será mantido independentemente de quem assumir o comando da autarquia ao término de seu mandato, no final do ano.
A coesão e a unidade do Copom (Comitê de Política Monetária) têm sido reforçadas desde a publicação da ata da última reunião do colegiado, que, entre outras sinalizações, apontou chances de uma nova alta na taxa básica de juros do país, a Selic.
“Todos os diretores estão adotando um discurso em linha com o que dissemos na ata [da última reunião do Copom]: não estamos dando uma orientação sobre as próximas decisões de juros, mas faremos o que for preciso para trazer a inflação de volta à meta e, se necessário, aumentar a taxa novamente”, afirmou Campos Neto, em palestra no Banco Barclays, em São Paulo.
“As pessoas estão entendendo agora que, independentemente de quem estará no comando do Banco Central ou de quem são os diretores, a direção está definida. Estamos indo atrás da meta, que foi definida pelo governo, e não por nós, e que faremos o que for preciso para atingi-la.”
Ele acrescentou que o BC participa de um “jogo de credibilidade”, em que é preciso manter a coerência e a consonância de ideias para que “as pessoas entendam a mensagem”.
Na última reunião do Copom, a taxa de juros foi mantida no patamar de 10,50% ao ano pela segunda vez, em decisão unânime.
A Selic é o principal instrumento do BC para levar a inflação à meta de 3%, definida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional, órgão federal ligado ao Ministério da Fazenda) e com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima e para baixo.
Na última leitura do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), em julho, a inflação oficial do país no acumulado de 12 meses estava em 4,5% exatamente no teto da banda. A desancoragem de expectativas para a alta de preços é algo que tem deixado o Copom “muito incomodado” e vigilante, de acordo com Campos Neto.
As falas dele também vêm na esteira de uma crescente especulação sobre o próximo comandante do BC, que será indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas próximas semanas. O favorito ao cargo é Gabriel Galípolo, diretor de política monetária apelidado de “menino de ouro” por Lula.
Em evento nesta semana, Galípolo endossou a mensagem de que uma nova alta na Selic está à mesa, a despeito da pressão de Lula para que os juros voltem a baixar.
Campos Neto tem sido alvo de críticas do presidente. Nesta sexta-feira, o petista voltou a alfinetar o chefe do BC ao dizer que ele desagradou o país ao manter a taxa Selic inalterada em um patamar elevado, embora tenha afirmado também que eles não têm nenhum “problema pessoal”.
“(Campos Neto) não me desagradou, o problema não é pessoal. Ele não me desagradou, ele desagradou ao país, ele desagradou ao setor produtivo desse país”, afirmou, em entrevista à Rádio Gaúcha, do Rio Grande do Sul.
“Não tem explicação para isso [patamar atual da Selic]… É importante lembrar que o Banco Central deve ao povo brasileiro. Ele tem que fazer as coisas pensando no povo brasileiro.”
Lula também disse que o próximo presidente do BC deverá ter coragem para alterar a taxa de juros sempre que for necessário, seja para reduzi-la ou aumentá-la.
No evento do Barclays, Campos Neto disse que o “ruído político” foi um dos pontos baixos de seu mandato.
“Houve muito barulho político que tentaram colocar sobre mim. Eu tento fugir disso e não reagir ao barulho no curto prazo. Quanto mais pudermos entregar, mais as pessoas vão se lembrar do nosso trabalho pelos bons motivos, tanto no básico que é reduzir a inflação e trazer estabilidade financeira, quanto no campo da inovação, como o Pix e o Open Finance”, disse, acrescentando que o “ponto alto” dos últimos seis anos à frente do BC tem sido a dinâmica do Copom enquanto grupo.
Ele ainda reconheceu que o Brasil é um dos poucos países que consideram reiniciar o ciclo de aperto monetário, em um momento em que grandes economias, como Estados Unidos e países da União Europeia regidos pelo BCE (Banco Central Europeu), têm se aproximado do momento de corte de juros.
Campos Neto ponderou, no entanto, que o Brasil também foi o primeiro a iniciar o movimento de baixa de juros e que há dois fatores de pressão sobre o prêmio de risco do país: a desancoragem de expectativas para a inflação e as incertezas em torno da cena fiscal.
Segundo ele, o BC só pode agir sobre o primeiro fator de risco, ao endurecer a postura para fazer a inflação convergir à meta. A incerteza fiscal, disse, “não está no controle” da autarquia.