BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Esperado pelo mercado financeiro como o próximo presidente do BC (Banco Central), o diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, é hoje o principal coordenador das expectativas de inflação, e sua indicação para o cargo pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já é dada como certa pelo Senado.
“Não vai ter surpresa de última hora em relação ao nome dele. Acho que é o Gabriel mesmo”, disse à reportagem o presidente da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado, Vanderlan Cardoso (PSD-GO).
O senador já conta com a antecipação da indicação e afirma que irá pautar logo a sabatina e a votação. “Não vou ficar segurando”, informou Cardoso.
A CAE é a comissão responsável por fazer a sabatina e votar a indicação do presidente Lula. Em seguida, o plenário da Casa faz uma nova votação para confirmar a indicação.
Entre alguns senadores da CAE, ouvidos pela reportagem, há preferência para que a indicação ocorra em setembro, após a próxima reunião do Copom, nos dias 17 e 18, em vez do anúncio em agosto, como boa parte do mercado financeiro já trabalha.
Na quinta-feira (8), no mesmo dia em que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, fez uma palestra em evento de comemoração dos cinco anos do cadastro positivo, uma fala de Galípolo, no 15º Congresso Brasileiro das Cooperativas de Crédito, em Belo Horizonte, impulsionou a alta da Bolsa e a queda do dólar e dos juros futuros.
Num tom considerado duro pelo mercado, Galípolo disse que subirá os juros, se for necessário para perseguir a meta de inflação. Foi até agora a declaração mais importante do diretor para afastar dúvidas de que seria leniente no combate à inflação no comando do BC sob influência de Lula.
Um dos pontos técnicos que mais chamaram a atenção dos analistas e considerado decisivo para o movimento de melhora do mercado foi a declaração de Galípolo de que faz parte do grupo de diretores do BC que vê como assimétrico o balanço de risco para a inflação à frente. Ou seja, mais riscos apontando para uma elevação dos preços.
“Ele é assimétrico não só porque temos mais itens de risco para alta da inflação, três [fatores de alta], ante dois de risco de baixa”, enfatizou o diretor, no evento das cooperativas em Minas Gerais.
Até Galípolo falar da assimetria, havia dúvidas se o diretor indicado por Lula considerava o cenário de riscos como assimétrico. A assimetria é vista como o gatilho que o BC colocou na ata da mais recente reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) para a alta da taxa Selic.
A dúvida surgiu porque trecho da ata diz que vários membros enfatizaram a assimetria do balanço de riscos, sem fazer referência a uma unanimidade entre os diretores, o que indicaria que nem todos teriam o mesmo entendimento.
O presidente da CAE não vê problemas para a aprovação de Galípolo pelo Senado. “Ele foi sabatinado e já teve a maioria dos senadores e senadoras na indicação dele para a diretoria. O pessoal gosta muito dele lá, porque é um cara que atende todo o mundo bem e não desentoou”, ressaltou Cardoso, que à frente da CAE lidera uma pauta mais independente e integra o grupo conservador do Senado em temas ideológicos.
Para ele, não haverá problemas para a sua aprovação. “Muita gente achou que ele ia desentoar aí dos diretores [antigos], porque foi o Lula que nomeou. Ele foi e seguiu todo o mundo, a diretoria toda”, ponderou. Cardoso contou que conversou com Galípolo, na quarta-feira (8), mas não revelou o conteúdo.
O posicionamento do presidente da CAE de que não vai segurar a data da sabatina é considerado um sinal importante porque há uma preocupação no Palácio do Planalto com o risco de o nome indicado ficar muito tempo exposto ao escrutínio público, sendo fritado pela oposição, com uma demora da data de votação.
Na semana passada, o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), reverberou essa preocupação ao afirmar que a escolha só será feita em agosto se houver um entendimento entre os parlamentares para marcar a sabatina com celeridade.
Um ministro do presidente Lula disse à reportagem que considera positiva a antecipação para acabar com a especulação em torno do compromisso com combate à inflação e “aposentar” Roberto Campos Neto, que nesse cenário, na avaliação do governo, perderia força.
