SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Indicado pelo governo Lula para assumir a presidência do Banco Central, Gabriel Galípolo, já vinha dividindo, nas últimas semanas, o papel de mensageiro do Copom (Comitê de Política Monetária) com o atual chefe da instituição, Roberto Campos Neto.
O nome do economista já era dado como certo às vésperas do anúncio, o que deu um peso maior às suas falas sobre a inflação e a Selic (taxa básica de juros), movimentando o mercado financeiro nos últimos dias.
Galípolo, indicado para assumir a autoridade monetária para o mandato de 2025 a 2028, foi secretário-executivo da Fazenda e atuou como braço-direito do ministro Fernando Haddad até junho do ano passado, quando foi indicado ao posto de diretor de política monetária do Banco Central, trajetória que o mercado interpretou como um indicativo de que era ele o principal candidato para comandar a instituição.
O paulistano de 42 anos foi presidente do banco de investimentos Fator de 2017 a 2021 e se notabilizou como um dos conselheiros econômicos de Lula quando participou da campanha presidencial do petista.
Seu nome começou a ganhar repercussão no mercado financeiro e no meio político em abril de 2022, quando Gleisi Hoffmann, a presidente do PT, o convidou para a um jantar na casa de João Camargo, do grupo Esfera, na presença de nomes de peso do empresariado brasileiro, como Abilio Diniz (Península) e Flávio Rocha (Riachuelo).
A partir dali, ele participaria de dezenas de outros eventos e reuniões com executivos nas quais foi recebido como uma espécie de porta-voz econômico do então candidato à Presidência.
Com a proximidade da eleição, Galípolo assumiu postura mais proativa na campanha, passando, ele próprio, a mediar eventos em defesa da chapa Lula-Alckmin para tentar atrair o voto de setores tradicionalmente mais resistentes ao PT no empresariado e no mercado financeiro.
Ao mesmo tempo, também ganhou a confiança de Haddad, ao participar da coordenação de seu plano de governo na disputa pelo estado de São Paulo, da qual o ex-prefeito saiu derrotado.
Após a eleição, ele participou da equipe de transição e chegou a ser cotado para assumir o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), que acabou ficando com Aloizio Mercadante.
Mas a aproximação de Galípolo a Lula é anterior. O enlace entre os dois teria acontecido em uma reunião virtual para a qual Lula o convidou, por sugestão de um amigo em comum, ainda na pandemia, em 2021. No mesmo ano, ele marcou presença no Natal dos catadores, ao qual Lula sempre comparece.
No palco do evento, o petista notou o prestígio e retribuiu: “Aqui hoje a gente tem um banqueiro que já não é mais banqueiro e está do nosso lado nessa briga para reconstruir a democracia”. Ele, no entanto, não citou o nome de Galípolo, aumentando o mistério sobre a sua identidade, que ainda era tratada com reserva àquela altura.
Antes de cair nas graças do petista, Galípolo teve como sócio e mentor o economista e ex-presidente do Palmeiras Luiz Gonzaga Belluzzo, amigo de Lula desde os anos 1970 e seu conselheiro econômico histórico.
Para além da paixão pelo Palmeiras, Galípolo tem Belluzzo como referência e um grande amigo. Juntos, eles escreveram três livros: “Manda Quem Pode, Obedece Quem Tem Prejuízo” , “A Escassez na Abundância Capitalista” e “Dinheiro: o Poder da Abstração Real”.
Galípolo costuma usar seu repertório de outras áreas, como filosofia, física quântica, literatura e futebol, para construir metáforas econômicas. Ele é leitor de Machado de Assis e Dostoiévski. Seu personagem favorito na ficção é o retirante idealista, vítima da Grande Depressão, Tom Joad, protagonista de “As Vinhas da Ira”, do americano John Steinbeck.
Recentemente, ao comentar que a atividade econômica brasileira está mais forte do que o esperado, o que gera cautela em relação à inflação, Galípolo recorreu à física para explicar a dificuldade de lidar com projeções futuras.
“Na frase de Niels Bohr, um dos pais da física quântica, projeções são sempre difíceis, especialmente sobre o futuro. Mas, em economia, para além do problema estrutural, vamos dizer assim, do ponto de vista epistemológico, do que é possível conhecer e a dificuldade de se acessar o futuro do ponto de vista lógico, por deduções axiomáticas, porque se o futuro não existe ainda, como vou acessá-lo por deduções lógicas? Então, esse é um problema que aflige a ciência econômica há muito tempo”, disse em evento da Câmara Espanhola, em São Paulo.
Galípolo graduou-se em 2004 em economia pela PUC-SP, onde também obteve o título de mestre em economia política, em 2008. Entre 2006 e 2012 ele ainda lecionou na mesma instituição, como professor de disciplinas da graduação de economia, como economia brasileira contemporânea, macroeconomia, economia para relações internacionais, introdução à ciência política, história do pensamento econômico, economia política, entre outras.
Deu aulas no MBA da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo e na London School of Economics and Political Science.
Sua primeira passagem pela administração pública foi entre 2007 e 2008, no Governo de São Paulo, durante a gestão de José Serra (PSDB), na secretaria de Economia e Planejamento e na dos Transportes Metropolitanos.
Em um cenário ainda dominado pela polarização entre Lula e Jair Bolsonaro, a proximidade de Galípolo com o governo petista pode colocá-lo em situação semelhante à que Campos Neto enfrenta por seus laços com a gestão passada.
Em evento recente, Campos Neto disse esperar que seu sucessor “não seja julgado pela camisa que veste, ou se foi para festa de um ou de outro. Que seja julgado por decisão técnica que tomou”. Campos Neto vestiu uma camisa do Brasil, símbolo do bolsonarismo, para votar em 2022.
Depois de deixar o Ministério da Fazenda, Galípolo ainda frequenta eventos petistas. Embora não tenha ido à celebração dos 44 anos do PT em Brasília, nos últimos meses ele foi aos aniversários do ex-ministro José Dirceu e do ministro Paulo Pimenta (Secom).