Plano de Marçal traz propostas vagas e fala de arranha-céu e teleférico

Uma image de notas de 20 reais
As vantagens do atual ocupante do Edifício Matarazzo são maiores entre os evangélicos, os homens e aquelas pessoas com menor renda
Crédito: Divulgação ACSP

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O plano de governo do candidato a prefeito Pablo Marçal (PRTB) apresentado à Justiça Eleitoral traz propostas para a cidade que incluem implantação da disciplina de empreendedorismo nas escolas, criação de bolsões de estacionamento e mutirões para a construção de moradia.

Especialistas de diversas áreas ouvidos pela reportagem avaliam que as sugestões dele são pouco aprofundadas e o documento apresentado oficialmente no registro de candidatura não demonstra como elas teriam sustentação orçamentária.

O plano de governo do candidato tem 100 páginas e 50 tópicos, divididos em nove temas. A maior parte dos tópicos é dedicada à educação, saúde, habitação e mobilidade.

Marçal se notabilizou por propostas como a criação de uma rede de teleféricos para mobilidade urbana e a construção do prédio mais alto do mundo em São Paulo, com 1 km de altura. Durante o debate na TV Bandeirantes, em 8 de agosto, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) ironizou a ideia, dizendo que levaria “meia hora para subir de elevador” até o topo.

Para a urbanista Camila Maleronka, o arranha-céu de Marçal é uma “proposta de quem não tem proposta”. Ela avalia que a ideia de construir um “ícone” para atrair turismo e negócios para cidade é desnecessária, porque São Paulo consegue se destacar nesses quesitos naturalmente.

Também lembra da Maharishi Tower, um projeto do final dos anos 90 que pretendia construir no Brás (região central) o maior prédio do mundo com formato de pirâmide e características da arquitetura indiana. Na época, o prédio ficou associado com o então prefeito Celso Pitta (1997-2000).

Sobre os teleféricos, Ana Carolina Nunes, coordenadora do projeto Mobilidade nas Eleições, pondera que, por mais que existam exemplos interessantes na Bolívia e na Colômbia, a ideia não deveria ser prioridade em São Paulo.

“Acho importante considerar se vale a pena o investimento alto em detrimento da construção de corredores de ônibus prioritários que ainda não saíram do papel, como o da Radial Leste e Aricanduva.”

Outra proposta de mobilidade de Marçal é a criação de bolsões de estacionamento em lugares estratégicos da cidade, como acessos a rodovias e estações de metrô e trem.

“O valor da terra é muito caro em áreas próximas a nós de transporte público. Essa proposta poderia induzir ainda mais congestionamento nessas áreas, que são centralidades de bairro”, avalia Ana Carolina Nunes.

Adriana Moreira, integrante da Uneafro Brasil, diz que o plano de Marçal na educação demonstra “desconhecimento do funcionamento da rede ensino municipal”. Ela destaca que as propostas de estabelecer objetivos na aprendizagem, métricas de avaliação e bonificação de professores já existem e estão integradas na rede municipal.

“Dizer que não existem objetivos de aprendizagens claros é desconhecer a história e o funcionamento de uma das maiores redes municipais públicas de ensino do país. Já existe um modelo de bonificação dos profissionais da rede de ensino desde 2008 e, inclusive, não há evidências de melhoria do desempenho dos estudantes em virtude desse sistema. Aliás, conforme relatório do Ideb 2024, houve considerável queda dos índices educacionais do estado.”

Moreira também critica a proposta de inserir novas disciplinas como empreendedorismo e finanças dizendo que o ideal é que mudanças no currículo sejam promovidas em um “movimento interno à rede de ensino, em diálogo com o campo do direito à educação”.

Ela chama atenção para a ausência de propostas efetivas quanto à evasão escolar, equidade racial e de gênero, EJA (Educação para Jovens e Adultos) e a precarização da carreira dos profissionais da educação na cidade.

Em outro tópico, Marçal propôs criar o “maior programa habitacional da história”, utilizando imóveis ociosos da prefeitura e mutirões comunitários para construir casas nas periferias.

Camila Maleronka afirma que o déficit habitacional “não é um problema que se resolve só com a produção massiva de casas” e questiona: “Por que quem é mais sobrecarregado vai ter que fazer uma jornada dupla para construir a própria casa?”

A urbanista também criticou a proposta do Cheque Moradia, um subsídio para compra e reforma de casas. “Colocar subsídio nesse mercado gera pressão inflacionária. A tendência é que, quando for anunciado, já tenha uma expectativa de aquecimento do mercado e os preços subam.”

Na saúde, o ex-coach propõe uma mudança no sistema de remuneração dos profissionais da área, que passariam a receber com base em critérios como consultas, exames e até avaliação dos pacientes.

Para Maria Luiza Levi, professora adjunta da UFABC (Universidade Federal do ABC), a proposta “revela falta de conhecimento básico sobre o funcionamento do atual sistema de remuneração das OSS [Organizações Sociais de Saúde], que já recebem um valor que varia em função de consultas e exames”.

Ela acrescenta que “a remuneração em função da avaliação do paciente sugere que hospitais serão pagos de acordo com resultados de saúde apresentados pelos pacientes, o que é extremamente difícil de operacionalizar na prática. Em suma, proposta equivocada e pouco clara em termos concretos”.

O candidato também propõe triplicar o número de subprefeituras da capital, que passaria das atuais 32 para 96.

“Você geraria uma estrutura muito mais pulverizada de administração e isso requereria uma capacidade de coordenação por parte da própria prefeitura ainda maior. Me parece muito mais uma proposta daquelas para chamar atenção”, diz Cláudio Couto, cientista político da FGV (Fundação Getúlio Vargas).

No tema desenvolvimento econômico e social, Marçal sugere a criação de polos de trabalho pela cidade em parceria com a iniciativa privada e integração de sistemas de dados para “conectar a demanda e a oferta de trabalho”. Além disso, o candidato fala na criação de um fundo garantidor para expandir o acesso de micro e pequenas empresas ao microcrédito, sem maiores explicações.

Otto Nogami, professor do Insper, diz que o fundo “pode ser uma ferramenta eficaz para impulsionar pequenas empresas”, ele adiciona, no entanto, que “a viabilidade depende de uma execução eficiente, coordenação entre diversas áreas do governo e parceria com a iniciativa privada”.

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