O mandato do presidente do BC termina no dia 31 de dezembro. Até lá, Campos Neto comanda mais três reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária): setembro; novembro e dezembro.
Foi o próprio Campos Neto que sugeriu a antecipação para facilitar a transição e evitar o risco de a sabatina não acontecer neste ano e o BC ficar sem presidente no início de 2025.
Em reunião ministerial na semana passada, Fernando Haddad (Fazenda) relacionou o processo de transição no BC entre as três principais incertezas com impacto ao longo do ano, que rondam a economia, pressionam o câmbio e a inflação e podem levar a uma menor redução da taxa de juros no Brasil.
O Ministério da Fazenda defende a antecipação para reduzir o custo da transição e aguarda o timing do presidente Lula. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também já sinalizou nos bastidores que não se opõe à antecipação com o nome de Galípolo.
Líder do MDB no Senado e relator do projeto de regulamentação da reforma tributária, Eduardo Braga (AM) é do grupo que vê a antecipação como positiva após os abalos recentes nos mercados internacionais com os temores de uma recessão na economia dos EUA.
Braga disse à reportagem que a antecipação da indicação afasta ruídos neste momento de maior incertezas do cenário internacional ao dar maior previsibilidade.
O favoritismo nos últimos dois meses ganhou forma na ausência de novos e pela sua movimentação dentro do governo como interlocutor de Lula. Galípolo tem tido conversas com o presidente até mesmo sobre questões ligadas à política fiscal.
O diretor do BC foi um dos participantes de jantar do presidente Lula, num fim de semana em São Paulo, com Haddad e com um grupo de economistas de dentro e de fora do governo que o alertaram sobre a possibilidade de alta da inflação caso o dólar seguisse disparando. Na época, Lula foi aconselhado a moderar suas falas para não dar combustível à crise –o dólar chegara a superar R$ 5,70.
No Palácio do Planalto, auxiliares do presidente ainda falam em nomes alternativos, como o ex-CEO do Itaú Candido Bracher e Marcelo Kayath, da QMS Capital e ex-diretor do Credit Suisse.
Interlocutores dizem, contudo, ser improvável que nomes como Kayath e Bracher, que é colunista da Folha de S. Paulo, aceitem a empreitada. Além disso, há uma avaliação entre banqueiros de renome de que Lula não estaria disposto a dar a total autonomia ao futuro dirigente, algo que provavelmente exigiriam.
Para o chefe do Centro de Estudos Monetários do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), José Júlio Senna, a fala de Galípolo mostra que os diretores do BC estão afinados no sentido de mostrar que estão indo para uma direção só no combate à inflação.
“É muito bom, porque o ambiente macroeconômico no Brasil está complicado [para a inflação]”, disse Senna, que foi diretor do BC. Entre os fatores adversos para a economia, Senna citou uma economia ainda aquecida, o mercado de trabalho forte, projeções de inflação oficiais acima da meta, expectativas do mercado desancoradas e muita dúvida sobre o futuro das contas públicas.
Senna não descarta a possibilidade de Campos Neto ter deixado Galípolo se manifestar antes sobre a assimetria no balanço de riscos e a possibilidade de alta dos juros, porque há dúvida sobre como ele se comportará à frente da instituição, caso seja de fato indicado pelo presidente Lula.
Na sexta (9), depois do posicionamento de Galípolo, o presidente do BC disse que o Copom tem votado de forma coesa e unânime, mostrando compromisso com a meta de inflação. Ele ressaltou que tem confiança de que esse comprometimento será mantido após o fim de seu mandato.
Para o ex-diretor do BC, uma definição logo do futuro presidente do BC não é indispensável, mas seria positiva para diminuir as incertezas. Mesmo assim, na sua avaliação, Galipolo ainda terá que mostrar compromisso com uma política no controle da inflação para a construção da sua reputação no mercado e que não mudará de opinião depois, no caso de assumir a presidência do BC.